quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

TRANSGÊNICOS - Fora de moda.

Apenas o consumidor mais atento repara no símbolo que indica o uso de matéria-prima transgênica nas embalagens dos supermercados. A identificação, uma letra “T” dentro de um triângulo, é lei desde 2003 para produtos com mais de 1% de organismos geneticamente modificados (OGM) na composição. Os dois maiores fabricantes de óleo de soja á base de OGM, a Bunge e a Cargill, levaram três anos para se adequar à determinação.

Enquanto isso, a mesma Bunge comercializa outros produtos, como a proteína de soja texturizada para carne branca e vermelha da marca Soya, sem nenhum vestígio de OGM. Evitar a soja transgênica, mesmo que em níveis menores de 1%, tem sido a escolha da maioria dos fabricantes no Brasil. É o que revela uma pesquisa inédita do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Entre os 51 produtos com proteína de soja analisados em laboratório, 37 estavam totalmente livres de OGM, três apresentaram níveis mínimos (de 0,2% a 0,7%) e em 11 deles a soja geneticamente modificada foi detectada, mas não quantificada.

Nestes casos, segundo o assessor técnico do Idec, Marcos Pó, o alto grau de processamento industrial destruiu as cadeias de proteínas e impossibilitou identificar a quantidade de OGM. “Se o consumidor ficar em dúvida, tem de confiar na empresa. Ou, então, tem de exercer o seu direito de perguntar”, recomenda. O resultado completo da pesquisa estará disponível no site da entidade (www.idec.org.br) desde 8 de dezembro.

Além de procurar a presença de OGM nos 51 produtos, o Idec quis saber como os 28 fabricantes controlam e certificam a matéria-prima utilizada. O rastreamento dos fornecedores também está na lei. Quase metade (13) das indústrias disse ter políticas nesse sentido, ainda que apenas duas tenham apresentado a documentação completa a respeito.

Na avaliação do Idec, os resultados são positivos. “Ao contrário do que alguns fabricantes alegam, todos mostraram conseguir controlar e segregar a soja transgênica de forma eficiente. Ainda que muitos não comprovem essa rastreabilidade, o resultado efetivo é bem aceitável”, diz.

A Sakura Nakaya, fabricante do molho de soja Shoyu, teve dois produtos analisados pelo Idec (a massa de soja Missô e a sopa Missoshiru) e nenhum apresentou OGM. “Sabemos que alguns clientes se incomodariam com a soja transgênica, além de muitos importadores serem fortemente contrários. Temos um programa com certificado internacional para evitar contaminação. Essa é nossa posição em face de um cenário duvidoso quanto aos transgênicos”, diz Roberto Ohara, vice-presidente da Sakura. A Olvebra, fabricante da linha Soy, também credita ao consumidor a ausência de soja geneticamente modificada nos produtos. “Sabemos que, cientificamente, nada garante que a transgenia faça mal ou deixe de fazer. Para nós, o mais importante é o consumidor. Nosso público é fiel e compra porque sabe que estamos na lista verde do Greenpeace”, diz a gerente de marketing Margarete Scherer. A Olvebra recebeu a melhor avaliação de rastreabilidade do Idec. “Toda a soja que compramos tem nota fiscal comprovada de não-OGM e fornecedores certificados.”

Cinco produtos da Olvebra foram analisados, Soy Fruit, Soy Cake, Soy Milk, Soy e Diet Fiber. Todos estavam livres de OGM, exceto o último, que apresentou 0,2% de soja transgênica. Mesmo cinco vezes menor do que o limite legal, o porcentual desagradou à empresa. “Até hoje não existe delimitação para o plantio e as lavouras podem sofrer contaminações”, critica Margarete. “Por usarem o mesmo sistema de transporte e a mesma armazenagem, resíduos de outra carga podem sobrar”, cogita o assessor técnico do Idec.

Três produtos da linha Batavo Naturis, o creme de soja, o Soja Chocolate e os sucos de frutas foram analisados e não apresentaram OGM. Regina Boschini, diretora de marketing da Perdigão responsável pela marca, diz que é uma política da empresa utilizar apenas ingredientes convencionais. Assim como a Sakura, a Perdigão não apresentou ao Idec documentos que comprovem a rastreabilidade dos fornecedores. No entanto, diz Boschini, a empresa exige de seus fornecedores a emissão de um certificado de produto não-transgênico e só compra de fornecedores aptos a emitir esse certificado. “Nossa maior preocupação é seguir o desejo dos consumidores. A rotulagem é um direito do consumidor e cabe a ele optar pelo tipo de produto que quer consumir”, conclui.

Outro gigante do setor alimentício, a Nestlé, teve três produtos da linha Sollys (leite, creme de soja e suco sabor abacaxi) analisados, sem traços de OGM. Além deles, o sopão de carne e a sopa de carne com macarrão, da linha Maggi, apresentaram OGM em quantidade insignificante. Por fim, o molho bolonhesa, da Maggi, apresentou 0,7% de soja transgênica na composição. Abaixo de 1%, o porcentual não requer rotulagem.

Em uma nota à imprensa, a Nestlé “reconhece o potencial promissor da tecnologia genética na melhora da qualidade, disponibilidade e do valor nutricional dos alimentos a longo prazo”. A empresa também diz que o serviço ao consumidor está estruturado para receber consultas sobre a utilização de OGMs nos produtos e ressalta que segue as leis vigentes no País quanto à rotulagem.

Baseado nos resultados da pesquisa, o Idec considera que a obrigatoriedade de rotular produtos com OGM tem assegurado o direito à informação do consumidor. Por comprovar a capacidade do setor alimentício em controlar a soja utilizada na fabricação dos produtos, a pesquisa do Idec serve de argumento contrário a dois projetos de lei, um da Câmara e outro do Senado, que querem modificar o status legal da rotulagem de transgênicos no País. Kátia Abreu (DEM-TO), senadora da bancada ruralista, pretende eliminar o símbolo “T” e a exigência de rotulagem de alimentos e ingredientes produzidos à base de animais alimentados com rações contendo transgênicos. Por sua vez, o deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS) propõe a alteração do quesito de rastreabilidade para o de detectabilidade, além de também acabar com o símbolo “T”.

Heinze diz querer “eliminar um complicador”. Ele considera a legislação brasileira restritiva demais. “Tudo é proibido, tudo não pode. Eu quero simplificar. Dizem que estou do lado da Monsanto. Eu estou é do lado da produção. Acho um crime tantas variedades genéticas não serem liberadas no Brasil”, diz. Por meio da assessoria de imprensa, a senadora Kátia Abreu diz que seu projeto “busca afastar excessos ilegais contidos no Decreto 4.680”, que define as regras atuais.

“Os dois projetos cerceiam o direito do consumidor à informação”, rebate Pó, do Idec. “É até estranho uma empresa que utiliza transgênicos não querer que os consumidores saibam. Cabe a quem utiliza OGM explicar as razões e vantagens ao consumidor, em vez de tentar privá-lo dessa informação.”

O pesquisador Michael Hansen, da Consumers Union (EUA), esteve no Brasil e falou a CartaCapital sobre o impacto da vontade do consumidor no comportamento das empresas. “Muitas transnacionais fazem produtos sem OGM para a Europa. Quanto mais o mercado exige, mais elas fazem. Hoje, os grandes produtores querem fornecer orgânicos porque sabem que é onde o dinheiro está”, diz, e conclui: “Há duas décadas, os americanos simplesmente comiam o que aparecia na frente. Agora, estão mais conscientes. Por sua vez, os países em desenvolvimento, que não querem transgênicos e querem a rotulagem, mostram que as coisas mudam”.
Fonte: Carta Capital.

Um comentário:

Anônimo disse...

"(...) em 11 deles a soja geneticamente modificada foi detectada, mas não quantificada.

Nestes casos, segundo o assessor técnico do Idec, Marcos Pó, o alto grau de processamento industrial destruiu as cadeias de proteínas e impossibilitou identificar a quantidade de OGM."

Ai que mora o perigo... "confiar na empresa", disse o Marcos Pó. Confiar na Monsanto, que forneceu agente laranja ao exército dos EUA durante a guerra do Vietnã? Eu hein...

E o Greenpeace é meio hipócrita quanto aos transgênicos, pois alega que a aplicação de organismos geneticamente modificados no setor farmacêutico não é problema, pois os medicamentos passariam por rigorosos testes em laboratório. Sei, sei...