Giorgio Trucchi.
O dia 27 de janeiro de 2010, dia em que se instala o governo de Porfírio Lobo Sosa, será recordado de forma diferente segundo os matizes que se queira dar a esta data. Para os golpistas e seus aliados internacionais será a data da reconciliação e do regresso do país à normalidade. Enquanto que para a Resistência marcará a continuidade de um regime golpista e ditatorial, controlado por militares e grupos fáticos que tentam auto absolver-se dos delitos cometidos e aprofundar o modelo neoliberal.
Por um lado, a pantomima da posse em um Estádio Nacional guardado por milhares de militares e policiais, onde o novo presidente tentará vender ao mundo a imagem de um país normalizado e que os recursos econômicos da cooperação já poderão fluir. Por outro lado, uma gigantesca marcha da Resistência, que retomará suas mobilizações caminhando em direção ao aeroporto Toncontín, para mostrar a outra cara dessa Honduras ferida e que não se deixa abater, e despedir-se do presidente Manuel Zelaya Rosales, que, finalmente, poderá por fim ao seu encerro na embaixada do Brasil.
Para analisar o contexto hondurenho a poucas horas dessa data e como a Resistência está preparando-se para os desafios futuros, Sirel conversou com Carlos H. Reyes, membro da condução da Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP) e presidente do Sindicato de Trabalhadores da Indústria da Bebida e Similares (STIBYS).
Confira a entrevista:
- O que muda no país com a instalação de um novo governo?
- Não muda nada. Estamos diante de um plano bem orquestrado para dizer ao mundo que em Honduras tudo está solucionado e que com o novo presidente acabaram-se os problemas, pois já nos reconciliamos.
Os que têm esse tipo de discurso são os mesmos que planejaram e executaram o golpe e os meios que os apoiaram, e estão tentando convencer a comunidade internacional disso.
Em dias anteriores, nos reunimos com uma delegação do Parlamento Alemão e o que nos diziam era que em Honduras já havia reconciliação e que o fato de que dirigentes do Partido da Unificação Democrática (UD) estivessem conformando o governo recém eleito era um sinal de que a Resistência estava participando nesse esforço, o que é uma grande mentira.
Aqui, desde o golpe de Estado, estiveram contando mentiras; e continuam mentindo.
- Acreditas que a comunidade internacional tem interesses particulares e por isso querem acreditar que a situação está normalizada?
- Depende do que entendamos por "comunidade internacional". Se falamos dos Estados Unidos, não temos dúvidas de que dirigiu todo esse plano e que agora tenta encobrir uma das últimas etapas do golpe para que se acredite que tudo se normalizará.
Não foi um golpe contra os hondurenhos, nem contra o presidente Zelaya; foi um golpe contra um país e um continente que querem mudar, transformar-se e rumar pelos caminhos da mudança e da integração.
Portanto, os Estados Unidos são os mais interessados em criar esta imagem e, com certeza, a CNN será a primeira em apoiar esta estratégia, envolvendo os demais meios internacionais. A consigna é esquecer-se de Honduras e aproveitar o drama do Haiti para facilitar a situação.
- Um plano bem pensado e executado...
- Até tinham um cronograma que executaram fielmente; e não tenho a menor dúvida de que também a assinatura do compromisso de Porfirio Lobo com o presidente da República Dominicana permitindo que o presidente Zelaya saia do país é parte disso, tentando dar ao mundo esta imagem de reconciliação.
E o que o presidente Zelaya poderia fazer? Ou vai ao exílio ou é preso. Eu respeito sua decisão.
No entanto, a mensagem não escrita desse acordo é "apagar e começar do zero", e a Resistência não pode apoiar isso de nenhuma maneira.
- Já está tudo pronto para uma anistia geral e o Alto Comando do Exército foi ‘absolvido’ definitivamente pela Corte Suprema de Justiça...
- São os mesmos golpistas que falam de anistia e se autoabsolvem, e são eles que se estão reconciliando, porque não levaram a Resistência em consideração. Em Honduras somente poderá haver uma verdadeira reconciliação através de uma Assembleia Nacional Constituinte, que refunde este país.
- A Resistência reconhecerá o novo governo?
- Dissemos desde o início que queríamos a restauração da ordem constitucional através da restituição do presidente Zelaya e que se isso não acontecesse o que deveria acontecer era a realização de uma Assembleia Nacional Constituinte.
Os golpistas realizaram eleições e não as reconhecemos, bem como também não reconhecemos seus resultados. Por isso, tampouco podemos reconhecer a um governo denominado "novo", pois para nós é a continuação do governo anterior.
Porém, o que acontece na prática? O STIBYS, por exemplo, acaba de perder cinco julgamentos trabalhistas, entre eles duas mediações por graves violações ao Convênio Coletivo por parte da Pepsi-Cola-CAB Corp e Coca-Cola-SABMiller. O novo ministro de fato anulou estas mediações.
Nos outros casos, o novo diretor do Seguro Social ratificou um acordo para um Sistema Médico de Empresa na Cervejaria Hondurenha, que era ilegal e que o antigo diretor não iria renovar.
Diante dessas situações, não vamos legitimar o novo governo; porém, tampouco vamos deixar de defender-nos e recorreremois nas instâncias pertinentes.
A Resistência se defenderá; porém, também agirá contra a pretensão de consolidação do modelo neoliberal.
- De que maneira atuarão?
- Não se trata de que nos converteremos em partido político porque seria um grave erro. O que temos que fazer é fortalecer a Resistência; devemos colocar cabeça, corpo, pés e asas; asas para voar no plano eleitoral quando tivermos forças.
Nos reunimos em Siguatepeque para dilucidar coisas e a essência é definir estratégias e táticas para ir-nos aproximando a questões bem concretas.
Nunca no passado tivemos uma conjuntura como a atual e nossa discussão foi muito rica; com análise profunda sobre o que acontece em âmbito nacional e internacional.
Este governo tão débil pode cair logo e vamos lutar contra tudo o que pretenda consolidar em relação ao neoliberalismo, levando adiante o projeto da Constituinte. Se isso acontecer, apesar da continuidade da repressão e dos assassinatos, estaremos prontos para o processo eleitoral de 2013.
* Rel-UITA (Unión Internacional de Trabajadores de la Alimentación, Agrícolas, Hoteles, Restaurantes, Tabaco y Afines)
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