Mauro Santayana
Os cientistas estão surpresos com a ausência das erupções na superfície do Sol, que influem no comportamento magnético da Terra. A última vez que isso ocorreu, com a menor média diária de incidências (de 1.4) foi em 1913 – ano que antecedeu a Primeira Guerra Mundial. Em 2008, a média diária foi de 2.8 – mas em 1987 havia chegado a 157. Embora surpresos com o fenômeno, os astrofísicos não se alarmam. O Sol encontra-se na metade da vida, e, de acordo com os cálculos (sempre aleatórios), restam-lhe 4.500 milhões de anos. Foto do astro, divulgada terça-feira passada – registrada na véspera pelo satélite Soho, da Nasa – mostra-o liso como bola de bilhar.
Os astrólogos podem tirar proveito do fenômeno. Há economistas que relacionam a intensidade das manchas com os ciclos econômicos. Nada de estranho: a economia e a astrologia têm muito em comum. As duas ciências vivem de prever o futuro – e quase nunca acertam. Haja ou não relação de causa e efeito entre os cochilos do Sol e os problemas humanos, essa ociosidade da estrela coincide com o espanto destes dias finais de março e as expectativas de abril. Os banqueiros se tornaram, nos últimos meses, o alvo do necessário desprezo do mundo. Se houvesse malhação do Judas na América, no Sábado da Aleluia muitos dos bonecos teriam a cara de Madoff e seus êmulos. Não faltam razões às vítimas do vendaval, mas os banqueiros não desceram do espaço como gafanhotos marcianos. Eles existem porque a sociedade os criou e os sustenta. Quando sua incompetência e cupidez levam às crises econômicas, são os contribuintes que pagam a conta, a fim de que se recuperem e voltem a agir da mesma forma.
É correto qualificar muitos deles como larápios, mas não são os únicos responsáveis pelo estupor de nosso tempo. Agora mesmo estamos assistindo a novas lamúrias de parte da sociedade paulistana diante da condenação e prisão da proprietária da Daslu. Essa senhora e seu irmão criaram uma empresa para servir aos ricos e famosos. Os famosos e os ricos, além de se tornarem seus clientes, ajudaram-nos a crescer no mercado e, provavelmente, a esquivar-se de seus deveres legais. Quando da primeira prisão da proprietária, há quase quatro anos, um senador da República protestou, com lágrimas no rosto, contra a ação do Ministério Público, da Polícia Federal e da Receita, em solidariedade com sua "amiga". Os ricos e poderosos sempre se entendem: uma das mais qualificadas colaboradoras da Daslu era exatamente a filha do então governador de São Paulo.
Os advogados conseguiram, sexta-feira à tarde, do desembargador Luis Stefanini e do ministro Geraldo Og Fernandes, do STJ, a concessão de habeas corpus a todos os condenados. No caso da senhora Tranchesi, sua advogada argumentou que a cliente sofre de câncer e deve ser tratada em casa. O pedido, nesse caso, é justo, tanto quanto é justo mandar para casa os presos pobres acometidos de doenças terminais que apodrecem nos presídios brasileiros, aguardando julgamento, cumprindo pena ou depois de cumpri-la. Faltam-lhe advogados bem remunerados – no caso, talvez com a folga de caixa da sonegação de tributos – para pedir à Justiça o mesmo benefício.
As surpresas andam juntas: nas últimas horas, além do caso da empresária Tranchesi, há as suspeitas de evasão de divisas contra a empreiteira Camargo Corrêa. Enquanto isso, o Congresso Nacional sofre sua erosão moral. Os líderes da Câmara e do Senado entregaram, nestes últimos lustros, os recursos de custeio aos burocratas e não viram o descalabro. Moralista de última hora, o ex-presidente Fernando Henrique ameaça o Parlamento afirmando que "é preciso dar um jeito nisso" com urgência. Ele finge esquecer-se de que, mediante o diligente Sérgio Motta, coube a seu governo negociar, com a parte podre do Parlamento, as contrapartidas à aprovação das emendas constitucionais que lhe permitiram vender os ativos do povo brasileiro e instituir a reeleição, de que foi o primeiro beneficiário. Sérgio Motta confessava que só podia confiar em alguns interlocutores na sauna, onde todos ficam nus – insinuando temer que as conversas pudessem ser gravadas.
Não culpemos o Sol pelo que houve, nem pelo que virá. A culpa é dos conformistas, dos que só se preocupam com o bem público quando dele pretendem fatias; dos que só querem saber de seus negócios, de sua família e, se sobrar alguma preocupação, de seus amigos.
Em abril, o banqueiro Daniel Dantas e o delegado Protógenes Queiroz voltam à CPI.
Fonte:JB
Um comentário:
ESTA É ÓTIMA:
"...a economia e a astrologia têm muito em comum. As duas ciências vivem de prever o futuro – e quase nunca acertam."
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