sábado, 24 de abril de 2010

ECONOMIA - Maria da Conceição Tavares.


Conceição Tavares faz 80 anos e festa reúne, no Rio, Serra e Dilma

Vai ser uma festa de arromba. Daquelas que, se não entrar para a história, ficará para sempre na memória dos cerca de 200 convidados presentes ao aniversário de 80 anos da economista Maria da Conceição Tavares. A festança será exatamente como ela planejou: rodeada de filhos (Laura e Bruno), netos (Leon e Ivan) e amigos. Considerada decana de uma legião de economistas brasileiros, Conceição vai juntar “seus meninos”, como carinhosamente fala da sua enorme lista de ex-alunos.

A reportagem é de Liana Melo e publicada pelo jornal O Globo, 24-04-2010.

De economistas ilustres a précandidatos à Presidência da República, já confirmaram presença os adversários políticos Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB). Na lista de convidados, está o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, o ex-presidente do banco Carlos Lessa, além do reitor da UFRJ, Aloísio Teixeira, os professores da Unicamp, João Manoel de Mello e Luiz Gonzaga Belluzzo. Sem falar de peemedebistas históricos, como Rafael de Almeida Magalhães.

Procurada, a professora não quis falar sobre o assunto.

A festa vai ser hoje e está marcada para as 20h, na Casa do Minho, no Cosme Velho, Zona Sul do Rio. Conceição nasceu em 24 de abril de 1930.

— A Conceição é uma amiga e uma grande professora. É uma guerreira. Devemos agradecer a Portugal por ter nos presenteado com essa brasileira — declarou Dilma.

A escolha do local traduz à perfeição o estilo de Conceição.

Uma comemoração luso-brasileira para a aniversariante que nasceu portuguesa, na região de Aveiro, mas adotou a cidadania brasileira, três anos após desembarcar no Brasil em 1954.

O economista e ex-aluno José Luís Fiori resume a professora Emérita da UFRJ como “matemática, economista, intelectual com vasta formação histórica, filosófica e literária, professora, militante, deputada federal, torcedora fanática do Vasco e admiradora da Mangueira”.

No texto dedicado a ela, intitulado “À mestre, com carinho” — numa alusão ao clássico do cinema ‘Ao Mestre, Com Carinho’, de 1967 — Fiori remete a uma das características menos conhecidas de Conceição. A professora é cinéfila de carteirinha.

Professora prepara ensaio sobre América do Sul

“Poucos professores no mundo, ao chegar aos 80 anos, poderão assistir uma eleição da importância da que ocorrerá no Brasil, em 2010, e saber que os dois principais candidatos à Presidência da República foram seus alunos, e se consideram, até hoje, seus discípulos”. É assim que Fiori termina sua homenagem à Conceição, que prepara um ensaio sobre América do Sul para entrar no livro que o professor da UFRJ lança este ano.

— Pode ser até que os précandidatos não se encontrem na festa. Mas o simples fato de terem confirmado presença demonstra a enorme capacidade de Conceição de aglutinar admiradores, mesmo sendo polêmica — avalia João Saboia, diretor do Instituto de Economia (IE) da UFRJ.

A roupa para a festa e os sapatos foram escolhidos a dedo para evitar qualquer desconforto na festa. Aos amigos mais próximos, Conceição avisou que quer dançar. Se depender da trilha sonora, ninguém ficará parado.

Amante da Bossa Nova, o cardápio musical incluirá ainda “New York, New York” e até frevo.

Os mais íntimos garantem que é uma homenagem à amiga Hildete Pereira, professora da UFF e que fez a lista de convidados.

Filha de mãe católica e monarquista e de um pai anarquista, Conceição teria aprendido, ainda na infância, a conviver com as divergências ideológicas e uma ligeira “rebeldia anárquica”, como costuma comentar Fiori.

Conceição é uma mulher que nunca teve problema em desancar publicamente o que discordava.

Foi o caso de Marco Lisboa, que, em 2003, era secretário de Política Econômica e um dos autores do documento “Política econômica e reformas estruturais”, divulgado pelo Ministério da Fazenda: “Quase tive um ataque quando li aquilo! Estou histérica”, declarou na época.

O documento defendia a focalização dos programas sociais. E definiu o ex-aluno como “um bom menino que adorava fazer modelos matemáticos e adora até hoje”

Críticas até aos aliados mais próximos Nem mesmo o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, de quem foi aliada desde o primeiro momento, ficou a salvo. Em 2008, ela chamou de “imbecil” a política de juros.

Até hoje é vista como a maior representante do pensamento da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), celeiro de teses do desenvolvimento apoiado na industrialização voltada para o mercado interno. Foi lá que conheceu os mestres Celso Furtado, Anibal Pinto e Raul Prebish.

Em cinco décadas de atividade intelectual, Conceição publicou três livros considerados obrigatórios nas faculdades de Economia: “Auge e declínio do processo de substituição de importações”, “Acumulação de capital e industrialização no Brasil” e “Ciclo e crise: o movimento recente da economia brasileira”.

Na época da ditadura, exilou-se no Chile, onde conheceu José Serra, depois de escapar da prisão com a ajuda de Mário Henrique Simonsen, seu ex-aluno e, na época, ministro do governo Geisel. E foi eleita deputada federal em 1994 pelo PT.

Com a emoção à flor da pele, que a levou às lágrimas em cadeia nacional de televisão, ao defender o Cruzado, nos anos 80, Conceição mantém a verve afiada.

Sobre si mesma escreveu, certa vez, em publicação do Conselho Regional de Economia: “Eu pessoalmente, já fui para a cadeia, sem nem saber por que, dado que sou apenas uma rebelde, pelo que escrevo, pelo que esbravejo. Mas a vocês quero dizer o seguinte: já estou velha e cansada, mas não desisti”.

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