sábado, 10 de outubro de 2009

MÍDIA - Senado argentino aprova lei de comunicações.

BBC Brasil

Márcia Carmo

De Buenos Aires para a BBC Brasil

Protesto a favor da lei

Manifestantes a favor da lei se reuniram do lado de fora do Senado.

Os senadores argentinos aprovaram neste sábado a nova lei de meios de comunicação do país, respeitando, na íntegra, o texto do projeto do governo da presidente Cristina Kirchner que tinha gerado fortes críticas da oposição. O texto já tinha sido aprovado, também sem modificações, na Câmara dos Deputados.

Foram mais de dezoito horas de debates e integrantes da oposição indicaram que muitos artigos poderão terminar em “batalhas judiciais”, como afirmou o senador opositor Emilio Rached, da Frente Cívico. “Essa lei vai dar muito trabalho aos advogados, juízes e à Corte Suprema de Justiça”.

Os senadores governistas argumentaram que a nova lei vai gerar maior “pluralidade” de opiniões no país. O ministro chefe de gabinete, equivalente a chefe da Casa Civil, Aníbal Fernández, afirmou, neste sábado, que a lei é “transformadora”.

A lei prevê, por exemplo, que proprietários de meios de comunicação deverão optar entre empresas de TV aberta e a cabo, numa mesma região, e vender um investimento ou outro no prazo de um ano.

Reações

“O governo ganhou, mas perdeu porque será muito difícil aplicar essa lei”, disse o senador Ernesto Sanz, da opositora União Cívica Radical (UCR).

Já a senadora Sonia Escudero, do Partido Justicialista (PJ), recordou que está em vigor um decreto que renovou, recentemente, por dez anos, as licenças de rádios e de televisão do país.

“Por isso, este artigo das vendas das empresas da nova lei não poderá ser aplicado porque é inconstitucional”, disse. E completou: “Por que nossos vizinhos Brasil e Uruguai recebem investimentos e nós não? Porque eles têm regras claras e aqui estamos permitindo a insegurança jurídica. Devemos respeitar os direitos adquiridos”.

Para a oposição, o Grupo Clarin, o maior do país, é “o alvo” da medida do governo. E deverá escolher entre o canal 13 e a emissora de TV a cabo, TN (Todo Notícias).

Nos últimos dias, a TN colocou mensagens no ar, dizendo que “pode desaparecer”.

O texto estabelece ainda limites na quantidade de informações regionais e nacionais na programação das emissoras de rádio e de televisão. O que provocou a reação de rádios como a “Cadena 3”, da província de Córdoba, que tem conteúdo nacional.

‘Ditadura’

A Associação de Difusoras Privadas Argentinas criticou as regras para o setor com anúncios na televisão. “A única rede que o governo quer é a rede nacional (usada pelo governo)”, afirmou.

O governo aprovou a Lei de Meios, como foi batizada, por 44 votos a favor e 24 contra.

Além de defender “maior pluralismo” de vozes e informações no país, o governo destacou que a nova lei “terminará com os monopólios” e é “democrática”.

A que estava em vigor, recordou o senador governista Miguel Pichetto, “era da época da ditadura”.

Em seus discursos, governistas e opositores concordaram que a lei anterior, implementada no governo militar de Jorge Rafael Videla, em 1980, deveria ser “modificada” ou “substituída”.

Na prática, a lei anterior já tinha tido artigos modificados ao longo dos últimos governos da democracia (a partir de 1983).

O senador opositor Gerardo Morales, da União Cívica Radical, criticou o argumento. “O sonho de um governo autoritário é controlar a opinião pública e é o que se está tentando fazer agora”, afirmou antes da votação.

O senador governista Guillermo Jenefes, da Frente para a Vitória, também criticou o texto. “Como está, esse texto vai gerar desemprego. Além disso, permite envolvimento de forma excessiva no conteúdo (das rádios e televisões) e o governo repete, neste sentido, a lei da ditadura”, disse.

‘Pressa’

Outro artigo polêmico, criticado pela oposição, é o que define o perfil do órgão que aplicará a lei, com cinco integrantes, e vinculado ao governo. “Isso gera poder excessivo do governo e afeta a liberdade de expressão”, disse Gerardo Morales.

A lei prevê ainda a inclusão de Organizações Não Governamentais (ONGs) e comunidades indígenas entre os que deverão ser atendidos com licenças de rádios para informar às suas comunidades. E ainda que o Poder Executivo distribua as licenças nas cidades que superem os 500 mil habitantes e mais de 50 quilômetros de alcance.

Durante o debate, que começou na sexta-feira pela manhã e terminou no início da manhã deste sábado, senadores opositores criticaram a “pressa” do governo para aprovar a lei. “Tudo em um mês e meio”, disse a senadora Maria Estenssoro, da opositora Coalición Cívica.

O governo da presidente Cristina Kirchner perdeu as eleições legislativas, de 28 de junho, e não terá, a partir de dezembro, a maioria de votos que possui hoje na Câmara e no Senado.

Para a oposição, como disse Estenssoro, este é um dos motivos da “pressa”. “O problema não é a lei, mas as armações feitas aqui. Quando o governo estava de bem com o grupo Clarin permitiu o crescimento da empresa. Mas agora, mudou.”

Nos últimos dias, a presidente Cristina defendeu a lei do governo em diferentes discursos e afirmou que a Argentina vive tempos de “fuzilamento midiático”.

Os jornais argentinos, entre eles Clarin, La Nación e Perfil, têm publicado, com frequência, matérias apontando casos de irregularidades de integrantes do governo e ainda questionando a declaração de renda do ex-presidente Kirchner e da presidente, que se multiplicou enquanto estão no poder.

A votação foi acompanhada, do lado de fora do Congresso Nacional, por manifestantes que apoiavam a medida do governo. Com bumbos, eles erguiam cartazes que diziam: “democracia na imprensa” e “liberdade de expressão para todos”.

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