'Mídia privada da Venezuela se transformou em partidos políticos', diz Adrian Padilla
- 31/03/2010 |
- Luiz Gustavo Pacete*
- Portal Imprensa
A Venezuela possui papel importante na América do Sul, tanto em fatores econômicos e políticos, como em termos de integração regional. Porém, desde que a concessão do canal venezuelano RCTV não foi renovada em 2007, o país e o presidente Hugo Chávez estão constantemente envolvidos em polêmicas relacionadas à liberdade de expressão e autoritarismo.
Casos como o da RCTV e o da prisão de Guillermo Zuloaga, presidente do canal Globovisión, fazem com que o país seja classificado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos como "ameaçador" para o trabalho da imprensa. No último dia 22 a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) divulgou um comunicado condenando as ações do governo do presidente Hugo Chávez "contra a liberdade de expressão e a favor da eliminação dos meios de comunicação na Venezuela".
Entretanto, para o jornalista venezuelano Adrian Padilla, pró-governo Chávez, graduado em Comunicação Social pela Universidade Central da Venezuela e ex-chefe de redação do semanário Todos Adentro do Ministério da Cultura venezuelano, "existem problemas, mas também uma campanha internacional para desestabilizar o governo de Chávez ressaltando os fatos negativos e tirando o foco das coisas boas que estão sendo feitas".
Ele veio ao Brasil para participar do seminário "Liberdade de Expressão/Direito à Informação nas sociedades contemporâneas da América Latina", realizado pelo Memorial da América Latina e falou com exclusividade à IMPRENSA sobre liberdade de expressão e a imprensa na América Latina.
Portal IMPRENSA - O senhor passou por veículos privados e estatais como o Todos Adentro. Como é possível fazer críticas ao governo trabalhando em um veículo estatal?
Adrian Padilla - A crítica é feita juntamente com a vontade política de melhorar um projeto. Eu prefiro falar de projeto e não de governo. Quando eu estive lá [no jornal estatal] já tinha trabalhado 12 anos em veículos privados - rádio, jornais diários, e também colaborei com revistas. Tive a experiência de ser repórter, editor, chefe de departamento gráfico. Também trabalhei em jornais da oposição, tenho toda essa referência. É claro, tínhamos que ter cuidado também, mas tive a oportunidade de fazer críticas, inclusive expressas, para questionar o que poderia ser melhorado da ação do estado.
IMPRENSA - Mas os políticos não se colocavam contra?
Padilla - Sim. Em alguns momentos alguns funcionários, dentro de um processo público e burocrático, acreditavam que um jornal não poderia fazer críticas daquela maneira institucional porque era do governo. Então surgiam situações de ministros ligando para o diretor e ele se defendia. Existia essa pressão, mas nunca houve nenhum tipo de perseguição por termos publicado algo.
IMPRENSA - Na América do Sul não está clara a distinção entre meios privados e públicos na Venezuela. Explique melhor esse tratamento dado pelo governo.
Padilla - Os meios de TV e rádio privados na Venezuela pertencem a um sistema já configurado pelos próprios veículos privados no passado. Em Caracas foram os meios privados que configuraram o cenário de quem assumia e controlava mesmo com as leis que foram surgindo para regular. Isso deve ser levado em consideração. Mas hoje isso mudou. A voz que se escuta predominantemente é a do governo, inclusive pelas rádios comunitárias e surgiram novas emissoras públicas que antes não existiam. O governo tem o canal público VTV Venezuelana de Television que é antigo e se mantém e há outras emissoras voltadas para temas específicos.
IMPRENSA - Então quer dizer que os veículos privados na Venezuela utilizam o argumento da liberdade de expressão como arma política?
Padilla - Em determinado momento os partidos foram se esgotando. Os partidos como formas organizativas perderam sentido e força, e esse espaço no processo político foi ocupado pelos meios de comunicação que começaram a atuar como atores políticos diretos, como partidos políticos.
IMPRENSA - A impressão que temos é que há uma intensa perseguição de Hugo Chávez aos veículos. O senhor acredita que isso é uma visão superficial do que acontece?
Padilla - Isso está relacionado às agências que pautam os veículos da América do Sul como CNN, FOX NEWS, BBC. São fontes consideradas indiscutíveis, mas que tem sim, sua posição ideológica. Também temos o que aconteceu com uma matéria que saiu na Veja sobre Chávez. Me mandaram essa revista e eu percebi que existia uma inconsistência nas fontes ouvidas. Eu li a matéria como jornalista e percebi que o repórter que fez a matéria consultou fontes totalmente intencionais e quando ele colocou aspas de uma pessoa defensora do governo falou com alguém inconsistente, um estudante que não argumentava tanto e não tinha uma postura de argumentação.
IMPRENSA - Mas e o acesso às pessoas do governo? Os jornalistas não podem encontrar dificuldade em falar com um governo autoritário?
Padilla - Existem jornalistas já marcados pelo governo, que não são atendidos, pois fazem oposição e não mediação. Esses não são recebidos. Na Venezuela existem muitos jornalistas que já perderam essa condição de mediador e se tornaram atores, e por isso, não vão ser considerados, eles tem de reportar equilibrar, e não somente atacar.
*colaborou Ana Ignácio, da Redação.
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