quarta-feira, 14 de outubro de 2009

SÍNODO AFRICANO: é proibido falar de preservativos e celibato, mas alguém quebrou a regra.

Preparado com todas as redes protetoras possíveis para impedir que surgissem temas que o Papa absolutamente não pretende discutir, a segunda assembleia especial do Sínodo dos Bispos para a África foi investida, pelo contrário, desde a primeira frase, de argumentos ardentes, como o uso do preservativo ou uma nova discussão sobre a obrigatoriedade do celibato sacerdotal para a Igreja latina.

A reportagem é de Luigi Sandri, publicada na revista italiana Adista, 12 de outubro de 2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

A assembleia, da qual participam 244 "padres", foi inaugurada por Bento XVI no dia 04 de outubro. Ela irá se concluir no dia 25 de outubro, e só então, obviamente, será possível avaliar o conjunto dos trabalhos e das conclusões, também sobre os "temas quentes". O tema oficial do Sínodo (o segungo dedicado à África, depois do de 1994) é: "A Igreja na África a serviço da reconciliação, da justiça e da paz. 'Vós sois o sal da terra, vós sois a luz do mundo' (Mt 5,13.14)".

No seu discurso – durante uma liturgia dominada, salvo alguns detalhes, pelo rígido rito latino, sem nenhuma real concessão aos possíveis ritos africanos – o pontífice foi severo ao denunciar alguns males permanentes do continente negro, mas não fez surgir nenhuma perspectiva de mudança para algumas reformas eclesiais, mesmo pedidas por muitas católicos, clero e leigos, na África.

"Quando se fala de tesouros da África – disse o Papa –, o pensamento dirige-se imediatamente aos recursos dos quais o seu território é rico, e que infelizmente foram, e continuam a ser, causa de exploração, conflitos e corrupção. Ao contrário, a Palavra de Deus faz-nos entrever outro patrimônio: o espiritual e cultural, do qual a humanidade precisa ainda mais do que as matérias-primas. [...] Sob esse ponto de vista, a África representa um imenso 'pulmão' espiritual para uma humanidade que parece estar em crise de fé e de esperança. Mas esse 'pulmão' também pode adoecer. E atualmente, pelo menos duas perigosas patologias estão ameaçando-o: antes de tudo, uma doença já comum no Ocidente, isto é, o materialismo prático, aliado ao pensamento relativista e niilista. Sem entrar no mérito da gênese de tais males do espírito, todavia, é indiscutível que o chamado 'primeiro' mundo por vezes exportou e está exportando resíduos espirituais tóxicos, que contagiam as populações de outros continentes, em particular, as africanas. Nesse sentido, o colonialismo, que já não existe no plano político, na realidade nunca terminou. Mas justamente nessa perspectiva, deve ser assinalado um segundo 'vírus' que poderia atingir também a África: o fundamentalismo religioso, combinado com interesses políticos e econômicos. Grupos que se baseiam em várias pertenças religiosas estão se difundindo no continente africano; e fazem-no em nome de Deus, mas segundo uma lógica oposta à divina, isto é, ensinando e praticando não o amor e o respeito pela liberdade, mas sim a intolerância e a violência".

Na segunda-feira, dia 05 de outubro, o relator-geral do Sínodo, o cardeal Peter Kodwo Appiah Turkson, arcebispo de Cabo Corso (Gana), deu a primeira entrevista coletiva de imprensa sobre a Assembleia. Interrogado pelos jornalistas sobre a legitimidade (moral) do uso do preservativo, respondeu: "Se um infectado viesse até mim", "eu recomendaria o uso do preservativo, mesmo se na África, às vezes, ele representa um risco", por causa da péssima qualidade de alguns preservativos. "O uso do preservativo é importante", continuou, mas "é preciso lembrar o aspecto da fidelidade do casal, por isso o apelo ao uso dos preservativos deve caminhar junto com a fidelidade do casal".

Até agora, a posição oficial do Vaticano sobre a questão havia sido de claro fechamento, sem exceções. E o Papa Ratzinger, na sua viagem ao Camarões e Angola, em março, havia dito que o uso do preservativo "piora a situação". E, de fato, no "Instrumentum laboris", o texto-base do qual parte a discussão sinodal, não há nenhum traço da fresta aberta por Turkson. Por isso, será interessante ver como, no fim, a questão será posta nas "propositiones", as propostas ao Papa que o Sínodo, no término de seus trabalhos, irá elaborar: confirmação férrea da doutrina oficial, ou, indiretamente desmentindo o Papa, uma abertura qualquer?

Sobre outro tema, muito discutido na África, o da lei do celibato para o clero latino, talvez não haja aquela unanimidade no Sínodo, por causa da reconfirmação absoluta da lei, que agradaria a Cúria romana e que foi reproposta pelo "Instrumentum laboris". Para se dar conta disso, basta ler o grande artigo que a revista Nigrizia de outubro dedica ao tema (www.nigrizia.it). A revista dos missionários combonianos, depois de uma veloz e recente casuística e um resumo das intervenções do Vaticano nos últimos anos, afirma, para circunscrever o fenômeno da violação do celibato eclesiástico: "Já é de domínio público – sem querer generalizar e distorcer tantos que agem honestamente e reconhecendo que há países onde o clero realiza esforços sinceros para viver coerentemente – que o fenômeno dos sacerdotes e bispos que têm família está difundido".

E "tudo leva a crer que o problema do celibato dos padres foi evocado seriamente por Bento XVI nas suas conversas com os bispos da região durante a sua viagem a Yaoundé (Camarões) em março passado". "Esses escândalos – segundo a revista – obrigam os responsáveis da Igreja a se colocar a pergunta sobre a correção de um modelo de sacerdote e de pastor que vem da reforma tridentina": "Ainda é um modelo válido para todos os lugares e para todos?". "Não cabe a nós responder", prossegue, mas "pensamos que a figura do sacerdote católico na África também deva ser inculturada".

Fonte:IHU

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