terça-feira, 11 de novembro de 2008

COLÔMBIA - Uribe ou paz.

Emir Sader.


Independentemente do governo que venha realizar, a vitória de Obama tem, de imediato, duas significações muito importantes: por um lado, representa a rejeição majoritária da população dos EUA ao governo de Bush. Por outro, a mobilização e incorporação à vida política de grandes contingentes normalmente alheios a ela – de negros, de latinos, de jovens.

Recaem sobre Obama duras heranças pesadas, a primeira delas a crise econômica que, iniciada como crise financeira, se estende ao setor produtivo (a GM afirma que faz esforços para não falir), gerando uma recessão de proporções enormes. A segunda, as guerras “infinitas” do governo Bush. (Responsável por um isolamento que, por exemplo, faz com que no Paquistão, aliado essencial dos EUA na guerra do Afeganistão e na luta contra Al Qaeda, Bin Laden tenha, nesse país, apoio de 34% da população, enquanto os EUA, de apenas 19%, quase a metade.) Sair do Iraque não é tão fácil quanto Obama diz. Como lhe perguntam os falcões: “E sairemos derrotados?” Questão grave para a única superpotência atual no mundo. Além do tema do abastecimento de petróleo e da influência do Irã sobre o Iraque xiita.

Mas Obama poderá avançar na desarticulação do epicentro latino-americano das guerras infinitas de Bush, ajudando a terminar com a situação de guerra que vive a Colômbia, com o apoio direto dos EUA – na chamada Operação Colômbia – além do término imediato do bloqueio a Cuba. Este país tornou-se o grande aliado norte-americano na região, tornando-se um dos responsáveis pelo isolamento e pela péssima imagem dos EUA na América Latina – se Obama quer projetar uma imagem nova para o continente.

O paradoxo é que, ao final de todas as tentativas – algumas de sucesso – de troca de prisioneiros, que tiveram a Hugo Chávez como protagonista essencial, Uribe tenha saído fortalecido, interna e externamente. Internamente, parece impor a visão de que soluções militares são possíveis para terminar o conflito. Um conflito que ele não quer terminar, porque retira daí o apoio interno que possui, consciente de que militarmente não se ganha o conflito, mas se prolonga o suficiente para tentar obter um terceiro mandato e tentar desmoralizar soluções políticas da guerra.

Mas Uribe também ganhou espaços externos que não possuía. Os crimes cometidos por seu governo – dos quais o último é a revelação de que centenas de jovens foram executados por oficiais das FFAA, que difundiam a idéia de que eram inimigos mortos em combate, levando à prisão de altos oficiais do Exército, sem que as imagens desses jovens tenham sido minimamente difundidas pela imprensa nacional e internacional, ao contrário das de Ingrid Bettancourt – parecem, até aqui, não desgastá-lo. Uribe conseguiu quase que reduzir a violência na Colômbia à violência das Farc.

Parece que já não existem seqüestros do regime, presos – já não se fala de troca de presos, apenas de libertação unilateral pelas Farc -, apenas os seqüestrados pelas Farc.

Reunidos em Paris em novembro, sob o patrocínio de Sécours Catholique, dirigentes de várias organizações políticas – Polo Democrático, Partidos Liberal e Conservador, entidades de direitos humanos de distinta índole – discutiram alternativas políticas e democráticas para a crise colombiana. Há um consenso de que soluções militares, além de injustas, são impossíveis e que é preciso buscar alternativas políticas.

Porém, para que estas sejam possíveis, é necessário que os campos em conflito entrem em negociação política. Hoje as Farc aparecem duramente golpeadas política e militarmente, podem estar propensas a soluções negociadas. (Houve uma resposta positiva das Farc à solicitação de 113 intelectuais colombianas solicitando a troca de prisioneiros, o que pode parecer uma primeira reação nessa direção.) Porém, Uribe não tem por que negociar, se sente forte, tenta conquistar um terceiro mandato presidencial, uma lista de apoio a essa nova violência constitucional já foi feita.

Somente se Uribe sofre um golpe político, que pode ser o de não obter o terceiro mandato e/ou se o novo governo dos EUA, além de confirmar a rejeição da assinatura do TLC, pelo fortalecimento dos democratas na Câmara dos Deputados, termina com a Operação Colômbia e pressiona a Uribe para que participe de negociações políticas para terminar com a guerra na Colômbia.

Além, é claro, de que o trabalho persistente de denúncia dos crimes do governo, feito pelas organizações políticas e sociais colombianas, leve o governo a uma situação de enfraquecimento, que impeça a reeleição de Uribe e leve ao fortalecimento de uma oposição unificada, que permita a vitória de um candidato democrático nas eleições presidenciais de 2010.

A guerra na Colômbia é a situação mais grave que vive o continente, pelas violações sistemáticas dos direitos humanos que representa – de que os mais de 3 milhões de colombianos deslocados são um dos aspectos mais brutais e menos difundidos -, pela alimentação do narcotráfico – que aumentou ao longo dos anos do governo Uribe -, pelos riscos de enfrentamentos com países vizinhos. Promover a paz no continente, avançar nos processos de integração regional, supõe ações da Unasul, do novo governo dos EUA e dos movimentos populares do continente, para terminar com a guerra e a repressão na Colômbia. Para o que a derrota de Uribe – como cabeça articuladora do bloco no poder – é uma condição essencial.
Fonte: Site O Vermelho.

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