Uma semana depois da detenção do professor da Universidade de Harvard Henry Louis Gates Jr, diante de sua residência, a polêmica sobre o episódio continua a polarizar os Estados Unidos. A controvérsia chegou a tal ponto que o próprio Barack Obama interveio no debate, nesta quinta-feira (23): ele declarou que a polícia de Cambridge "agiu de modo estúpido"; mas no dia seguinte moderou o tom em entrevista à rede de TV ABC.
O professor Gates, algemado pelo sargento Crowley "Tenho um extraordinário respeito pelo difícil trabalho realizado pelos funcionários da polícia", disse Obama à ABC. "Penso que se tratou de um comentário franco: dizer que provavelmente não era necessário colocar algemas em um homem de idade madura, que usava uma bengala e estava em sua casa. [...] Minha visão é que palavras foram trocadas, entre o policial e o senhor Gates, e todo mundo deveria se acalmar e teria tido de manter a cabeça fria", afirmou.
Diante da amplitude da polêmica, não é preciso dizer que essas desculpas veladas não amenizaram a cólera dos policiais. "O senhor não só deu provas de falta de julgamento na escolha das palavras, mas pôs em questão todos os membros da polícia de Cambridge e todos os oficiais de segurança ao longo do país", disparou, na quinta-feira, o presidente da Fraternidade Internacional de Funcionários da Polícia, David Howlay, em carta a Obama.
Ele não foi o único. Muitos julgam que o presidente dos EUA ultrapassou a linha vermelha ao expressar seu julgamento sem conhecer as circunstâncias do episódio. Na internet, muitos de seus simpatizantes reclamaram de sua declaração, em especial em comentários no site do Boston Globe.
A insatisfação é partilhada pelo policial James Crowley, que esteve na origem da interpelação de Gates. "Apóio 110% o presidente dos EUA. [Mas] penso que ele derrapou ao se expressar sobre um caso local sem conhecer todos os fatos, como ele mesmo reconheceu", disse o sargento em entrevista à rádio WBZ-AM, de Boston.
Porém no New York Times a declaração do presidente adquiriu cores sobretudo políticas. "Em público, Obama sempre procurou transcender, ou evitar, a questão racial. Como candidato, tratou de limitar suas referências raciais à dificuldade de conseguir um téxi em Nova York. Mas na realidade a discriminação racial foi um tema maior para Obama quando ele era parlamentar de Illinois", diz o jornal. O NYT conclui que o surpreendente foi menos a resposta de Obama e mais o fato de ela ter saído da boca do presidente.
O professor Gates é o titular da cadeira de estudos afro-americanos em Harvard, especialista em história do racismo e da segregação. Ele regressava no dia 16 de uma estadia na China, onde fora pesquisar as raízes familiares da violoncelista Yo-Yo Ma. A fechadura da casa estava emperrada e Gates, com ajuda do motorista de seu táxi, forçou a porta. Ao ver dois negros agindo assim naquele bairro burguês, uma mulher chamou a polícia.
Gates mostrou seus papéis, provou que aquela era sua casa e, por sua vez, solicitou que o policial mostrasse sua identidade. O sargento James Crowley, há 11 anos na polícia, teria se recusado, segundo o acadêmico. A discussão terminou na delegacia, onde o professor, de 58 anos e pequena estatura, chegou algemado. Ele foi libertado quatro horas mais tarde, depois da intervenção de Charles Ogletree, célebre professor de direito de Harvard e mentor de Barack Obama nos primeiros passos de sua campanha. O sargento se recusou a pedir desculpas.
O episódio segue um script bem conhecido dos negros americanos, e não só deles. O professor Gates comentou com amargura que as únicas pessoas que vivem em um mundo pós-racial são os quatro moradores da Casa Branca (referindo-se à família Obama).
Fonte:Site O Vermelho.
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