terça-feira, 10 de novembro de 2009

ANOS DE CHUMBO - Uma história uruguaia de Brizola.

Mário Augusto Jacobskind

Lá se vão mais de 30 anos que Leonel Brizola deixou correndo o Uruguai e pediu asilo na Embaixada estadunidense, concedido pelo então Presidente Jimmy Carter. Vale lembrar uma história pouco conhecida no Brasil e que tem como cenário o Departamento de Durazno, onde o ex-governador duas vezes do Estado do Rio e uma do Rio Grande do Sul tinha propriedades rurais.

Brizola estava empenhado na melhoria de uma estrada que facilitaria a circulação para as suas fazendas. Apresentou um laudo à Prefeitura de Durazno sugerindo a remodelação de um trecho e assinando apenas Leonel Brizola. Os técnicos da Prefeitura consideraram muita arrogância alguém que não fosse engenheiro apresentar a sugestão técnica com todas as especificações. Não sabiam que Brizola era engenheiro.

Indagado sobre isso e sendo informado que laudos dessa natureza só poderiam ser elaborados por engenheiros, Brizola informou a sua condição de engenheiro formado no Rio Grande do Sul, explicando que não tinha assinado com a especificação requerida porque se considerava afastado da engenharia já que dedicava seu tempo à política.

Depois dos esclarecimentos, o projeto, tecnicamente perfeito, segundo admitiram os técnicos, foi aprovado pela Prefeitura de Durazno. Brizola decidiu comemorar o acontecimento, convidando os amigos e os vizinhos para um churrasco. Pois bem, no mesmo dia, e já com o churrasco iniciado, Brizola recebe a informação de Pedro Soust, hoje na Frente Ampla, que caísse fora do Uruguai imediatamente pois agentes de inteligência do país e brasileiros estavam se preparando para matá-lo.

Soust o levou para a Embaixada dos Estados Unidos, onde Brizola decidiu pedir asilo, inclusive com o objetivo de testar se o papo de Carter sobre direitos humanos era para valer ou não. Os Estados Unidos concederam o asilo e o resto da história todos os brasileiros conhecem.

Este fato aqui contado foi relatado, casualmente, por Juan, um amigo uruguaio de Brizola a este jornalista numa praça central (Praça da Independência) de Durazno. Cinco anos e quatro meses depois da morte de Brizola, seus amigos de Durazno, uma típica cidade latino-americana do interior, que cabe perfeitamente num romance de Gabo, Gabriel Garcia Marques, que conheceram o ex-governador, ainda lembram com carinho da figura do estancieiro brasileiro que passou longos anos no exílio por causa de uma ditadura que retardou o Brasil por muitos e muitos anos.

Brizola conseguiu evitar ser assassinado devido a ação dos amigos que o avisaram em tempo sobre a ação criminosa das forças da repressão, no que hoje se conhece como Operação Condor (ação conjunta das ditaduras do Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile e Bolívia). Se não fosse o aviso de Soust, Brizola teria o mesmo fim do senador e jornalista uruguaio Zelmar Michelini, do Deputado uruguaio Hector Gutierrez Ruiz e tantos outros cidadãos latino-americanos que não aceitavam que seus países continuassem a viver sob o tacão de ditaduras cruéis, como as brasileira, argentina, uruguaia, paraguaia, chilena e boliviana.

Não tiveram também a mesma sorte de Brizola figuras como o general nacionalista boliviano Juan José Torres, o ex-chanceler chileno Orlando Letelier, o general legalista chileno René Schneider e tantos outros, inclusive, segundo seus familiares, o Presidente constitucional brasileiro João Goulart, que teria sido vítima de uma operação, na Argentina, que resultou na troca de medicamentos, o que o levou a morte. O fato está sob investigação e há indícios muito fortes de que o então delegado Sergio Fleury, pouco antes da morte de Jango, tinha ido ao Uruguai coordenar a ação contra o Presidente derrubado por um golpe civil militar que implantou uma ditadura que perdurou até 1985.

Estas histórias, embora hoje conhecidas e confirmadas por documentos de arquivos dos serviços secretos de vários países, inclusive dos Estados Unidos, devem ser informadas, sobretudo às novas gerações, que ainda não conhecem em toda a plenitude o que foram os anos de chumbo vividos no Cone Sul latino-americano com regimes que tiveram total apoio do Departamento de Estado norte-americano, então sob a responsabilidade de Henri Kissinger, que por ironia da história acabou sendo contemplado com um Prêmio Nobel da Paz, sabe-se lá por qual cargas d’ água, mas oficialmente por suas gestões pela paz no Sudeste Asiático, de onde as tropas estadunidenses colocaram o galho dentro e tiveram de sair rapidinho depois de anos e anos de incursões criminosas que provocaram milhões de mortes.

No mais, a história de Brizola, de Jango, de Juan Torres, de Michelini, Gutierrez Ruiz e Kissinger remete a uma questão que não pode ser esquecida no baú da história, ou seja, de que crimes contra a humanidade, como as cometidas pelos nazistas na II Guerra Mundial e agentes de segurança, civis e militares do Cone Sul, são imprescritíveis. E se os criminosos não forem punidos em vida, que a história se encarregue de remetê-los para o lixo junto com muitos personagens que cometeram atrocidades ao longo do tempo.



Em tempo. Sabem da última, muito próxima de uma piada? Armínio Fraga, um dos baluartes da política econômica da era FHC em uma entrevista num os canais a cabo disse ser de centro-esquerda, acrescentando que o Brasil não cresce mais dos que os atuais índices porque a presença do Estado ainda é muito grande.

Aliás, a patota do Estado mínimo está tendo grandes espaços midiáticos. FHC, por exemplo, aparece quase diariamente no Globo e assim sucessivamente. Podem imaginar o que seria do Brasil se os referidos pilantras voltassem?
Fonte:Direto da Redação.

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