sexta-feira, 10 de julho de 2009

MÍDIA - Twitter não basta para revolução.

El País

Silvia Blanco

O Twitter se transformou em uma arma explosiva contra a censura. Às vezes, como no Irã, na única arma à disposição da dissidência. E muitos governos, como o chinês, a temem. Por isso na segunda-feira, quando irrompeu a violência étnica em Xinjiang, o Twitter foi bloqueado.

"Fizeram isso porque é uma mídia instantânea, e porque os que têm maiores conhecimentos tecnológicos o utilizam para ensinar outros a enviar mensagens para o exterior", conta da Califórnia Xiao Qiang, fundador do site China Digital Times. Essa página está recebendo e traduzindo do chinês para o inglês os "tweets" [mensagens] sobre a violência em Urumqi que estão conseguindo escapar da censura.

Mas essa ferramenta dos cidadãos ainda não leva pessoas à rua. "Pena que os revolucionários de antigamente não tinham o Twitter", diz Enrique Dans, professor de sistemas de informática na IE Business School e blogueiro (www.enriquedans.com). "Sua capacidade é a de aquecer um protesto, ampliá-lo e acelerá-lo. É muito fácil criar adesões, o difícil é transportá-las para o mundo real. A fagulha que acende um protesto virtual quase sempre vem de um fato. Isso ocorreu com a repressão no Tibete no ano passado, e ocorreu no Irã. As redes sociais amplificam o protesto, mas ainda não o provocam", acrescenta.

Mobilizar a solidariedade e a adesão de centenas de milhares de pessoas no mundo sobre o que aconteceu no Irã já é uma mudança. Ramine Darabiha, um francês de 25 anos, passou a madrugada de 13 de junho grudado no computador. A cerca de 3 mil quilômetros de Teerã, estava tão atônito quanto seus pais em Paris e seus parentes e amigos no Irã pelo fato de que tanto Mousavi quanto Ahmadinejad se atribuíam a vitória nas eleições.

Primeiro ele vasculhou sites de notícias em busca de informação; pouco depois encontrou centenas de frases no Twitter e duas palavras recorrentes: "fraude" e "censura". Soube que o Facebook estava bloqueado, assim como os celulares e torpedos. E que de Tampere, na Finlândia, ele podia estar nos protestos.

Há cinco anos Darabiha decidiu mudar-se para essa cidade, ideal para um empreendedor que quer se especializar em negócios na Internet. Lá ficam o centro de pesquisa e desenvolvimento da Nokia, um ímã para cérebros das telecomunicações de todo o mundo. A Nokia é, junto com a Siemens, a empresa (Nokia Siemens Networks) que vendeu para o Irã a tecnologia para filtrar e controlar as comunicações, assim como para outros 150 países, segundo "The Wall Street Journal" e a BBC. Além disso, a companhia estatal Irã Telecom administra quase todo o tráfego da internet, o que representa dispor de algo como um botão que permite apagar a rede e os celulares.

Quando o governo iraniano decidiu apertá-lo, se acendeu uma imediata, gigantesca e global cadeia de mensagens de no máximo 140 caracteres para opinar, protestar e solidarizar-se com os iranianos através da rede social Twitter. Darabiha deu um passo a mais: contribuiu, como centenas de internautas de meio mundo, para criar pontes que contornaram a censura para os que estavam no Irã. Dedicou-se a pôr no Twitter endereços de sites que não deixam rastro do destino nem da origem da informação.

Fotos, vídeos e depoimentos começaram a circular freneticamente pela rede. Um estudo do The Web Ecology Project, restrito à Universidade Harvard, o Berkman Center e o Massachusetts Institute of Technology (MIT), registrou entre 7 de junho (antes das eleições iranianas) e 26 pouco mais de 2 milhões de mensagens no Twitter sobre o processo eleitoral no Irã. Cerca de 480 mil usuários únicos se somaram à conversa.

Os meios de comunicação e as agências de notícias, cujos correspondentes sofreram a censura, quando não foram expulsos do Irã, batizaram o fenômeno de a revolução Twitter. O semanário "The Economist" resumiu em um título: "Twitter 1, CNN 0". "É a primeira vez em que qualquer um, esteja onde estiver no mundo, pode participar" do protesto, disse por telefone Darabiha. Uma imensa enxurrada de vozes em tempo real, capaz de amplificar uma causa de maneira exponencial.

Até aqui as qualidades (muitas). Mas na análise de como as redes sociais intervêm em contextos de crise começa a surgir o ceticismo. Ou melhor, uma moderação do entusiasmo geral. "A mídia logo se concentrou no Twitter, talvez porque os jornalistas não tinham outro modo de acessar a informação. É um grande meio de comunicação, mas não para organizar manifestações, por exemplo.

Os líderes reformistas tomaram a decisão de sair à rua no mundo real e depois usaram diferentes redes para difundi-lo porque eram os únicos canais que tinham", explica Hamid Tehrani, responsável pelos conteúdos sobre o Irã da Global Voices Online, uma poderosa plataforma de blogs de protesto na rede.

Na opinião de Diego Beas, analista político que prepara um livro sobre o impacto das novas tecnologias na política dos EUA, "os meios de comunicação procuram se identificar com as redes sociais, têm grande interesse em incorporar Twitter ou Facebook e vídeos do YouTube. Vimos isso no Irã, quando 'The New York Times' ou 'El País' abriram em seu sites um canal de Twitter. Mas ainda é cedo para saber o alcance real que teve essa rede social nas eleições e no protesto posterior".

Twitter é velocidade e intensidade. Na madrugada de segunda-feira passada, quando a atenção internacional estava em Honduras, o canal dedicado ao país no Twitter estava muito ativo. Antecipou que o presidente deposto Zelaya não podia aterrissar, que se dirigia para a Nicarágua e depois para El Salvador. Que havia mortos e feridos. Horas depois, Honduras desapareceu dos temas mais comentados. Um tweet de segunda-feira, traduzido do inglês, resume a idéia de protesto-suflê:

"Ontem Honduras e Irã ainda estavam nas notícias. Hoje Miley Cyrus [a atriz que interpreta Hannah Montana] é um dos temas da moda [os dez sobre os quais mais se fala]. Tudo está bem agora". Não há tempo para análise. O Twitter não exige narração, como em um blog. É mais rápido. A conversa surge e desaparece.

No Facebook, aderir a uma causa é igualmente simples. Cada um escolhe o grau de envolvimento. A partir desse clique, a passar vários dias ensinando outros internautas a evitar a censura, como no caso de Ramine Darabiah.

Qualquer um que utilize o Facebook pode, com a mesma naturalidade, "tornar-se fã" de Chiquito de la Calzada e apoiar um dos grupos dedicados a Neda Agha Soltan (são dezenas), a jovem de 26 anos que morreu em uma manifestação em Teerã. Sua agonia foi vista e sua história comoveu meio mundo. Um deles, chamado Neda, tinha na quarta-feira 37.956 membros. A explicação sobre por que Darabiah se envolveu para ajudar outros internautas é reveladora:

"Não sou um ciberativista. Sou alguém que participa da conversa [das redes sociais], como quando recomendo um filme de que gosto no Facebook. Não o faço como um militante. Isto [a repressão no Irã] é mais importante, é claro, mas o processo é o mesmo", esclarece por telefone. No entanto, também é crítico desse fenômeno. Em seu site na web, diz: "As pessoas estão se unindo ao movimento como se fizesse parte de um jogo. Querem ver o que acontece em tempo real.

Querem participar de algo excitante. Mais notícias, mais fotos sangrentas". Em alguns casos, os mais surpresos são os próprios promotores de grupos de adesão. "Não teria esperado tanta expectativa por ter criado uma página nem em meus sonhos mais selvagens", conta através do Facebook, de Nova York, Ron Agam, 50 anos, que fundou o grupo Facebook for Democracy in Iran, com 1.700 seguidores. "Há milhões de pessoas normais como eu que fizeram algo para ajudar. E logo percebemos que estávamos conectados, de que algo podia mudar e de que mostrando nossa solidariedade eles sabem que não estão sozinhos."

Poucos iranianos, no entanto, sentiram esse apoio afetuoso no início dos protestos, porque o Facebook estava bloqueado. Restava o Twitter. A principal crítica a esse canal é a da credibilidade. É uma ferramenta muito democrática, mas em todos os sentidos: qualquer um pode dizer qualquer coisa. "Não podemos ter certeza da informação que obtemos no Twitter. Muitos iranianos que o utilizam são ativistas, muitos outros não vivem no Irã e suas mensagens não procedem das manifestações, e há alguma informação errada: há pouco tempo se disse que tinham concentrado 700 mil pessoas na mesquita de Ghoba em Teerã, e os meios de comunicação falavam em 5 mil! Pouco depois o dado podia ser lido nos blogs americanos. Nessa mesquita não cabe nem um décimo das pessoas que disseram", exemplifica Tehrani. Outro dos rumores mais difundidos é que Mousavi estava sob prisão domiciliar.

O assunto se emaranha ainda mais quando aparecem grupos como Twittspam.org, que, sob o pretexto altruísta de defender os internautas, elabora uma lista de suspeitos que "podem estar vinculados ao aparelho de segurança iraniano" e recomendam que sejam bloqueados. Alguém faz o seguinte comentário na página: "Por que deveria confiar em que Twittspam.org acusa com provas? Não digo isso porque duvide, mas devemos ter certeza antes de negar a alguém o direito de opinar".

A ideia de que nessa minoria que usa o Twitter no Irã haja espiões do governo que tentam influir ou desinformar é uma possibilidade, mas os analistas a contemplam com cautela. Enrique Dans admite que "a parte repressora no Irã está muito preparada, tem seu site e o utiliza", e adverte que o governo sempre pode jogar o mesmo jogo que os internautas: "Pode criar pontes, ceder esses mesmos servidores proxy como os que criaram outros internautas solidários, e caçá-los aí. Por isso o Twitter foi tão relevante neste protesto, porque não é preciso passar necessariamente pelo site na web. Há dezenas de empresas intermediárias que os redirecionam para outras redes sociais. Mas sobretudo é a tecnologia centralizada que o Irã tem que lhe permite inspecionar mensagens, conversas...".

Muitos países tentam controlar a rede. A China, por exemplo, adiou na semana passada sua ideia de incorporar a cada computador que seja vendido um filtro para bloquear páginas. O argumento oficial é que assim freia a pornografia infantil. O dos internautas e das organizações de direitos humanos é que é censura pura e crua. A Austrália tem um sistema semelhante. "São desculpas", diz Dans. "Os governos empregam a segurança e a luta contra a pornografia infantil para controlar. A diferença é que nas democracias há garantias de confidencialidade, mas insuficientes."

Se há um político que conseguiu usar o potencial das redes sociais a seu favor é Barack Obama. O êxito de sua campanha presidencial se deve em grande medida ao fato de ter conseguido "conectar o mundo online com o offline", explica Diego Beas. "Obama tinha ao seu lado a comunidade tecnológica. Ele entendeu que não se tratava tanto de lançar mensagens como de motivar, de delegar a uma equipe, de criar um movimento contínuo no tempo. Além disso, já havia um processo de maturação das redes sociais nos EUA, uma quantidade de usuários muito extensa, e havia o YouTube", comenta.

A ambição de influenciar a rede está inoculada em qualquer político. Mas os que pretendem censurar fracassarão em longo prazo: "É impossível, não poderão pôr portas no campo", afirma Beas.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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