Gostei de ler o relato da Vera que deve ser da minha geração.Também vivi intensamente aqueles acontecimentos do início da década de 50.No dia da morte do Getúlio me lembro que fui para a frente da Tribuna da Imprensa, o Globo daquela época, para apedrejá-la, junto com uma multidão que teve a mesma idéia. Tinha horror da campanha do Lacerda, que meus pais lacerdistas adoravam. Eu era um estranho no ninho na nossa família e vizinhos na zona sul do Rio.Sentia naquela ocasião, quando dizia que era Getúlio, o mesmo desprezo que sinto hoje, morador dessa zona sul, quando digo que sou Lula, que sou petista. Me sinto como um verdadeiro ET.
Carlos Dória
Recordações da morte de Getúlio
Por Vera B Pereira
Tinha 14 anos quando Getúlio se suicidou. Em 1950, eu acompanhava meu pai, médico, que fazia campanha pró-Getúlio, nos comícios e, principalmente, numa loja alugada em Copacabana onde funcionava uma sede do partido.
De vez em quando me chamavam pra falar no microfone (“Votem em Getúlio”), distribuía panfleto na porta da loja, arrumava em fileiras uma espécie de santinho de campanha. Tinha uns almoços ótimos lá, e eu sempre ia. Meu pai era médico do Instituto dos estivadores, acho que se chamava Iapetec.
Fui com uma vez ou duas na festa do Dia do Trabalho, ou no Sete de Setembro, sei lá, no estádio do Vasco da Gama, onde Getúlio desfilava, de pé, num carro preto aberto, fazendo aquele gesto típico com a mão direita. E posso ouvir ainda nitidamente a voz dele: “Trabalhadores do Brasil”. Certa vez, houve uma grande comemoração, acho que no centro da cidade, talvez na Candelária, à qual muitos colégios foram convidados para cantar num coro regido pelo maestro Villa Lobos. Esqueci o nome da canção, mas lembro de alguns acordes e que eu fazia a segunda voz. Getúlio estava lá: “Trabalhadores do Brasil”.
Depois me lembro da campanha do Petróleo é Nosso: meu pai e eu. Discutia-se muito política na minha casa. Desde os dez anos, eu lia dois jornais diariamente, a Última Hora, que apoiava Vargas, e a Tribuna da Imprensa, do Carlos Lacerda. Tinha ódio da UDN, mas lia todos os dias, e depois emendava com a Última Hora, do Samuel Wainer. Guardava recortes, que hoje se perderam. Não sei como, acho que joguei fora, ou minha mãe resolveu fazer uma limpeza nos meus guardados quando me casei.
De modo que no dia 24 de agosto, eu já sabia que a situação estava péssima. Não entendia direito, mas sabia que estavam tentando derrubar Getúlio. Desde alguns dias antes, havia muita tensão no ar, nos jornais, na rádio, no Repórter Esso. Soube que estavam havendo reuniões desde a véspera, o dia inteiro. De manhã fui à escola, e lá pelas 10 ou 11 horas, as freiras disseram que nós íamos voltar pra casa mais cedo. Não disseram por quê. De repente, dentro do ônibus da escola, olhei pela janela e vi uma folha de jornal presa na parede de uma banca, dizendo que Getúlio estava morto. Só aí notei que tinha muita gente na rua. As pessoas, reunidas em pequenos grupos, estavam agitadas, algumas chorando. Eu não entendi bem o que se passava, mas quando cheguei em casa estavam meu pai, minha mãe e a empregada, grudados no rádio ouvindo as notícias. Aí me contaram. Eu chorei muito, fiquei muito revoltada com o Lacerda e a UDN. Quis ir ao Palácio do Catete, mas minha mãe não deixou. Meu pai foi. Era como se eu tivesse perdido um parente. O enterro eu vi de longe, com meu pai. Muitos anos depois, fui colega de faculdade da neta do Getúlio. E conheci a Alzirinha. Paro por aqui com as “minhas memórias.”
Fonte:Luis Nassif online
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