A declaração de Shimon Peres, de que morrem mais crianças palestinas do que judias porque os judeus cuidam melhor das suas, é, em sua frieza e desdém, a confissão de que se executa o projeto de genocídio que o movimento sionista mundial estabeleceu, quando decidiu criar o Estado de Israel. Só há duas formas de construir um Estado soberano em território alheio: com o assentimento de seus habitantes ou com o seu extermínio.
Por Mauro Santayana*
Os palestinos não perceberam o que os judeus que adquiriam terras em seu território, ainda no fim do século 19, pretendiam. Só se deram conta do perigo em 1917, quando lorde Arthur James Balfour, em carta a Lionel Rothschild – o banqueiro que financiava os sionistas – lhe assegurou a decisão britânica de apoiar a criação de um "lar nacional judeu" na Palestina. Como se encontravam sob domínio otomano e em plena Primeira Guerra Mundial, os árabes não puderam reagir imediatamente, o que só fariam depois do armistício.
A Declaração Balfour é interessante, porque revela as circunstâncias conjunturais que a originaram. A guerra na Europa estava em momento indefinido, e os ingleses pressionavam o presidente Woodrow Wilson, dos Estados Unidos, para que enviasse tropas ao continente. Esse documento estimulou os ricos judeus de Nova York a exercer também sua influência sobre a Casa Branca, e os soldados norte-americanos desembarcaram em março do ano seguinte na Europa. O secretário do Exterior da Grã-Bretanha teve o cuidado de assegurar, na Declaração, que o apoio não poderia causar prejuízo aos "civil and religious rights of existing non jewish communities in Palestine".
Essa foi uma atitude insensata, e disso se deram conta os ingleses. Em 1920, terminado o conflito mundial, e atribuído aos ingleses, pela Liga das Nações, o mandato sobre o território palestino, os países árabes se reuniram em Damasco e manifestaram seu repúdio à Declaração Balfour. Não obstante isso, os ingleses responderam com a nomeação de um conhecido sionista para administrar a área, Herbert Samuel. Os árabes perceberam o que os esperava, e consideraram 1920 am al-nakbah, o ano da catástrofe. Mal sabiam que catástrofes ainda maiores viriam, como a destes dias em que – confirmando o projeto de limpeza étnica – escolas mantidas pelas Nações Unidas, claramente identificadas, são alvos escolhidos por Israel.
Desde então, os palestinos não deixaram de protestar, de lutar pelo seu espaço histórico. Na verdade eles são semitas que não deixaram o território e foram, com o tempo, convertidos ao islã. Há quase um século, são acossados por judeus europeus, que têm a cara e os métodos de quaisquer colonizadores. Ao mesmo tempo em que o nazismo se fortalecia na Europa e iniciava a perseguição aos judeus – mas, também, aos outros povos que eles consideravam inferiores, como os eslavos, os negros e os ciganos – os palestinos continuavam a lutar contra os invasores. Em 1935, terroristas judeus assassinaram seu líder, al-Qassam, o que provocou rebelião geral dos palestinos, de 1936 a 1939, massacrada pelas tropas britânicas e por 15 mil judeus – que constituíram o núcleo inicial do Exército de Israel.
A Primeira Guerra Mundial havia sido desastrosa para os palestinos. A Segunda lhes foi ainda pior. Depois da vitória aliada, os ingleses perceberam, com o grande homem de Estado de esquerda, Ernest Bevin, então secretário do Exterior, que haviam cometido, mais do que um crime, grande erro estratégico, diante dos interesses britânicos no Oriente Médio. Bevin tentou voltar atrás, proibir o prosseguimento da imigração de judeus em Israel e forçar a divisão do território em dois estados – o que não conseguiu. Em julho de 1946, terroristas judeus, sob o comando de futuros e "respeitáveis" estadistas, como Menachen Begin, invadiram o Hotel King David, ocupado pela administração militar e civil britânica, e mataram 91 pessoas.
Com todos esses fatos históricos, a Organização das Nações Unidas, dominada pelos quatro grandes vencedores do conflito (e a União Soviética foi nisso particularmente responsável), decidiu impor aos palestinos a presença definitiva dos israelitas. Mas foram sobretudo os norte-americanos, com Truman, que patrocinaram o projeto: necessitavam de um enclave na região.
Dizia Adorno que, depois de Auschwitz, toda a cultura do Ocidente era um lixo. O intelectual marxista estava enganado.
Fonte:Site O Vermelho.
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