Por Fernanda Dias
A menos de dois meses para o início da Conferência de Copenhague — na qual os países tentarão formalizar um acordo sobre as emissões de gases poluentes que substituirá o Protocolo de Kioto — o clima entre os especialistas no setor é de receio e apreensão. Na visão deles, a redução drástica das emissões de carbono é o ponto chave das negociações, mas conseguir que todos os países participantes estabeleçam metas quantitativas concretas parece ser uma tarefa cada vez mais difícil.
A 15ª Conferência das Partes (COP-15) da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima reunirá representantes dos setores público e privado de cerca de 200 países desenvolvidos e em desenvolvimento. Além de estabelecer novos compromissos e incentivos para a redução das emissões de gases do efeito estufa, espera-se que sejam firmados acordos de cooperação científica e financiamentos que incentivem o uso da tecnologia verde e promovam a estabilidade climática.
O professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental (Procam) da Universidade de São Paulo (USP) Pedro R. Jacobi explica que a transição ao baixo carbono já acontece em países que se deram conta das oportunidades que isso pode promover e da importância do avanço tecnológico e científico em uma perspectiva de inovação. Ele ressalta que a mesma política já se verifica em empresas de maior porte que veem nisso uma chance de bons negócios. “O grande desafio é avançar para acordos de cooperação para mudanças no paradigma energético e desenvolvimento de tecnologias que coloquem a era do combustível fóssil como algo do passado”, argumenta Jacobi.
Embora tenha expectativas “razoáveis” com relação ao encontro de Copenhague, Jacobi ressalta que não se pode desconsiderar a importância da reunião. “Seria fundamental que se tomassem decisões ambiciosas, pois isto firmaria uma agenda que enfatizasse a inexorável rota rumo ao baixo carbono. Acordos internacionais que efetivamente avançassem nessa direção seriam um sopro de otimismo”, defende Jacobi.
O presidente do Conselho de Estudos Ambientais da Fecomercio, José Goldemberg, lembra que a adesão e o comprometimento dos países ricos é fundamental para que o encontro de dezembro resulte em bons frutos para o clima. “As expectativas para a Conferência de Copenhague são baixas devido ao fato de que a lei americana que estabelece limites para as emissões do país ainda não foi aprovada pelo Congresso. Os Estados Unidos não ratificaram o Protocolo de Kioto e não reduziram suas emissões desde 1992, quando assinaram a Convenção do Clima. Se algo não mudar até dezembro, a Conferência marcha para o fracasso”, ponderou.
A tarefa do Brasil
Jacobi argumenta que a posição do Brasil na reunião do clima é ambígua, pois o país tem o desafio de buscar articular o momento de desenvolvimento em que se encontra com a necessidade de dar respostas que garantam a inserção no pacto ambiental. “Caberá ao Brasil ser muito preciso no que se considera que os países desenvolvidos terão de contemplar nas suas agendas, notadamente a transferência de tecnologia que não transforme os países que dela dependam em reféns do avanço tecnológico. Mas o Brasil também terá de demonstrar que tem uma agenda de desenvolvimento e inovação própria e/ou articulada com os países mais desenvolvidos”, afirmou Jacobi.
O professor do curso de Gestão Ambiental da Escola de Artes Ciências e Humanidades (EACH) da USP Sergio de Almeida Pacca defende que o Brasil deva se unir com os outros países em desenvolvimento para buscar metas de redução que se encaixem com as suas necessidades de desenvolvimento. “O Brasil deve chamar a atenção dos países desenvolvidos que já poluíram muito no passado, mas não deve deixar de admitir que também tem responsabilidade pelas emissões, principalmente por causa do desmatamento”, argumenta Sergio.
E para poder cobrar uma postura dos demais países, o Brasil precisa levar para o encontro a lição de casa feita, segundo o coordenador da campanha de clima do Greenpeace, João Talocchi. Segundo ele, a lição de casa consiste em pelo menos três fatores: a proposta de desmatamento zero até 2015, a garantia de que pelo menos 25% da eletricidade consumida no país seja gerada a partir de fontes renováveis de energia, e uma proteção de 30% das áreas marinhas até 2020. Talocchi lembra, no entanto, que na última terça-feira o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o Brasil não pode assumir uma meta de desmatamento zero. Na ocasião, Lula disse que “nem que fosse careca o Brasil pode assumir uma meta de desmatamento zero, porque sempre vai haver alguém que vai cortar alguma coisa”. Para Talocchi, além do desmatamento zero, o governo poderia fazer muito mais pelo clima como investir em novas tecnologias limpas em setores como transporte e agrícola.
“Além da lição de casa, é preciso cobrar uma posição mais ambiciosa dos países desenvolvidos que sempre contribuíram para as emissões e que têm uma responsabilidade histórica. Não basta eles comprarem créditos de carbono, é preciso que também façam uma redução drástica das emissões e que contribuam financeiramente para que os países pobres ou em desenvolvimento possam se adaptar e construir uma economia de baixo carbono”, afirmou Talocchi, que defende ainda que os créditos de carbono sejam feitos por setores da economia e não por indústrias isoladas.
Os avanços e falhas do Protocolo de Kioto:
Em 1997, foi assinado, em Kioto, no Japão, um protocolo com metas para a redução de emissões através do qual os países signatários assinaram um compromisso de reduzirem, entre 2008 e 2012, suas emissões poluentes em pelo menos 5% em relação aos níveis verificados em 1990. Em Copenhague, será discutido o que será feito a partir de 2012. Para o professor Sergio Pacca, o Protocolo de Kioto estabeleceu metas bastante tímidas que ainda assim não foram cumpridas, mas serviu para fomentar um mercado para serviços ambientais que era inexistente no mundo. “Uma redução mais agressiva do maior emissor, os EUA, não foi alcançada e provavelmente esta foi a principal falha do Protocolo de Kioto”.
Já Jacobi ressalta que as metas de Kioto não eram realistas e que os objetivos não foram bem pactuados. Para ele, o avanço foi que o tema continua na agenda. “Apesar do pouco sucesso de diversos países, notadamente os mais desenvolvidos, houve avanços no plano sócio-cultural associados à substituição de fontes de energia fóssil para fontes alternativas, não talvez com a velocidade desejada, mas deixando marcas inquestionáveis”.
Fonte:Opinião e Notícia
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