terça-feira, 19 de maio de 2009

A DECADÊNCIA DO GRAU DE CIVILIDADE.

por Cláudio Lembo

(a respeito da cidadadia - por quê a opinião de um boleiro repercute mais do que a de um educador?)

Vai mal. Muitos já perceberam a decadência de nosso grau de civilidade. Falam. Pregam no deserto. Ninguém quer escutar. É bom viver o dia que passa. O futuro a Deus pertence. É o pensamento hegemônico.

Caíram por terra os nossos mais sadios traços de convivência. Ninguém respeita ninguém. Os professores são desconsiderados em salas de aulas. Os pais não se relacionam com seus filhos.

Uma confusão geral. Esta se desdobra em todos os setores da sociedade. Nas relações de trabalho, os conflitos são comuns. No interior das religiões, atos impensáveis. Nada de bom exemplo.

Uma onda de deboche. Uma malícia disseminada em todas as conversas. Avança para a política. Todos se “lixam” de todos. As relações sociais se deturpam. As condutas ferem o sentimento médio acumulado por séculos.

A que se deve tão ampla onda de rompimento da convivência entre as pessoas? As causas podem ser muitas. A urbanização desenfreada que trouxe, para um único local, culturas diversas.

Ou então os meios de comunicação eletrônica que lançaram uma avalanche de costumes desconhecidos de amplos setores da sociedade. Os hábitos de determinados setores urbanos transferiram-se para todo o país.

Deu no que deu. Ninguém respeita ninguém. Uma entropia invade todos os segmentos da sociedade. Há campanhas publicitárias sobre tudo. Não há campanhas informativas sobre como proceder.

Inexiste preocupação sobre aspectos mínimos da razoável forma de se conduzir por parte das pessoas. Elas não são incentivadas a praticarem formas civis de convívio.

Tudo se tornou uma luta de todos contra todos. A agressividade invadiu o contexto social. Viver em sociedade, apesar do ensinamento em contrário, dos antigos filósofos, tornou-se oneroso.

Daí a fuga para um individualismo perverso. A retirada para o interior das moradias. O não conhecer o vizinho. A ausência da boa troca de idéias. Tudo recuou para o individual.

Quando se busca o convívio surge, comumente, o desafio do diálogo pobre. Entrecortado por frases desconexas e tratamento desprimoroso. Perdeu-se o traço singular do ser humano: a capacidade de convívio.

Isto acontece em todas as sociedades. Atingiu grau superior por aqui. Deformaram-se nos costumes. O melhor da brasilidade perdeu-se na mediocridade.

Nada foge a esta realidade. Da universidade à várzea, proliferam as formas incivilizadas de agir. As escolas são depredadas pelos alunos. Os templos violados. As cidades agredidas pelo mau uso.

Perderam-se os núcleos básicos de aprendizado da boa educação. As crianças e os jovens estão soltos. Já não contam com os pais para ensinar as regras mínimas de conduta. Estão ao Deus dará.

Este amargor alcança muitas pessoas, particularmente os que tiveram a felicidade de viver outros tempos. Não se trata de pessimismo ou saudosismo.

É mais. Trata-se de simples constatação de uma realidade envolvente. Ela surgiu com mais vigor nesta semana. O jornal Folha de São Paulo sabatinou Ronaldo, o jogador do momento.

Quando um educador fala, ninguém dá importância no atual contexto. É mais um chato a oferecer opiniões desagradáveis. Um pernóstico recheado de doutrinas e preconceitos.

Agora, quem pôs o dedo na ferida foi ele, Ronaldo, a figura mais exposta pelos meios de comunicação nos últimos tempos. Foi duro. Salutar, porém. Ronaldo foi enfático, mais do que enfático, marcou um gol à distância.

Ao ser indagado como e onde educará seu filho, respondeu o jogador do momento, na Europa. As crianças brasileiras são maliciosas. Possuem palavreado de adolescentes. Proferem palavrões.

E ao ser provocado por grito da platéia, Ronaldo foi além. Afirmou ser seu filho brasileiro, mas que prefere que ele conte com amiguinhos europeus, sem malandragem dos amiguinhos brasileiros.

Concluiu o fenômeno: “A gente quer sempre o melhor pros filhos, e eu, podendo escolher, prefiro que ele tenha educação européia”. Acertou na ferida. Não deixou saídas.

Lamentável. Lição, porém, legítima porque retrata a realidade social de degenerência dos costumes. É bom tomar atenção, se ainda houver tempo. Um pouco de boa educação não faz mal a ninguém.

É Ronaldo quem diz. Não um pedagogo qualquer.
Fonte:Terra Magazine.

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