As consequências caso o PL das terceirizações seja aprovado
Sugerido por implacavelDo Brasil de Fato
Especialistas avaliam consequências da aprovação do PL das terceirizações
Segundo eles, caso o PL 4330 seja aprovado pelo Congresso, poderá resultar no fim de concursos públicos e dos direitos trabalhistas
Gibran Mendes, da CUT/PR para o Brasil de Fato
Concursos públicos escassos, reajustes salariais
quase inexistentes, organização de trabalho enfraquecida e o fim das
garantias dadas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) aos
trabalhadores. Estas são algumas das consequências apontadas por
especialistas caso o Projeto de Lei 4.330, que escancara as
terceirizações no Brasil, seja aprovado pelo Congresso Nacional.
Como pano de fundo, o projeto pretende aumentar a
competitividade brasileira após a reestruturação da cadeia de produção
que teve início nos anos 1980, quando ocorreu a transferência da
produção do centro do capitalismo para a sua periferia. Os produtos
deixaram de ser produzidos em países como Estados Unidos, Japão e na
Europa com rumo à América Latina e Ásia, dando preferência para locais
onde não há retaguarda jurídica e de sustentação para direitos da classe
trabalhadora.
“Isso é para equalizar nossa força de trabalho com a
China, Taiwan, Índia e África e competirmos no mercado internacional com
mercadorias mais baratas”, explica o professor Lafaiete Neves, doutor
em desenvolvimento econômico pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
“Eles não tem uma legislação do trabalho, tanto é que agora a China
tenta organizar esta estrutura, inclusive sindical, que não existia. O
mesmo se dá nos países do capitalismo dependente subdesenvolvido”,
completa Neves.
Para o advogado e professor universitário Nasser
Allan, terceirização é sinônimo de precarização. “Terceirização para
que? Significa degradação do trabalho, porque ela só é vantajosa se
houver economia para quem o trabalho. Contratar uma empresa terceirizada
para que? Para ter redução do custo de mão de obra. Ela se pauta na
precarização das condições de trabalho, só compensa se for assim”,
sentencia o jurista.
Para Allan, como resultado direto de uma possível
aprovação do projeto, o setor público pode ver os concursos
desaparecerem, enfraquecendo a máquina e retirando de milhares de
famílias o sonho de um emprego com estabilidade para familiares que
dedicam anos de estudo com este fim.
“Vamos passar a ter uma organização de trabalho que
primará por um núcleo duro, no caso do poder público uma pequena parcela
estará vinculada em cessão pública e o resto todo terceirizado. No caso
da iniciativa privada, uma parcela será ligada ao próprio tomador de
serviço, o resto todo será terceirizado. Uma modificação brutal na forma
de organização de trabalho como temos hoje”, avalia.
“Isso é esconder o que está por trás do projeto, não
se trata de evoluir no sentido de ajustar a força de trabalho as novas
técnicas modernas de administração. Trata-se, na verdade, de aprofundar o
processo de exploração do trabalho no mundo moderno”, completa o
professor Lafaiete Neves.
Fim dos direitos
Na avaliação dos pesquisadores, o Projeto de Lei
4.330 será responsável por um verdadeiro desmanche nos 70 anos de
história da CLT. O projeto também pretende colocar as relações de
trabalho dentro do Código Civil, onde historicamente o patronato tem
maior poder do que nos tribunais do trabalho, amparados pela CLT.
“O Brasil já têm uma legislação do trabalho que
completou 70 anos. Ela nunca precisou ser atualizada porque ela manteve
as garantias da força de trabalho ao longo deste período. O que eles
estão tentando é desmontar, destruir a CLT. Esta é a grande verdade que
temos que encarar. Ela é quem dá as condições de defesa da força de
trabalho, que vai perder sua capacidade de organização por local de
trabalho, por categoria”, avalia Neves.
A mesma lógica é defendida pelo jurista Nasser Allan.
Para ele, o projeto enfraquecerá de forma brutal a capacidade de
negociação dos trabalhadores. “O enquadramento sindical dos
trabalhadores terceirizados se dá não com o sindicato da tomadora, mas
com o sindicato dos trabalhadores pertencentes aquela empresa
terceirizada, que são sindicatos mais frágeis porque têm menos força de
negociação. Eles vão aplicar a negociação coletiva da categoria
preponderante”, argumenta.
Ainda de acordo com ele, o substitutivo proposto pelo
deputado Artur Maia (PMDB-BA) não resolve os problemas da classe
trabalhadora. Embora coloque algumas restrições ao projeto original do
deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), ele não sana os principais equívocos do
texto inicial.
“Pelo substitutivo, na administração pública a
terceirização não poderá ocorrer em atividades essenciais, mas o texto
permite para qualquer serviço especializado, o que deixa a porta aberta
para contratação de terceirizados de forma indiscriminada. Também não
resolve o enquadramento sindical dos trabalhadores, pois estabelece a
mesma regra. Os vícios existentes no projeto original são repetidos, de
certa forma, no projeto substitutivo com algumas atenuações ”, avalia
Allan.
No final das contas, o objetivo continua sendo o
mesmo, reduzir o custos atacando o elo mais fraco da cadeia produtiva.
“Se um projeto qualquer estabelecesse a extensão dos direitos dos
trabalhadores do tomador de serviço aos terceirizados, você praticamente
acabaria ou tornaria este processo mais raro. Afinal, por que você
faria terceirização se tivesse o mesmo custo?”, questiona o jurista.
Perdas
O resultado financeiro desta operação para os
trabalhadores pode ser exemplificado com o caso dos trabalhadores em
alimentação, que são essencialmente terceirizados por atuarem em uma
atividade considerada meio. “Em todos os segmentos, tanto no setor
privado quanto no setor público”, explica a presidenta do Sindicato dos
Trabalhadores em Refeições Coletivas e Merenda Escolar, Doris Andrade da
Cruz.
Doris explica que o problema começa já na licitação
dos órgãos públicos. “Quando o município lança o edital ele não toma as
precauções devidas. Ao invés de licitar serviço, confunde com locação de
mão de obra, especificando número de postos de trabalho e atividades a
serem desenvolvidas. Neste momento, ocorre a confusão no enquadramento
sindical, com outros sindicatos achando que podem representar a
categoria”, relata.
Recentemente a prefeitura de Londrina realizou uma
licitação para a preparação de alimentação e nutrição desta forma.
“Agora as empresas apresentam propostas que melhor lhe convém e não a
convenção da categoria de refeição coletiva. Realizamos uma assembleia
geral e notificamos a empresa que se não cumprir enfrentará a
paralisação das merendeiras de Londrina”, avisa. A estimativa é que
entre a remuneração e benefícios a perda anual é de dois pisos e meio de
uma cozinha, o que significa R$ 2.136,40 que deixam de entrar para o
bolso destes trabalhadores.
Apertem os cintos, a empresa sumiu
Outro ponto polêmico do projeto é a ausência de
responsabilidade da empresa tomadora de serviços com relação aos
empregados terceirizados. Na prática isso significa que os trabalhadores
ficam desamparados neste processo caso haja algum problema com a
empresa que o contratou, enquanto a tomadora de serviços fica isenta de
qualquer amparo jurídico com quem é responsável pela sua produção ou
prestação de serviços.
Em algumas categorias cuja fonte de serviço já é
essencialmente terceirizada este pesadelo já é uma realidade. No caso
dos vigilantes, por exemplo, não raro empresas fecham do dia para a
noite e deixam os trabalhadores a ver navios.
“Recentemente tivemos o caso da empresa Alerta
Segurança que prestava serviço para diversos órgãos públicos. Ela
anoiteceu e não amanheceu. O trabalhador ficou no seu postos de serviço,
sempre empresa, sem salário, sem verbas rescisórias, sem direitos.
Enquanto isso o dono da empresa está muito tranquilo em Ponta Grossa,
com programa de rádio, programa de TV”, explica o presidente do
Sindicatos dos Vigilantes de Curitiba e Região, João Soares.
Contudo, embora hoje ainda existam vias tortuosas
para que estes trabalhadores busquem seus direitos, esta via deixará de
existir. Com o novo projeto de lei a responsabilidade do tomador de
serviço simplesmente deixa de existir. “Vai fragilizar ainda mais o que
já é frágil”, lamenta o presidente.
A única salvaguarda trabalhista prevista é um valor
permanecerá retido enquanto o contrato de terceirização estiver em
vigência. Mas na avaliação de Soares este é um caminho para fraudar os
direitos. “A empresa vai dar o aviso prévio para que o trabalhador
cumpra os 30 dias, enquanto isso a empresa vai embora”, alerta.
Esta avaliação é fortalecida levantando em conta as
necessidades jurídicas e estruturais necessárias para abrir uma empresa
terceirizada. “É simplesmente ridículo o valor que a lei estabelece”,
esbraveja o professor Lafaiete Neves. Ele explica que a pela legislação
para abrir uma empresa nesta modalidade será preciso um capital de R$ 10
mil para 10 trabalhadores, ou seja, R$ 1 mil por empregado. “Se um
deles ficar quatro anos trabalhando, considerando 13º Salário, FGTS,
Horas Extras e todos os seus direitos, esta empresa gastaria todo o
capital somente com um único trabalhador. A empresa simplesmente não tem
capital para cobrir os direitos dos trabalhadores, já que elas vão
desaparecer”, completa Neves.
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