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CARTA A UM
EXILADO
Amigo
meu, do outro lado do Atlântico me escreve perguntando o que está acontecendo no
Brasil. Respondo e repasso:
A questão dessa baderna que
se têm feito pelas cidades brasileiras é preocupante e o que a motiva é bastante
reconhecível. Notadamente a TV Globo vêm especulando novas tentativas
de desgastar a popularidade do governo para criar alguma oportunidade à oposição
nas próximas eleições.
Mais que isso, estimula a
insatisfação dos militares. Acabou uma novela onde o herói era um personagem do
exército que por questões pessoais se envolve no combate ao tráfico de pessoas e
já começa outra em que integrantes da aeronáutica desenvolvem investigações de
corrupção como se fossem da Polícia Federal.
Aproveitam-se da comoção dos
militares pela Comissão da Verdade e da Justiça conferida à Dilma Rousseff a
quem acusam de revanchista, o que não deixa de ser um reconhecimento de culpa
pelos crimes praticados. Não apenas à Dilma, já que muitos que acusam o
revanchismo da Presidenta não a conheceram. Temem uma revanche pelos crimes
praticados contra o Brasil e os brasileiros em geral, entre os quais você se
inclui.
Mas na realidade o Brasil
está apenas cumprindo uma exigência da OEA que determinou estas investigações
por sermos o único do país do cone sul que ainda sequer investigou o
desparecimento de centenas de cidadãos e a prática da tortura durante o regime
das ditaduras. As duas: de Vargas e dos Militares.
Evidente que o GAFE (Globo,
Abril, Folha e Estadão) sabe dessa condição imposta pela OEA ao Brasil, mas tentam insuflar as Forças
Armadas na tentativa de desestabilizar o atual governo.
Afora isso continuam usando
à exaustão a ideia da corrupção à qual sempre foram não apenas coniventes, mas
grandes beneficiários. Você deve estar bem lembrando de que a Globo era apenas uma emissora do Rio de
Janeiro e cresceu nacionalmente a custas da pressão da ditadura à TV Excelsior
que levou Wallace Simonsen ao suicídio. Todo o patrimônio do então maior
empresário brasileiro foi saqueado pelo simples fato de ele ser amigo e apoiar o
governo de Jango Goulart. Assim a Globo se tornou a maior empresa de comunicação
do país e com a extinção da Panair, do mesmo
Simonsen, a VARIG dominou o tráfego aéreo.
O combate à corrupção desde
o início do governo Lula levou a VARIG a falência e recentemente uma publicação
dos Estados Unidos comentou o impressionante número de pessoas levadas a cadeia
por esse crime, afirmando que em nenhum outro país tantos corruptos são
identificados e aprisionados quanto no Brasil. Mas lógico que o GAFE não
revelará ser esse o motivo de seu o anseio pelo retorno dos tucanos que lhes
foram ainda mais propícios do que os militares.
Eles criaram Collor de Melo
para substituir a ditadura na defesa de seus interesses e para isso usaram uma
novela: “Que rei sou eu?”, respaldada pela manipulação dos noticiários sobre
aquele a quem a revista Veja batizou de “Caçador de Marajás”. Acontece que
Collor resolveu repartir o butim exclusivamente com os de seu próprio grupo e se
sentiram como o chefe do cartel de tráfico ludibriado pelo “mula”.
Então lançaram outra novela:
“Anos Dourados”, e levaram a rapaziada de então às ruas inventando o Movimento
dos Caras Pintadas para derrubar a própria criatura. Como declarou Roberto
Marinho à produção da BBC em “Além de Cidadão Kane” que pode ser assistida pela
internet: “Nós o pusemos e nós o tiramos”.
Com o Plano Real FHC deu a
impressão de ter controlado a inflação, mas apenas maquiou a especulação
cambial, congelou os salários, a produção e o mercado enquanto novos saques eram
estimulados com as privatizações. Com seu naco no esquartejamento do bem público
a mídia deu sustentabilidade ao governo e ao ego do tal sociólogo. Acontece que
os saques raparam o cofre público e no segundo mandato Cardoso levou o Brasil
aos cofres internacionais, aprofundando a crise social e a dependência do país
engessado e privatizado através de orgíaca corrupção que sucateou nossa
infraestrutura e elevou a inflação aos píncaros.
O fosso era tão fundo que
tinham total certeza de que o operário nordestino sem estudos jamais conseguiria
sair de lá de dentro, só que “sem estudo” não é sinônimo de burro nem de canalha
e em 3 anos o operário fez o que eles não foram capazes de fazer desde 1964,
durante 4 décadas.
Daí o jeito foi inventar a
novela do Mensalão, mas o herói que arrumaram estava mais para vilão de cinema
mexicano. Tentaram até transformá-lo em tenor de opereta através do programa do
Jô Soares, mas definitivamente não convenceu: canastrão e demais de desafinado.
Além de que o enredo foi muito mal desenvolvido pelo roteirista e a população
não conseguia compreender como é que “o maior esquema de corrupção da história
do Brasil” pôde pagar a maior dívida externa da história das nações. Nesse
impasse a população não foi às ruas e o golpe, através do impeachment ao governo
Lula, não só gorou como o operário foi reeleito.
Já pro final do segundo
mandato viram que não tinha mais jeito e no desespero tiveram de se reivindicar
como admiradores e apoiadores do operário nordestino, mas sem deixar de cair de
pau na perigosa terrorista procurada pelo DOPS. Burrice, pois assim como eu e
você muita gente lembra que o verdadeiro terrorista perigoso era o
DOPS.
Dilma se elegeu como
candidata do Lula e com a fama de durona. Essa fama lhes fez medo e, por outro
lado, tiveram de recolher as agressões que, por ser contra uma mulher, à
população soou como mera deselegância e chauvinismo.
E assim vêm procurando e
testando novas possibilidades de promoção de golpe contra o governo do PT, um
partido que no geral é falho como qualquer outro, mas sob o qual se reúne o
melhor quadro de estrategistas políticos do Brasil. Como nos demais partidos de
todas as tendências, a maioria dos
integrantes do PT também é de personalistas cujos interesses políticos não
passam de projetos individuais, mas José Dirceu já havia defendido o partido do
fisiologismo através do chamado Núcleo Duro.
Não circulo dentro do PT nem
tenho informantes no governo, mas observando
de fora tenho a impressão de que existam dois PT: o que está no governo e outro no partido. Isso também tem sido
problema para a oposição que ficou sem o flanco partidário para bater. Por mais que arrebentem as desguarnecidas defesas do
partido não atingem o governo.
Foi o que se pôde sentir com
o reaquecimento da gororoba do Mensalão através do STF, em tentativa de manter
os espaços regionais sob o poder da direita. Novo espetáculo mediático para o
qual tiveram o cuidado de inovar escolhendo um herói negro: Joaquim Barbosa.
Outra burrice isso de acreditar que basta enfiar um negro na trama para o “Vale
a Pena Ver de Novo” conquistar popularidade.
De nada adiantou, até porque
arrumaram um negro pernóstico e antipático, tão ególatra quanto qualquer
branco metido. Não é por ser negro ou branco que se distingue o caráter das
pessoas e a cor da pele não dá direito a ninguém de impor versões de fatos não
ocorridos. Juiz ou trocador de ônibus, mentiroso é mentiroso e o atual
presidente do STF mentiu um encontro circunstancial para a comprovação de desvio de dinheiro público que só
poderia ter ocorrido se o indicado como corruptor ressuscitasse da tumba onde
enfiaram seu corpo 2 meses antes, após morrer num desastre de
avião.
Mas mesmo antes de desfiar o
cozido pelo Barbosa durante o julgamento do Mensalão, o angu de caroço já se comprovou intragável ao paladar do eleitorado, pois a oposição perdeu
as eleições de todo jeito, inclusive à prefeitura de São Paulo.
Qual a saída? Sem candidato
e proposta o jeito é levar as massas às
ruas, criar clima e justificativa para tirar as tropas dos quartéis, mobilizar
as elites, entusiasmar a classe média,
alimentar mais uma impressão de “revolução de
república das bananas” tipo aquela de 64 em resposta à marcha de deus com a
família pela salvação da propriedade. Claro que mera reunião de senhoras de
Santana não justificaria os ânimos arredios das Armas mal vistas pela lembrança
das “exceções” do passado, mas como vivemos em tempos de informática,
encontrou-se o jeito que na época sugeri para conter o golpe do Mensalão. Então
a esquerda ficou cética e garantiu que não há mais meio de mobilizar
multidões.
Há! Há, sim. Como houve na
Primavera Árabe, como houve na Espanha, como há em qualquer parte do mundo. O
que falta é liderança para apontar rumos à multidão, pois uma multidão sem rumo
é um monstro e aqui no Brasil só há uma personalidade capaz de dar rumo a essa
multidão que hoje ocupa as ruas e certamente não é Aécio Never, a Heloísa
Helena, o Eduardo Campos e ainda menos FHC ou Serra. Nem preciso dizer o nome do
único brasileiro capaz de dar algum sentido a essa rapaziada em movimento nas
ruas. Em movimento para justificar outros movimentos que nada têm a ver com
esses que jovens que se movimentam pelas ruas do país sem ter a menor ideia do porque se
movem.
Há pouco mais de um mês
ensaiaram uma convocação popular usando o programa Bolsa Família. Num final de
semana andaram distribuindo pela internet a notícia de que o programa seria
suspenso e quem não retirasse o último pagamento do benefício até o primeiro dia útil da semana seguinte, ficaria sem.
O ensaio deu certo e na segunda-feira a multidão acorreu às agências
da Caixa Econômica tumultuando o sistema financeiro
do banco. Como pobre é mais recatado e educado do que a classe média, não
houve nenhum quebra-quebra, nenhum vandalismo. Aqueles tinham um objetivo e a
meta era apenas a de garantir o que a informação mentirosa afirmava que deixaria de existir.
O movimento engarrafou
temporariamente o tráfego dos recursos da
instituição, mas nada que não se resolvesse
rapidamente. Tudo foi normalizado em poucos dias, mas o teste comprovou aos golpistas a eficácia do
método. Era só esperar a próxima
oportunidade que já vinha sendo sistematicamente criada pela mídia através de acusações diárias de superfaturamento nas obras dos estádios que
recepcionarão a copa do mundo e, agora, a das Confederações.
Meses antes o noticiário
repetia a cada edição que os estádios não estariam prontos a tempo. Pois ficaram
prontos e como em todas as copas e olimpíadas que ocorrem pelo mundo afora, aqui
também os custos das obras superaram as previsões, como acontece em qualquer
obra de pequeno, médio ou grande porte, seja empreendimento civil ou público. Eu
mesmo, depois de orçar e re-orçar minuciosamente os custos de material e mão de
obra para a ampliação de cerca de 14 metros quadrados de sala e cozinha daqui da
pousada, já quebrei minhas minguadas economias
e o que imaginei em 15 mil vai me sair a 30 e sei lá onde vou poder
buscar dinheiro para o que falta.
Pois a mídia passou a acusar
o governo de ter buscado o dinheiro para a conclusão dos estádios retirando-os
dos custos dos programas sociais. Aqueles
mesmos programas que ainda ontem acusavam de demagógicos. Mesmo com os programas
sociais, como o Bolsa Família, funcionando sem qualquer alteração, a multidão
que lotou a abertura da Copa das Confederações vaiou Dilma na inauguração do
segundo maior estádio do Brasil: o Mané Garrincha.
O mais espantoso nem é a
deslavada mentira sobre o desvio de verbas dos programas sociais, mas o fato de que
o preço mínimo pago de ingresso à abertura da Copa e inauguração do
estádio foi de R$ 160,00. E o máximo de mais de R$ 800,00. Ou seja, ninguém
entre os que vaiaram a Dilma por acreditar que desviou dinheiro de programa
social, precisa utilizar benefícios dos programas sociais.
Juntasse a vaia da classe
média em Brasília ao aumento de R$ 0,20 (vinte centavos) nas passagens de ônibus
urbanos, e pronto! É só acender o pavio pelas redes sociais da internet
convocando a multidão às ruas.
De resto é seguir o exemplo
do mestre Paulo Maluf e infiltrar os provocadores para depois mandar a polícia
descer o cacete como aconteceu na Freguesia do Ó na década de 70, está lembrado?
Nisso Geraldo Alckmin, com carinho, dá lição ao mestre, pois em seu mandato
anterior o superou em muito sequestrando o estado todo através do PCC. E por pouco não elege um integrante da facção na
última eleição a deputado estadual! Só não deu certo porque a polícia desconfiou
da Ferrari que o correligionário do PSDB adquiriu em apenas três anos de
liberdade condicional.
Mas vai dando a impressão de
que perderam a mão mais uma vez, pois a gurizada da classe média que apenas
pretendia brincar de revolucionários é quem tem tomado borrachada da polícia do
Alckmin que ainda não prendeu nenhum provocador encapuzado. Nem mesmo para
descobrir a cara de quem se esconde atrás da carapuça.
E o que se pretendia como
revanche da derrota do Serra para o Haddad, começa a se voltar contra o
feiticeiro, pois ontem queimaram um boneco de pano onde se inscrevia a sigla
PSDB. No vídeo, a tomada da câmera da TV Bandeirantes distingue claramente a
sigla com o tipo de letra usado pelo partido, mas o narrador do noticiário da
emissora primeiro afirmou que o boneco representava o PT e só quando se deu
conta da inegável visibilidade das letras P,S,D e B é que jurou por todos os
santos que o boneco também representava o PT apesar da imagem na tela de minha
TV em nada identificar ou relacionar o boneco ao PT.
Também têm ocorrido
confrontos entre manifestantes e provocadores e o protesto se espalhou por todo
o país, embora invariavelmente as respostas à pergunta sobre contra o que
protestam divague por disparates e ridículas manifestações de inconsequência
adolescente. Na maioria das respostas não há nada a ver com os R$ 0,20 do
aumento na tarifa do ônibus. Com olhinhos brilhantes de noite de baile de
debutantes, quase todos os entrevistados apenas reivindicam o direito de
protestar como fizeram seus pais e tios nos anos 70 e seus irmãos mais velhos
atenderam ao apelo do Roberto Marinho em 1992. Demonstram-se tão dispostos
quantos seus irmãozinhos mais novos se perguntados se querem visitar a
Disneylândia.
Assisti a uma garota
responder a pergunta direta da repórter sobre contra o que estava protestando.
Sorridente e saltitante a garota respondeu sob o olhar orgulhoso do papai ao
lado: “- Nash! Sei lá... Contra tudo o que está aí.”
Por ser previdente a
repórter não perguntou o que é que está aí, pois se o fizesse a garota poderia
começar a pensar e quem pensa descobre algo sobre si. E é aí que mora o perigo!
Imagine você se um grupo de
provocadores bem intencionados começa a chamar as palavras de ordem do nosso
tempo. Coisa tipo: “Fora Globo que o povo não é bobo!”
Como dizia Vandré, isso
será “a volta do cipó de aroeira no lombo de
quem mandou dar”. Ou numa conclusão mais clássica
pode ser tornar em “tiro que saiu pela culatra”.
Mas ainda é cedo para
cogitações otimistas ou pessimistas. É preciso esperar para ver como eles se
viram para conter o que deflagraram, caso o exército não ponha as tropas nas
ruas para mandar a garotada de volta pra casa.
E aí tem outra questão a ser
avaliada: se intervier o exército não estará criando as Dilma Rousseff do
futuro?
A meu ver, dê no que dê as
investigações da Comissão da Verdade e da Justiça da OEA, em nome dos patronos
das instituições de defesa da pátria a Justiça Militar deveria mais é julgar os
criminosos que depõem contra a imagem das Forças Armadas Brasileiras perante o
mundo, antes de fazer o país passar pela vergonha de ser obrigado a fazê-lo por
um organismo internacional. Além disso, há que se considerar o risco de ao longo
da rave urbana esses garotos incluir nesse “tudo que está aí” os
reflexos e consequências do mais longo período da história política brasileira
depois do Império.
Não sou soldado e não vou me
deixar utilizar por essa onda. Também não vou gritar que o povo não é bobo. Se a rapaziada começar a ficar esperta, quem
pariu Mateus que o embale.
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