sábado, 24 de janeiro de 2009

ANOS DE CHUMBO - Dops reabre como Memorial da Resistência.

Símbolo da tortura vira museu que resgata história dos presos políticos

Moacir Assunção

Um símbolo da tortura no País foi reformado e reabre hoje como museu para homenagear a resistência dos presos à ditadura. O antigo prédio de tijolos vermelhos do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), no Largo General Osório, centro de São Paulo, teve quatro celas reformadas para abrigar o Memorial da Resistência, que homenageia as vítimas e resgata o período em que lá funcionou, de 1935 a 1984, a polícia política das ditaduras getulista e militar.

De acordo com o diretor da Pinacoteca, Marcelo Araújo, a quem está subordinado o projeto, as celas lembram a trajetória do Dops, fundado em 1924 para combater os movimentos sociais considerados perigosos à ordem nacional, como o anarquismo e o sindicalismo. Uma das celas foi reconstituída como nos tempos da repressão, enquanto nas outras há uma maquete, além de fotos e gravações de depoimentos.

"A restauração foi feita a partir das memórias dos presos que passaram por lá, com apoio do Fórum de Presos e Perseguidos Políticos. Eles contaram como era a vida no lugar", diz Araújo. Os detidos, ao chegar, iam para as celas do térreo. No terceiro andar, ficava a sala do delegado Sérgio Paranhos Fleury, um dos mais duros agentes.

"Outros países sul-americanos, como Argentina, Uruguai e Chile têm um museu dedicado à luta contra a repressão. No Brasil, ao menos que saibamos, este será o primeiro espaço museológico destinado a essa questão", afirmou o diretor. Em 2002, o espaço já havia passado por uma primeira reforma. O antigo nome, Memorial da Liberdade, foi mudado para Memorial da Resistência, após reivindicações dos ex-presos.

?HORROR TOTAL?

Hoje militante de movimentos de defesa dos direitos humanos, o jornalista Ivan Seixas passou, antes de completar 18 anos, pelos calabouços do Dops, edifício projetado em 1914 por Ramos de Azevedo, para servir de armazém para a Ferrovia Sorocabana. "Era o horror total. Lembro-me dos gritos dos torturados e da comida, uma lavagem horrível. Apesar de não estarmos abaixo do nível do solo, a cela parecia um porão", disse.

Passaram por lá, em diferentes períodos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o cardeal honorário de São Paulo, d. Paulo Evaristo Arns, os escritores Monteiro Lobato e Oswald de Andrade, a cantora Elis Regina, a artista Anita Malfatti, a militante e escritora Patrícia Galvão, a Pagu, entre outros.

Responsável pela pesquisa para o projeto, a professora de história da Universidade de São Paulo (USP) Maria Luiza Tucci Carneiro vê um ressarcimento da dívida do Estado com as vítimas da ditadura. "Encontramos celas pintadas com cores que não tinham nada a ver mais com o período da repressão. Prontas, elas demonstram que a resistência extrapola as ditaduras."
Fonte: O Estadão.

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