Para Vannuchi, dificuldade para entender noticiário sobre violência ocorre por falta de recuperação da memódia do período da ditadura .
Para o ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, o lançamento do site com os trabalhos vencedores do Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos desde a primeira edição em 1979 é uma das forças de assegurar a preservação da memória e de compreender a violência atual. Ele referiu-se especificamente ao episódio da queda de um helicóptero no Rio de Janeiro e à omissão de oficiais da Polícia Militar em prestar assistência a um ativista dos direitos humanos assassinado minutos antes.
"(Esse trabalho) evidentemente é fundamental para explicar por que tanta violência do helicóptero derrubado do PM que não prende e que fica com o casaco e o tênis de um lutador de direitos humanos que tinha acabado de ser assassinado, seja ou não em um latrocínio e crime comum", avalia. "Lemos essas notícias e não conseguimos entender o significado porque nunca foi feito o processo que o site hoje lançado e que os livros tentam que é fazer o Brasil se conhecer melhor.
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Vannuchi defendeu ainda ideia da reconciliação como item indispensável quando se discute a retratação dos direitos humanos.
As declarações foram feitas após debate sobre o cenário da comunicação, quando foi lançado o site do Prêmio Vladimir Herzog. Símbolo da luta contra a ditadura militar no Brasil, o jornalista, escritor e dramaturgo foi morto durante a ditadura militar em 1975.
A maior parte do acervo foi digitalizado e está disponível para a consulta. O projeto foi elaborado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República e pelo Centro de Informações das Nações Unidas para o Brasil (Unic-Rio) e teve a parceria do Instituto Vladimir Herzog e do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo.
Segundo o diretor do órgão da ONU, Giancarlo Summa, o site permite a jornalistas e estudantes o acesso a todas as reportagens premiadas ao longo dos trinta anos de realização do prêmio. "Foi uma contribuição que quisemos dar enquanto Nações Unidas ao esforço feito no Brasil por entidades de direitos humanos para a preservação da memória da luta pelos direitos humanos e do longo processo para se derrubar a ditadura e para consolidar a democracia. Foi um esforço para criar um site que seja um instrumento de preservação da memória do trabalho dos jornalistas em prol da democracia e da construção de um país democrático. E mostra também a evolução da luta pelos direitos humanos nos últimos 30 anos no país."
Memória e reconciliação
"É um site que traz o debate em torno da memória e da verdade, sobretudo a respeito de um passado recente de 21 anos atrás", afirma Paulo Vanucchi. "O regime de 64 deixou marcas profundas na violência que o Brasil enfrenta hoje. (E o site coloca) essa batalha em um novo patamar que poderia dizer que não é mais a luta defensiva da trincheira de quem fica escondido, resistindo para não deixar ser dizimado pelo trator da proibição do esquecimento", sustenta.
Para ele, a defesa dos direitos humanos saiu da trincheira, porque são produzidos sites, livros, peças de teatro e filmes dedicados à reconstrução histórica. O centro dessa ação deve ser, na visão de Vannuchi, a formação de estudantes desde o ensino básico até o universitário, incluindo estudantes de jornalismo e de outras áreas.
Segundo o ministro, esse tipo de iniciativa é importante para que o país não perca a chance de conhecer seu passado mesmo em aspectos negativos como o extermínio de indígenas por cinco séculos, o trabalho escravo por três séculos e meio, a violência do Coronelismo de Enxada e Voto, e a ditadura militar.
O ministro aponta ainda que o site permite que o mundo conheça o lado positivo da consciência social brasileira, porque combate a ideia de que no Brasil existe acomodamento e de que as pessoas não têm consciência social e política. "Uma juventude abriu mão de situações familiares e universitárias confortáveis – de classe média e alta – e derramaram seu sangue resistindo a um regime de censura, de cassação, de proibição, de tortura, morte e desaparecimento de opositores", afirma.
"(A ditadura foi) um regime da mentira. Um dos maiores exercícios da mentira do regime foi desmascarado no episódio Vladimir Herzog, em que, ainda hoje, os acusados pelo assassinato sob tortura, se defendem no Judiciário – em uma peça que li – (dizendo) que ele cometeu suicídio, que não foi torturado, tentando recuperar algo que o Brasil inteiro sabe que aconteceu", lamenta.
Vannuchi defendeu a ideia da reconciliação. "Direitos humanos desenha um mundo da paz, o que nós temos é o da guerra. Como passamos do mundo da guerra para o da paz? Com reconciliação. O que se precisa é qualificar a ideia de reconciliação, que não é esquecimento. No esquecimento não há reconciliação possível, o ódio se realimenta."
O primeiro passo, segundo o ministro, seria dado pelos participantes "do processo imprescritível de crimes de lesa-humanidade de tortura, morte, desaparecimento de cadáveres", que deveriam reconhecer publicamente o que fizeram. "Acabar definitivamente com a ideia de que não houve ou, como diz Jarbas Passarinho que 'aconteceu como exceção'. Não foi exceção, foi sistemático, de 1969 a 1976, sete anos, exceção foi o contrário", acusa.
Nesse sentido, um reconhecimento claro permitiria discutir se, passados 40 anos, é possível pensar em penas alternativas ou justiça restaurativas, vista como um passo adiante por vannuchi. "A pena alternativa é evitar que as pessoas sejam jogadas no presídio", explica.
Ainda assim, ele afirma que, se o Judiciário brasileiro considerasse, a exemplo do que ocorreu no Uruguai na última semana, que pessoas responsáveis por crimes de lesa-humanidade durante a ditadura devem ir à cadeia, seria uma decisão positiva. Na semana passada, a Justiça uruguaia condenou Gregorio Alvarez a 25 anos de reclusão. O ex-ditador do país foi acusado pelo assassinato de 37 ativistas de esquerda transferidos clandestinamente para a Argentina.
Prêmio Vladimir Herzog
A cerimônia de entrega do prêmio na 31ª edição acontece nesta segunda-feira (26), no Teatro da Pontífice Universidade Católica de São Paulo (Tuca).
Fonte:Revista Brasil Atual
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