O seu nome evoca no mundo inteiro a lembrança de Dien Bien Phu, a batalha que, em 1954, colocou em marcha o exército francês na Indochina. Está associado à ofensiva do Tet que, em 1968, marcou uma reviravolta na guerra contra os EUA. Reverenciado no Vietnã como um herói nacional, aos 97 anos, o general Vo Nguyen Giap lança a sua última batalha contra uma nova ameaça: a invasão do capitalismo chinês. Giap é o principal expoente de uma contestação que coloca o regime comunista de Hanói em dificuldade, acusado de vender aos chineses os recursos naturais mais preciosos. A reportagem é de Federico Rampini, publicada no jornal La Repubblica, 30-06-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A pedra de escândalo é um das mais vastas jazidas de bauxita do mundo. Um tesouro escondido na região dos altiplanos centrais, ainda intacta em grande parte. Naquela área, estende-se a sombra da China, compradora de um mineral que é a matéria-prima para a produção de alumínio.
O governo vietnamita, por meio do seu monopólio de Estado Vinacomin, cedeu às ofertas de Pequim. Por 15 milhões de dólares, Hanói concedeu ao conglomerado chinês Chinalco os direitos de exploração da bauxita até 2025. Até 2015, a China espera extrair 6,6 milhões de toneladas de mineral por ano. É um roteiro que se repete em toda a Ásia: a riqueza de Pequim é o instrumento de um neocolonialismo voraz, das florestas da Indonésia aos diamantes da Birmânia, a expansão do dragão chinês parece incontrolável. Mas a República Popular fez as contas sem o patriotismo do indômito general.
Giap tem um prestígio tal que lhe permite atacar impunemente os dirigentes comunistas de Hanói. Ele não hesita em gastá-lo pela última vez, agora que sente o interesse nacional em perigo. "O projeto da Chinalco – declarou publicamente o velho militar – terá graves consequências para o ambiente, para a nossa sociedade e para a segurança do país".
Acusações graves, que a propaganda do regime não pôde calar. Acima de tudo, a legitimidade dos líderes atuais está ligada aos gestos da "geração Giap": ele é o último sobrevivente militar entre os companheiros de estrada de Ho Chi Minh, os protagonistas da longa resistência contra os EUA. O líder interpela diretamente a nomenklatura: "Convido o partido e o governo a escolherem uma política sadia para o futuro dos altiplanos centrais e das minas de bauxita".
Giap sabe tocar uma parte sensível do seu povo. A sensibilidade ambiental se difundiu recentemente, e só esse argumento não bastaria. Mas a desconfiança com relação aos chineses tem raízes profundas na história nacional. Durante um milênio, o Vietnã foi assediado pela influência do Império celeste. Mais recentemente, em 1979, teve que resistir à invasão militar de Deng Xiaoping, decidido a "castigar" o Vietnã pela sua hostilidade aos khmer vermelhos do Camboja, defensores da China.
Os altiplanos centrais são povoados por minorias étnicas em perigo. A penetração do capitalismo chinês pode destruir equilíbrios demográficos delicados. A Chinalco, segundo os costumes das grandes empresas de Pequim, traria consigo milhares de operários e empresários chineses. Uma invasão pacífica, sustentada pelo poder do dinheiro, mas igualmente odiosa para o velho herói de guerra.
O ataque de Giap teve efeitos milagrosos. Deu coragem a outras vozes de dissenso, em uma sociedade civil que se moderniza velozmente. Quem se colocou como escudo do general de 97 anos, expondo-se, foram 135 acadêmicos, economistas e cientistas. Eles também assinaram um pedido ao governo, com tons duros para com a China: "A República Popular tem uma fama sinistra pelos desastres ambientais que está provocando".
Baseados em um forte espírito de independência nacional, os ambientes mais diversos se mobilizam contra o extermínio da bauxita: redutos de guerra e jovens ambientalistas, monges budistas e comunidades católicas. A censura não é onipotente. Florescem os blogs em um país que já tem 20 milhões de usuários da Internet dentre 89 milhões de habitantes. Graças a Giap, a crise de consenso com relação a um modelo de desenvolvimento que parecia vencedor começa a aparecer.
Nos últimos anos, o Vietnã havia começado a se tornar uma pequena China, com uma florescente economia de mercado, dirigida por um regime não liberal. Os investimentos estrangeiros afluíram em abundância. Hanói obteve, em 2007, o ingresso na Organização Mundial do Comércio. Mas a recessão global deixou marcas. Em 2009, o Fundo Monetário Internacional prevê que o PIB vietnamita cairá em 5%. O fascínio do modelo chinês sofre um impasse: sobretudo se os dividendos do saque de recursos naturais acabam diretamente em Pequim. |
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