Lá nos EUA, o Madoff saiu algemado. Aqui no nosso país, segundo o Gilmar Mendes Dantas, só pobre pode ser algemado.
Carlos Dória.
Wálter Maierovitch.
De Madoff a Dantas, passando pelo antissionismo.
Os judeus foram expulsos da Inglaterra em 1290 e só aceitos de volta a partir de 1655.
Quando estavam fora, o dramaturgo inglês William Shakespere, no final de 1500, escreveu o Mercador de Veneza. O vilão desprezível era o agiota judeu que exigia, do cristão Antônio, a carne do seu corpo, objeto de penhora atípica e que se executada levaria à morte.
No teatro, o Mercador de Veneza foi a obra mais exibida na Alemanha nazista.
Neste final de semana, alguns jornais europeus falam de “esteriotipos antessionistas”. Isto ao se estabelecer correlações entre Maddof, um judeu norte-americano, com o vilão da supracitada obra de Shakespere.
Pelo que se nota, Madoff, de 70 anos e dado como responsável por uma fraude de US$50 bilhões, está se transformando no novo ícone do antissionismo. Seria apropriado considerá-lo um serial killer do sistema financeiro, mas não instrumento para fomentar racismo e generalizações.
Não se deve olvidar, ainda, que grande parte das vítimas desse mega-fraudador foram os poupadores hebreus. Dentre os lesados está Eliezer Wiesel, ganhador do prêmio Nobel da Paz de 1986. Também estaria o Steven Spielberg, igualmente judeu.
Wiesel é um judeu romeno que passou pelos horrores dos campos nazistas de Auschwitz (Polônia) e Buchenwald (Alemanha).
Segundo os analistas, as fraudes de Madoff eram continuadas e acabaram executadas num arco de vinte anos.
No Brasil, o confesso fraudador Madoff não faz lembrar a obra mercador de Veneza, mas ao banqueiro Daniel Dantas, já condenado por corrupção e com conta vultosa sob risco de desbloqueio nos EUA. O bloqueio de contas menores foram levantados por determinação judicial.
Ao contrário de Dantas, também acusado de crimes financeiros tomada a expressão em sentido amplo, Madoff está preso em cela de 5 metros quadrados do Metropolitan Correctional Center: divide a cela com outro acusado. Madoff, desde a chegada, já encontrou à sua espera um uniforme marrom, de uso obrigatório pelos presos.
Antes, estava em prisão domiciliar, como o juiz Nicolau, apelidado de Lalau. O juiz norte-americano Denny Chin avisou que a sentença será divulgada (publicada) no dia 16 de junho e, por isso, entendeu em colocar Madoff em regime fechado. Quer evitar fuga. Talvez o juiz Denny Chin tenha tomado conhecimento da liminar a Cacciola concedida pelo ministro Marco Aurélio, do nosso Supremo Tribunal Federal: com a liminar, Cacciola fugiu para a Itália, pois, como era cidadão italiano, não correria risco de extradição.
Madoff confessou onze acusações e, com isso, conseguirá penas reduzidas, que, não fosse a admissão da culpa, chegariam a 150 anos.
A sentença, sobre crimes fiscais imputados a Dantas, ainda é incerta. Nem o inquérito está concluído e, com a saída do delegado Protógenes, ficou mais importante apurar eventuais abusos dele do que os crimes atribuídos a Dantas. Em outras palavras, o acessório virou principal.
Ainda que seja gravíssima a denúncia (peça acusatória de abertura do processo criminal) do ministério Público contra Dantas, jamais teríamos, no Brasil, uma sentença num tão prazo curto como a do caso Madoff.
Mais ainda. Não adiantará o procurador De Grandis requerer e nem o juiz De Sanctis decretar a prisão preventiva de Dantas. Por meio de habeas-corpus ele conseguirá aguardar em liberdade até que ocorra o trânsito em julgado de eventual decisão condenatória.
PANO RÁPIDO. Os sistemas judiciários do Brasil dos EUA têm origens diversas. Agora, não dá para negar que o laxismo penal brasileiro desacredita a Justiça e gera impunidade. Nos EUA, ainda que presumidamente não culpável, nenhuma corte de Justiça deixa de considerar a defesa social, em especial diante de criminosos potentes e de colarinho branco como Madoff.
–Wálter Fanganiello Maierovitch/ Terra Magazine.
4 comentários:
Belíssimo texto, coerente, esclarecedor, limpo. Parabéns!
Ah, meu DEUS, será que um dia teremos este tipo de JUSTIÇA e, principalmente, de JUIZ aqui no Brasil???
Quando você diz que "o acessório virou principal", disse de modo elegante o que eu sempre digo aos meus amigos: no Brasil, é tudo ao contrário, o rabo é que balança o cachorro...
Gostaria de saber a sua opinião sobre a "desautorização" do Gilmar Dantas em cima do Ministro Menezes Direito. Me parece, no voto abaixo, que ele CLARAMENTE considerou a cooperação da ABIN com a PF absolutamente LEGAL:
DECISÃO
Vistos.
Ação direta de inconstitucionalidade ajuizada, em 11/12/08, pelo Partido Popular Socialista - PPS, tendo por objeto o §4º do art. 6º-A do Decreto nº 4.376, de 13/9/02, com a redação que lhe deu o art. 2º do Decreto nº 6.540, de 19/8/08, que dispõe o seguinte:
“Art. 6º-A A ABIN poderá manter, em caráter permanente, representantes dos órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência no Departamento de Integração do Sistema Brasileiro de Inteligência.
……………………………………………………………………………………………..
§4º. Os representantes mencionados no caput poderão acessar, por meio eletrônico, as bases de dados de seus órgãos de origem, respeitadas as normas e limites de cada instituição e as normas legais pertinentes à segurança, ao sigilo profissional e à salvaguarda de assuntos sigilosos”.
Para o requerente, a previsão do supracitado §4º configuraria uma espécie de regulamento autônomo, colhendo fundamento de validade diretamente do art. 84, VI, ‘a’, da Constituição Federal, com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional nº 32, o que justificaria o cabimento da ação direta de inconstitucionalidade.
Quanto ao mérito propriamente dito, o requerente enxerga a norma como uma porta aberta para a invasão da privacidade e do sigilo de dados dos cidadãos, na medida em que a ABIN teria acesso a informações dos diversos órgãos que integram o Sistema Brasileiro de Inteligência (descritos no art. 4º do Decreto nº 4.376/02). Assim, com fundamento nos incisos X, XII e LIV do art. 5º da Constituição Federal, requer a declaração da inconstitucionalidade da norma.
Apliquei ao feito o rito do art. 12, com o que se manifestaram o Advogado-Geral da União (fls. 19/35), o Presidente da República (fls. 37/53) e o Procurador-Geral da República (fls. 62/69). Todos pugnaram pelo não-conhecimento da ação, haja vista a natureza de ato normativo secundário ostentada pela norma impugnada; e, no mérito, pela sua improcedência.
Decido.
Como sustentado pelo Presidente da República, pela Advocacia-Geral da União e pelo Procurador-Geral da República, o caso é de não-conhecimento da ação. De fato, o que faz o dispositivo impugnado é apenas regulamentar a previsão que se contém no parágrafo único do art. 4º da Lei nº 9.883/99. In verbis:
“Art. 4º …
…
Parágrafo único. Os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência fornecerão à ABIN, nos termos e condições a serem aprovados mediante ato presidencial, para fins de integração, dados e conhecimentos específicos relacionados com a defesa das instituições e dos interesses nacionais”.
Tem-se, portanto, que o §4º do art. 6º-A do Decreto nº 4.376/02, com a redação que lhe deu o art. 2º do Decreto nº 6.540/08, apenas instrumentaliza a norma contida no parágrafo único do art. 4º da Lei nº 9.883/99, que já previa o intercâmbio de informações entre a ABIN e os órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência. Nessas condições, de duas uma: ou o Decreto ofende a Lei, a revelar um problema de legalidade; ou é a própria Lei que ofende a Constituição, caso em que esta deveria figurar como objeto primordial da ação.
Tratando-se de norma de caráter secundário, inviável o seu controle isolado, dissociado da lei ordinária que lhe empresta imediato fundamento de validade, no âmbito da ação direta de inconstitucionalidade. Neste sentido, dentre inúmeros outros precedentes, a ADI-AgR nº 264, relator o Ministro Celso de Mello, DJ de 8/4/94, verbis:
“ADIN - ATOS NORMATIVOS 24 E 25/89, DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL - JUÍZO PREVIO DE LEGALIDADE - OBJETO INIDONEO PARA O CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE - AÇÃO NÃO-CONHECIDA - AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. - A ação direta de inconstitucionalidade não é instrumento hábil ao controle da validade de atos normativos infralegais em face da lei sob cuja égide foram editados, ainda que, num desdobramento, se estabeleça, mediante prévia aferição da inobservância dessa mesma lei, o confronto conseqüente com a Constituição Federal. Crises de legalidade, caracterizadas pela inobservância, por parte da autoridade administrativa, do seu dever jurídico de subordinação normativa a lei, revelam-se estranhas ao controle normativo abstrato, cuja finalidade restringe-se, exclusivamente, a aferição de eventual descumprimento, desde que direto e frontal, das normas inscritas na Carta Política. A ação direta de inconstitucionalidade - quando utilizada como instrumento de controle abstrato da mera legalidade dos atos editados pelo Poder Público - descaracteriza-se em sua precípua função político-jurídica, na medida em que, reduzindo-se em sua dimensão institucional, converte-se em meio processual desvinculado da finalidade para a qual foi concebido”.
Ante o exposto, com fulcro no art. 4º da Lei nº 9.868/99, indefiro a petição inicial.
Brasília, 3 de março de 2009.
Ministro MENEZES DIREITO
Relator
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