domingo, 30 de novembro de 2008

GASTRONOMIA - Retalhos de Viagem.

Lecticia Cavalcanti

Oliver Roellinger, um dos maiores chefs da França, passou toda a vida em busca das três estrelas do Guia Michelin - a maior distinção, para qualquer chef do mundo. Assim deixaria seu nome na história da culinária francesa, junto a Paul Bocuse, Pierre Troigros, Michel Guérard, Joël Robuchon. Em 2006, afinal realizou seu sonho. E ganhou ainda mais clientes. Só que tudo tem seu preço. E, junto com honra e fama, vieram também estresse, fadiga, insônia, úlcera.

Agora, sábado 8 de novembro, o Le Fígaro deu em manchete que Roellinger decidiu fechar seu restaurante especializado em frutos do mar. O Maison de Bricourt, em Concale (Noroeste da França), passará a ser só mais uma saborosa lembrança. "Depois de 26 anos de felicidade à frente dos fogões, todo dia me custa mais assumir fisicamente minhas tarefas cotidianas", confessou ele.

Não será o primeiro a abandonar as cobiçadas estrelas. Antes dele vieram Joël Robuchon (em 1996) considerado o "chef do século"; seguido por Alain Senderens (em 2005) e Alain Westermann (em 2006). "Vou escrever um novo capítulo de minha vida", assim encerrou a entrevista. Os clientes vão reclamar. Mas seu retrato, no jornal, era o de um homem feliz.

***

Le Relais de Venice, mais conhecido como L'Entrecôte, é um charmoso restaurante de Paris - 271, Boulevard Pereire. É muito especial e diferente de todos os outros. Porque, desde 1959, serve apenas um prato - entrecôte (contra-filé) com molho de estragão acompanhado de batatas fritas crocantes e douradas. Como entrada, salada verde com molho vinagrete e nozes.

A garçonete, ao lhe servir, fará só duas perguntas. Uma no começo, sobre o ponto da carne - bleu (muito mal passada), saignant (mal passada), à point (ao ponto) e bien cuit (bem passada). Outra, no fim, para escolher a sobremesa - profiterolles au chocolat, gâteau du relais, semi freddo au Grand Marnier, tulipe de pêches et abricots Melba, creme brûllé du jour, sorbet au cassis.

O restaurante abre todos os dias, com horário bem rígido: almoço, das 12h às 14h; e jantar, das 19h às 22:45 h. Não aceita reservas. E tem, invariavelmente, filas enormes. Para conseguir sentar em uma de suas mesas pequenas e bem apertadas tem antes que esperar em pé na fila. Democraticamente. O segredo de tanto sucesso está na carne, muito macia; e, sobretudo, no molho, muito especial - invenção de Paul Gineste de Saurs, primeiro dono do restaurante.

A receita é guardada cuidadosamente, num cofre, por seus descendentes. O Le Monde até arriscou um palpite; dizendo ter, entre seus ingredientes, fígado de galinha e grande quantidade de manteiga. Tudo, claro, logo negado por Mme. Godilot, herdeira e atual proprietária do restaurante. Para completar, ele não é caro. Quando for a Paris não perca esse jantar.

***

Um dos melhores restaurantes de Lisboa é a Adega de Tia Matilde - Rua da Beneficência, 77, Praça de Espanha. Lá, além dos pratos, há a vantagem insuperável de ter poucos turistas. Você, quase certamente, vai encontrar o ex-jogador Eusébio, freqüentador assíduo do lugar. No início, era apenas uma taverna onde trabalhadores se reuniam depois do expediente. Tudo começou com Dona Matilde, claro. Depois que morreu, assumiu seu filho Emílio e a nora Dona Isabel Andrade - uma exímia cozinheira.

Aos poucos, aquela taverna simples se converteu em restaurante de prestígio. Acontece que comida e paixão, tantas vezes, andam juntas. E o galante Emílio acabou se apaixonando por uma das ajudantes de cozinha. Dona Isabel, coitada, não resistiu e morreu. De desgosto, segundo dizem. Mas o restaurante sobreviveu. Hoje, a cozinha é comandada por três cozinheiras que aprenderam tudo com ela. Emílio continua recebendo os clientes; e sua filha, também Matilde, toma conta do caixa.

O ambiente é simples e a comida muito especial. Como entrada, recomenda-se patanisca, gambas cozidas, amêijoa à Bulhões Pato, carapauzinhos fritos. Como prato principal, bacalhau assado com batatas ao murro, garoupa no tacho, arroz de Tamboril, isca de porco a portuguesa, febras de porco na grelha, bife à tia Matilde. Finalmente, como sobremesa, torta folhada de maçã, marmelo assado, arroz doce, montanha russa, trouxa de ovos. É visita obrigatória.

***

RECEITA: BACALHAU ASSADO COM BATATAS AO MURRO

INGREDIENTES:

4 postas de bacalhau demolhado

2 cebolas

4 dentes de alho

300 ml de azeite

1 kg de batatas

1 raminho de salsa

100 g de azeitonas pretas

Sal grosso

PREPARO:

- Em um refratário, coloque as postas de bacalhau demolhado, as cebolas cortadas e os alhos picados. Regue com azeite. Leve ao forno, até que o bacalhau esteja cozido e dourado (aproximadamente 40 minutos).

Em outro refratário, coloque as batatas (com casca) polvilhadas com sal grosso e azeite. Leve ao forno. Quando estiverem cozidas, retire do forno e dê um murro (literalmente) em cada uma. Coloque essas batatas junto ao bacalhau. Regue com azeite. Decore com a salsa e as azeitonas. E sirva logo.

Lecticia Cavalcanti coordena o caderno Sabores da Folha de Pernambuco, escreve na Revista Continente Multicultural e no site pe.360graus.

Fale com Lecticia Cavalcanti: lecticia.cavalcanti@terra.com.br
Fonte:Site Terra Magazine.

Nenhum comentário: