quinta-feira, 20 de agosto de 2009

ANOS DE CHUMBO - Ditadura brasileira ajudou a fraudar a eleição presidencial uruguaia em 1971.

Um memorando tornado público e intitulado “Top Secret Conversation”, revela que a ditadura brasileira ajudou a fraudar a eleição presidencial uruguaia em 1971. O general brasileiro Vicente Dale Coutinho queixou-se na época de que os “Estados Unidos obviamente desejam que o Brasil faça todo o trabalho sujo na região”. A reportagem é do Página/12, 19-08-2009. A tradução é do Cepat.

Na medida em que saem à luz os arquivos da CIA, torna-se cada vez mais evidente o papel que jogou a ditadura brasileira (1964-1985) na América do Sul para instaurar regimes afins. Segundo um memorando intitulado “Top Secret Conversation”, o Brasil contribuiu com a fraude eleitoral que levou ao poder em 1971 no Uruguai, o ditador Juan María Bordaberry. “É a primeira vez que se confirma a colaboração do Brasil na instrumentação de fraude eleitoral”, destacou o ex-senador do Partido Nacional (PN) Juan Raúl Ferreira, filho do então candidato presidencial pelo mesmo partido, Wilson Ferreira Aldunate.

A mesma informação foi divulgada pelo National Security Archive, organização de investigação sobre documentação oficial e políticas de segurança nacional em Washington. A cena descrita no texto transcorre em Londres em 20 de dezembro de 1971, apenas um mês após o triunfo de Bordaberry. A reunião envolveu três homens: o então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon; seu secretario de Estado, Henry Kissinger, e o então primeiro ministro britânico, Edward Heath. Nixon falava sobre o papel do Brasil na América do Sul e disse a Heath: “Nossa posição é que apoiar o Brasil é a chave para o futuro. Os brasileiros ajudaram a preparar as eleições uruguaias. Há forças trabalhando que nós não abandonaremos”.

Segundo se depreende do mesmo documento, alguns dias antes, no dia 09 de dezembro do mesmo ano, Nixon realizou uma reunião com o ditador brasileiro Emilio Garrastazú Médici. Nesse encontro, Médici confirmou ao norte-americano que o trabalho foi feito. O candidato derrotado disse na época que foi o mais votado e denunciou fraude, mas nunca foi ouvido. As urnas foram guardadas e deu-se a vitória ao Partido Colorado. “É uma coisa que mexe comigo. Não quero que se coloque em tom revanchista, mas gratifica-me porque é o único episódio da vida pública de Wilson em que ficou uma questão não resolvida, porque ainda persistem os que falam que foi um recurso de um mau perdedor ao falar de fraude”, disse o filho do candidato do Partido Branco. “Esta é uma correção história ”, acrescentou Ferreira em declarações à imprensa local de Montevidéu.

Bordaberry, após a fraude nas eleições assumiu em 1971 e dissolveu o Congresso em 1973 e deu início a uma ditadura que ele mesmo conduziu, apoiado pelos militares até 1976. Nessa data, os mesmos militares o depuseram e prolongaram o regime por quase dez anos.

Hoje Bordaberry está preso em seu país, processado por violações aos direitos humanos e na semana passada, a Procuradoria pediu 45 anos de prisão para o ex-ditador. Seu filho, Pedro Bordaberry é o candidato do Partido Colorado para as eleições nacionais do próximo dia 25 de outubro, eleições em que os candidatos a presidente se pronunciarão sobre a revogação de uma lei que anistiou os militares pelas violações aos direitos humanos nesse período.

As eleições de 1971 foram as primeiras em que se apresentou a incipiente Frente Ampla (FA) com seu líder histórico, Líber Seregni, como candidato. Mas segundo o jornal uruguaio La República, se Seregni ganhasse, a ditadura de Brasília teria um plano chamado “30 horas” pronto para invadir a Banda Oriental

O “Top Secret Conversation” menciona, por sua vez, a preocupação entre alguns militares brasileiros de que eles teriam que se encarregar da parte operativa da iniciativa. Concretamente, o general Vicente Dale Coutinho queixou-se de que os “Estados Unidos obviamente desejam que o Brasil faça todo o trabalho sujo na região”.

Segundo revelaram outros documentos da mesma época tornados públicos na semana passada, os Estados Unidos e o Brasil discutiram esforços para coordenar intervenções clandestinas contra os governos de esquerda no Chile, Cuba, Paraguai e Peru, com o objetivo de evitar o surgimento de “novos Allendes e Castros” na região.
Fonte:IHU

Nenhum comentário: