Por que Lula ainda se arrisca tanto?
A 254 dias do final dos seus oito anos de governo, o presidente Lula alcança 76% de aprovação na pesquisa Ibope divulgada nesta quarta-feira, um ponto percentual a mais do que no levantamento anterior. Apenas 5% dos eleitores consideram sua gestão ruim ou péssima. Talvez nem ele mesmo pudesse prever este cenário ao tomar posse em 2003, cercado de desconfianças dos antigos donos do poder aqui dentro e lá fora.
Mesmo com todo mundo já careca de saber que Lula não pode nem quer disputar um terceiro mandato, com o nome da sua candidata há meses nas ruas e nos noticiários, a pesquisa espontânea do Ibope ainda dá o presidente na liderança, com 16% das intenções de voto, seguido por Dilma, com 15%, e Serra, com 14%.
Imagino que qualquer outro governante numa situação tão favorável, em final de mandato, procuraria apenas se preservar, recolher os resultados dos excelentes indicadores econômicos e sociais já alcançados, e passar o pouco tempo que lhe resta no Palácio do Planalto só tocando a bola e correndo para os abraços de despedida.
Pois o presidente Lula está fazendo exatamente o contrário. Com um pique e uma agenda de quem está no início de governo, querendo fazer um monte de coisas ao mesmo tempo, entrando de cabeça nas bolas divididas da campanha eleitoral, age como se o seu próprio nome estivesse em jogo na urna eletrônica.
O lançamento agora de obras tão grandiosas quanto polêmicas, como a usina de Belo Monte e o trem-bala ligando São Paulo ao Rio, e as constantes viagens pelo Brasil e pelo mundo, colocam o presidente no centro do noticiário, em geral bastante crítico, ao lado das suas cada vez mais ousadas investidas na política externa e nos embates com a Justiça Eleitoral.
Que Lula não foge da raia, gosta de uma boa briga e de desafiar sempre o status quo, todos nós sabemos, desde que ele surgiu na vida pública como líder sindical na segunda metade dos anos 70 do século passado. Assim como não é comum os índices de popularidade de um presidente subirem ao invés de cairem em final de mandato, também não está nos antigos manuais de política este ativismo governamental exacerbado no momento em que o país começa a discutir a sua sucessão.
A única explicação que encontro para este aparente paradoxo está na mesma pesquisa Ibope em que o tucano José Serra sobe um ponto (foi para 36) e a petista Dilma Roussef cai um (para 29), alargando para sete pontos a diferença entre os dois principais candidatos, tudo dentro da margem de erro. No último Datafolha, da semana passada, a vantagem de Serra é de nove pontos.
Estamos apenas no início da pré-campanha e a candidata do governo, que nunca havia disputado uma eleição, já está no patamar histórico de largada do PT, algo em torno de um terço do eleitorado. Da mesma forma, o candidato da oposição mantem-se dentro da faixa de outro terço dos que não votam no PT. Até aí, está tudo dentro do previsível, como nos mostraram as últimas quatro campanhas presidenciais no país disputadas entre PT e PSDB.
Nos próximos três meses, dificilmente haverá alterações profundas neste quadro, mesmo com a anunciada saída de Ciro Gomes da disputa, com um desfecho previsto para estes dias. Daqui até a Copa do Mundo da África do Sul, as atenções dos brasileiros estarão mais voltadas para o futebol do que para a política. Entre Serra e Dilma, o país parece mais interessado em brigar com Dunga para que ele convoque logo Neymar e Ganso, as novas unanimidades nacionais.
A terceira fatia do eleitorado, que no momento não está com Serra nem com Dilma, e é quem vai decidir a parada no final, só costuma despertar para a disputa sucessória a partir de agosto, quando começa o horário político no rádio e na televisão. Por isso mesmo, o bom senso recomenda que, quanto menos marola o governo fizer agora, com o presidente Lula se dedicando mais à rotina administrativa do que à campanha, ainda mais num ano em que a economia voltou a crescer, melhor será para ele mesmo e a sua candidata.
O normal em qualquer embate polarizado entre duas candidaturas é que o governo, se bem avaliado, jogue na defesa e, a oposição, sem outra escolha, vá ao ataque. Até agora, porém, nos primeiros lances da pré-campanha, está acontecendo exatamente o contrário, com o presidente Lula sempre na ofensiva e Serra fingindo que não é com ele.
Os leitores teriam alguma outra explicação para a pergunta que faço no título?
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