terça-feira, 6 de abril de 2010

ESPIRITISMO - Chico Xavier, o filme.

Claudio Lessa do blog DIRETO DA REDAÇÃO.

CHICO XAVIER, O FILME



Brasília (DF) - Brasileiro não sabe fazer cinema. Quer dizer, brasileiro metido a rejeitar a linguagem cinematográfica de Hollywood e a ficar reciclando fórmulas obsoletas, decadentes, sem ritmo e entediantes, como a européia. Por isso mesmo, passo longe dos cinemas com produções tupiniquins. Confesso: só fui assistir ao filme “Chico Xavier” por causa do próprio Chico Xavier e por causa de Daniel Filho, que nestes anos todos de tevê, com algumas incursões pelo cinema, parece ter aprendido a utilizar essa linguagem de maneira inteligente para contar uma estória.

Não, “Chico Xavier” não é filme para Oscar, embora valha a pena ser visto. Ele faz rir, faz chorar, traz uma história rigorosamente verídica sobre um verdadeiro exemplo a ser seguido, e é perfeito para exportação: muito bem realizado, tem atores e atrizes de primeira nos papéis-chave, com destaque para Nelson Xavier e sua impressionante (quase fantasmagórica) caracterização como o médium de Pedro Leopoldo/Uberaba. As locações foram escolhidas com esmero, as paisagens retratam um Brasil que todos gostariam de conhecer (apesar do drama e da pobreza que cercam o personagem principal, nem por isso a direção explorou locações visualmente repelentes, como em “Central do Brasil”, por exemplo) e o roteiro foi adaptado de forma convincente, com sua trama bem amarrada. O gancho principal, paralelo à biografia do médium, é o desespero de uma mulher (casada com o diretor de tevê de um programa que tem Chico Xavier como entrevistado) que perdeu seu filho único num acidente estúpido.

Sendo um filme brasileiro – e, portanto, fruto de uma indústria microscópica, semi-amadora –, há problemas. A iluminação, por exemplo, é um deles. Sem necessidade aparente, o filme quase todo é pouco iluminado, quase uma injusta contraposição à luminosa figura de Chico Xavier. A sequência em que o pequeno Chico Xavier entra numa igreja católica, por exemplo, e se assusta com o que vê só é compreendida por quem já viu aquele tipo de imagens antes – santos com feições ameaçadoras pisando sobre a cabeça de animais selvagens e/ou peçonhentos – e, portanto, entende o medo que a criança deveria estar sentindo ao entrar naquele ambiente tétrico. A pouca iluminação, no entanto, não permite distinguir o que o menino está vendo.

As mancadas de produção, quase inevitáveis aqui ou em Hollywood, também dão o ar da graça em “Chico Xavier”. O “Credo” é rezado da forma atual (“…desceu à Mansão dos Mortos…”), em vez da forma como era rezado na época (“…desceu aos infernos, ao terceiro dia ressucitou dos mortos. …”). O telefone branco colocado na sala da direção de tevê também parece ser moderno demais para a época da Rede Tupi e os aparelhos em preto-e-branco.

A escorregada maior, no entanto, fica por conta do personagem Emmanuel. A produção conseguiu um ator e confeccionou roupas que parecem torná-lo um sósia dos desenhos do mentor espiritual de Chico Xavier. Até aí, tudo muito bom. Só que Emmanuel, pelos relatos conhecidos, seria de uma rispidez e inflexibilidade à toda prova – do tipo “se os encarnados dizem mata, Emmanuel diz esfola”, nunca permitindo a Chico Xavier uma só brecha na sua disciplina. Entretanto, o espírito Emmanuel, de feições masculinas – que deveria parecer no máximo assexuado, como o Anjo Gabriel de “Constantine” (interpretado, aliás, por uma mulher, a atriz Tilda Swinton) – aparece no filme com maneirismo (voz e jeito de olhar) constrangedoramente gay. Por sinal, já no início do filme a confusão se forma quando Chico Xavier invoca a presença de sua mãezinha e a imagem de um homem (que, sabe-se depois, trata-se de Emmanuel) surge para lhe dizer, em tom afeminado: “Eu estarei aqui.” Não se sabe se Daniel Filho, o diretor, sucumbiu ao politicamente correto de hoje em dia para permitir tal devaneio ou se, ao tentar estabelecer um tom de assexualidade para o personagem, acabou errando a mão.

Chico Anysio me disse, certa vez, com um tom de desalento, que não adianta o Brasil (com uma produção de cinco ou seis filmes por ano) querer brigar com uma indústria que produz cerca de seiscentos filmes por ano. Ele está certo, ainda mais quando a maioria dos que se intitulam diretores de cinema não sabem (ou não querem) falar a língua cinematográfica corrente, que é a de Hollywood.

Para ficarmos no esotérico, o exemplo de um filme pessimamente realizado está na biografia de Bezerra de Menezes. Daniel Filho, de certa forma, ajuda a resgatar isso. Mas ele, próprio, parece precisar de um Emmanuel, que o faça lançar mais 30 filmes para orientar o público na direção certa.

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