A Veja acusa a 39ª edição do Fórum Econômico Mundial de um perigoso desvio marxista. ''O que mais faltou em Davos foram justamente coragem e lucidez'', afirma, na edição que chegou às bancas neste sábado. A matéria, não assinada, acusa Davos de cair numa visão ''cara aos marxistas''; conclui com uma arrebatada declaração de amor ao capitalismo e uma sumária excomunhão de toda crítica ao sistema capitalista.
Por Bernardo Joffily
Montagem gráfica da revista leva Marx a Davos A matéria, intitulada O Fórum Social de Davos (!), traz um pesado veredito de vacilação esquerdista contra os protagonistas do Fórum dos Ricos, promovido anualmente por um consórcio de multinacionais. ''De modo geral, os conferencistas e panelistas adotaram a visão tão cara aos marxistas de ver as falhas incontornáveis sistêmicas do 'modelo' e do 'mercado'''.
O texto segue um caminho enviezado, pois escolhe um caminho alegórico. Narra a suposta lenda de que Karl Marx abandona sua tumba para visitar o Fórum Social Mundial; decepciona-se com o que encontra na atual edição, em Belém do Pará; mas consola-se com o que escuta em Davos, onde acha ''gente articulada, brandindo dados e pondo a culpa da crise econômica no 'sistema capitalista'''.
A alegoria claudica desde o início, já que as tiradas de humor forçado não ocultam ao leitor atento uma intenção editorial quase colérica. Por fim, o autor anônimo desvencilha-se da falsa lenda para deitar no papel o que pretendia desde o início, seu amor ao capitalismo ...e seu medo de que a crise destrua o amado. Veja a longa conclusão:
''As contradições e injustiças que embalaram politicamente as teorias de Karl Marx na Europa da segunda metade do século 19 e por quase todo o século 20 praticamente não existem mais nos países avançados e foram minoradas em quase todo o mundo. O capitalismo deu condições extraordinárias de habitação, saúde, conforto e aposentadoria a milhões de habitantes de países onde se instalou. Só nos anos que antecederam a crise atual, tirou da miséria centenas de milhões de famílias no Brasil, China e Índia. É esse progresso que está sendo colocado em risco pela corrente de destruição de riqueza deflagrada pela crise financeira. Foram necessários grandes homens e grandes mulheres para chegar até esse estágio de progresso. É de indivíduos formidáveis, e não de críticas ao 'sistema capitalista' emanadas do cemitério de Highgate [onde Karl Marx está enterrado], que virá a solução para impedir que a crise destrua tudo o que se conquistou e para avançar ainda mais.''
A matéria mostra o tamanho dos apuros ideológicos, jornalísticos e estilísticos em que a revista número um da família Civita se meteu, desde que a crise entrou em sua fase aguda. A primeira capa dedicada ao assunto, na edição de 24 de outubro passado, foi o primeiro desastre: Tio Sam aparecia com um punhado de dólares na mão, afirmando ''Eu salvei você'', enquanto o texto garantia que o Plano Paulson (quem se lembra dele?) era a saída da crise.
Desde então, as abordagens do tema rivalizam com os tombos de Wall Street. Depois de fazer uma leitura errada do pós-Muro de Berlim, optando por um reacionarismo intolerante e estridente, a Veja se excede nesse caminho a cada semana. Agora, acusa Davos de marxista. Mais alguns passos à direita e corre o risco de cair do mundo.
Site: O Vermelho.
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