Especialista em agronegócio, André Pessôa, sócio da consultoria Agroconsult, prevê um momento positivo para as atividades ligadas ao campo no Brasil. Segundo ele, apesar das perdas em algumas atividades - como a da cana-de-açúcar e de carnes, por exemplo, que sofreram com o sumiço do dinheiro dos investidores a partir da quebra do Lehman Brothers, em setembro passado -, o capital já começa a voltar ao Brasil. E o ingrediente a mais na atratividade que o País desperta no momento é o fato de que uma parcela muito pequena das empresas e produtores ligados ao agronegócio serem profissionalizados, segundo ele.
A entrevista é de Paula Pacheco e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 10-07-2009.
Eis a entrevista.
Como a crise financeira global impactou o agronegócio brasileiro?
Um dos principais impactos foi que os fundos de investimento, principalmente os estrangeiros, passaram a ficar mais interessados no ativo terra. É um fator de produção cada vez mais escasso. E com restrições ambientais cada vez mais presentes. Mas o Brasil não é o único a chamar a atenção de quem tem capital para investir. A tendência é de formação de um portfólio, com terra em países como Brasil, Argentina e Ucrânia. Um fator que pesa nessa decisão é que, apesar da crise, o consumo de alimentos não teve uma queda substancial. Ele praticamente não muda. Principalmente porque, nos países emergentes, a crise foi menos intensa. Isso tudo conta para o investidor que coloca o dinheiro em terra pensando em uma reserva de valor. Desde a crise, o investidor está com mais apetite. O mundo busca investir em coisas mais concretas, mais próximas da produção.
E isso influenciou no preço da terra no Brasil?
Sim, já há uma recuperação dos preços em relação ao que se via no final do ano passado, com tendência de alta. O fato fundamental nesse processo é que a terra continua a ser um ativo escasso. E a necessidade de abastecimento do mundo com alimentos é crescente, assim como as restrições ambientais. O Brasil tem a sua atratividade porque é altamente competitivo no agronegócio. Tem destaque na produção de papel e celulose, carne, cereais, algodão, café, açúcar, suco de laranja, couro, tabaco, com a vantagem de ser um mercado interno pujante, com crescimento de renda nos últimos anos.
Quais são os problemas do agronegócio no Brasil?
Há problemas na logística e no custo do capital, que é muito alto. E até hoje não fomos capazes de criar garantias para o agricultor. Ele tem um custo para plantar e não tem ideia de por quanto vai vender aquela produção. Isso é culpa do setor financeiro, do governo, do Congresso. Mas passa também pela falta de uma gestão profissionalizada - por isso vimos tanta quebradeira de empresas no setor. Eu estimo que nem 1% dos negócios no Brasil é profissionalizado, tem uma política de administração, de gestão de risco e, sobretudo, do dinheiro. O Brasil só briga de igual para igual porque é muito bom na parte operacional.
Há alguma vantagem em ainda termos tantas dificuldades?
Sim, isso atrai o investidor. Porque, apesar dos problemas, o Brasil se destaca muito no agronegócio. Imagina com uma gestão melhor, mais profissional, fugindo da informalidade, com números auditados, com uma política social e ambiental? É o grande negócio que o investidor do mercado de capitais busca: pegar uma excelente empresa com resultados modestos e melhorá-los com uma boa gestão.
Quais são as fronteiras agrícolas que mais têm atraído os investidores?
A região conhecida como Mapito, formada pelos Estados do Maranhão, Piauí e Tocantins, tem atraído cada vez mais investidores interessados na produção de grãos, de cana e pecuária. Isso tem acontecido porque é uma terra mais barata, com projetos de infraestrutura e logística já definidos para os próximos anos. A primeira expansão na região aconteceu há 30 anos. Mas a grande expansão está ocorrendo agora, com dois tipos de players. Um deles é o que já produzia grãos no cerrado e agora decidiu expandir para o Mapito com a lógica do retorno sobre o ativo. Ele vende a terra no Mato Grosso, por exemplo, e paga na compra da terra no Maranhão até 10 vezes menos. No ano seguinte, ele começa a produzir e a recuperar o investimento. O outro perfil é do novo investidor, que ainda não é produtor e em muitos casos se associa com quem já produz. Hoje estão investindo no Brasil principalmente fundos argentinos e americanos.
Os argentinos podem se dar bem em um país com características tão diferentes?
Não é tão simples, porque até as condições climáticas e de solo são diferentes. Eles podem pagar um pedágio na parte operacional no início, mas depois vão agregar o conhecimento que têm, como o grau de formalização dos negócios, na produção no Brasil.
Fonte:IHU
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