Potosí (Bolívia), 21 set (EFE).- A expectativa de vida de apenas 40 anos, a pobreza e a resignação formam o triângulo que algema os mineiros de Cerro Rico, em Potosí (Bolívia), cuja prata foi espalhada pelo mundo, mas beneficiou pouco o próprio povo local.
A maioria dos mineiros da gigantesca jazida, que tem 619 minas abertas, trabalha em condições extremas de insegurança e por pouco dinheiro há várias gerações, e sem que tenham tido mudanças substanciais em suas vidas.
Uma visita à mina San Miguel da colina Rico permite ouvir testemunhos a respeito, constatar o perigo diário a que se expõem os mineiros, ver adolescentes explorados e buscar uma explicação ao culto que os mineiros tributam ao diabo em troca de proteção.
Muitos concordam com resignação que a média de vida dos mineiros é de 40 anos devido a doenças relacionadas às condições insalubres de trabalho.
Ivan Condori, de 36 anos, sabe do perigo que assume como mineiro, mas convida a "ter fé no Tio (diabo) para que não aconteça nada na mina".
Em seu melhor momento, Condori, que chegou a ser assistente de chefes da mina, ganhava o equivalente mensal a entre US$ 424 e 565, mas atualmente sua renda caiu pela metade devido à baixa cotação dos minerais.
Condori, como todos os mineiros bolivianos, acha que está fora de perigo se tiver a proteção do diabo, considerado por eles "amo, dono e o senhor das minas, dos minerais e da vida dos mineiros".
Dessa forma, se expressa o ex-mineiro Antonio Ferrufino, de 29 anos, agora guia turístico, enquanto faz oferendas com coca, tabaco e álcool a duas estátuas de barro que representam diabos, como outras centenas que existem em toda Cerro Rico.
Em geral, a maioria dos operários são peões, entre eles muitos adolescentes, que ganham US$ 7 diários para empurrar 10 toneladas de terra em vagões no interior das minas.
O trabalho geralmente se desenvolve em espaços onde o ar está contaminado, cheios de bolsas de água tóxica e túneis sustentados por antigas vigas que não cedem por milagre.
Andrés Cano, de 45 anos, adverte que é melhor ganhar pouco que trabalhar em pontos contaminados ou de difícil acesso, mas reconhece que são os preferidos pelos mais jovens que esperam um maior pagamento.
"Há gente jovem que entra ali para trabalhar aos 20 anos e em quatro ou cinco anos quase não ficam mais de pé", alerta.
A insalubridade é enfrentada com naturalidade pelos mineiros, empresários e os próprios potosinos que, apesar de repetirem que a expectativa de vida de um mineiro é de 40 anos, não conseguiram promover mudanças substanciais.
"Nosso povo não tem muita esperança de superar essa situação. É o peso da tradição que nos faz viver igual e nos faz dizer assim fomos e assim seremos, é uma resignação", comentou à Efe o bispo de Potosí, Walter Pérez.
O bispo também pediu aos empresários potosinos que fizeram fortuna em Cerro Rico que fizessem investimentos em sua cidade e não em outras regiões da Bolívia, com o objetivo de criar alternativas trabalhistas para os jovens.
"O lastimável é que gente que alcança patrimônios econômicos consideráveis investe fora de Potosí, constrói edifícios, hotéis e têm equipamentos, mas trabalham em outras partes", aponta.
Trata-se, segundo o bispo, de "uma dúvida muito profunda" o porquê de os potosinos não investirem em sua terra, da mesma forma que muitos outros se perguntam como a riqueza da prata extraída da colina em 464 anos não transformou a cidade em uma das maiores da Bolívia e elevou o padrão de vida do povo.
Fonte: EFE/Café História
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