Venício A. de Lima.
As declarações do presidente Lula de que não lê os jornalões, em entrevista à revista piauí (nº 28, janeiro de 2009) – aliás, publicada apenas parcialmente [ver versão da revista aqui e a íntegra, aqui] – tiveram ampla repercussão negativa na grande mídia.
Por outro lado, passou quase despercebida a sanção da Lei nº. 11.889 que institui o Dia Nacional da Leitura e a Semana Nacional da Leitura e da Literatura. O texto foi publicado no Diário Oficial da União em 9 de janeiro. O Dia Nacional da Leitura será comemorado em 12 de outubro e a Semana Nacional da Leitura e da Literatura será aquela em que recair o Dia Nacional da Leitura – e os dois serão celebrados em todo o território nacional [o texto completo da lei está aqui].
Leitura e escolaridade
O projeto original (PLS nº 539/2007) é de autoria do senador Cristóvam Buarque (PDT-DF) que, na sua justificativa explica:
"O dia 12 de outubro é conhecido nacionalmente como ‘Dia da Criança’, fato que contribui significativamente para a seleção dessa data. Assim, além de marcar a festividade já consagrada, o dia 12 de outubro abrigará, também, o ‘Dia Nacional da Leitura’, com a intenção de enfatizar, junto à sociedade brasileira, a importância do cultivo do amor aos livros, desde a infância. As principais e mais sólidas pesquisas relativas ao letramento e à aferição da qualidade do ensino demonstram que o interesse pelas obras literárias e pela leitura está intimamente relacionado ao desempenho escolar infantil, além de contribuir, de forma decisiva, para a construção de um cabedal intelectual e emocional, de natureza permanente."
O parecer do senador Marco Maciel (DEM-PE), por outro lado, relator da matéria na Comissão de Educação do Senado Federal, chama a atenção para o fato de...
"...os especialistas em leitura são unânimes em apontar que, comparativamente, os brasileiros lêem menos do que os povos de países em situação semelhante à do Brasil: a média anual é de apenas 1,5 livros por pessoa, índice bem abaixo da média mundial, que é de dez livros."
E conclui:
"Bem sabemos que as novas mídias e tecnologias de informação e transmissão de dados são muito efetivas para compartilhar obras técnicas, científicas e artísticas. Entretanto, o valor da leitura precisa continuar a ser alimentado, pois é nesse meio tradicional – o livro – que está conservado o conhecimento mais significativo bem como as obras de arte mais representativas de nossa civilização. Assim, uma celebração em torno da leitura assume caráter cultural, educativo e científico de suma importância."
Ambiência informativa
Infelizmente, ao contrário de outros países, as circunstâncias históricas de nossa sociedade fizeram com que a mídia impressa sempre tivesse circulação restrita e excludente. Isso não é novidade. O fato, no entanto, não impediu que essa mesma mídia tivesse ampla influência na vida política do país. Afinal, boa parte dela, tinha como "fontes, protagonistas e leitores" membros das oligarquias políticas, detentoras de variadas formas, diretas e indiretas, de controle social de enormes contingentes da população.
Essa situação, no entanto, vem mudando consistentemente nos últimos anos. Há um enorme avanço na escolaridade da população e, mais importante, um crescimento avassalador de formas alternativas de produção e distribuição de informação, em especial, na internet.
É nesse contexto que deve ser compreendida a irada reação de colunistas dos jornalões em relação às declarações do presidente da República. Muitos ainda não se ajustaram à realidade de que não são mais os únicos e nem os mais importantes "formadores de opinião" no país.
Ao sancionar a Lei nº. 11.889, o presidente – independente de seus próprios hábitos – incentiva a leitura de livros e, por extensão, também de jornais. Só que a leitura de jornais e/ou livros ocorre hoje em ambiência informativa onde a importância relativa dos jornais não é mais aquela de 30 anos atrás. O mundo mudou e o Brasil, também.
Boa companhia
Quanto à leitura de jornais, há uma frase de Thomas Jefferson (1743-1826) que, ao contrário de outras, nunca se tornou célebre e não é encontrada em citações na grande mídia. Em 1807, quando ocupava a presidência dos Estados Unidos e em resposta a consulta que lhe fez o então jovem John Norvell (1789-1850) – que se tornaria jornalista e senador pelo estado de Michigan – ele afirmou:
"O homem que não lê jornais está mais bem informado que aquele que os lê, porquanto o que nada sabe está mais próximo da verdade que aquele cujo espírito está repleto de falsidade e erros."
Como se vê, o presidente Lula pode alegar que está em muito boa companhia.
Fonte: Observatório da Imprensa.
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