domingo, 10 de janeiro de 2010

MÍDIA - Quando a gente descobre que foi manipulada.

Copiado do blog da Lola

QUANDO A GENTE DESCOBRE QUE FOI MANIPULADA

A Aline me mandou um email que me deixou tão feliz que pedi a ela licença pra reproduzi-lo. Então lá vai:

Tudo bem? Sou a Aline, do blog Na Boca do Forno, e ando sumida por causa do meu bebê que nasceu, mas sempre encontro tempo para ler os blogs que gosto através do Reader...
Leio sempre o seu blog e como sei que você é a favor do governo Lula, gostaria de saber se não poderia ler o texto a seguir [que fala mal do Lula e do filme sobre o Lula. Começa assim: “A exemplo da Alemanha dos anos 30, está sendo aqui desenvolvida a imagem de um mito, a ser venerado pelo povo, que o elevará à presidência perpétua, com amplos poderes ditatoriais”] e fazer, se for possível, um comentário no blog. Não me entenda mal, eu não sou 100% a favor do Lula, mas ler o seu blog me fez ver que vários pontos que eu era contra são afinal, legais. Eu votei no Lula na primeira vez (na segunda, votei na Heloísa). Enfim, recebi esse texto de uma amiga e achei uma palhaçada! Só que não sei como contra-atacar...
Essa mesma amiga me repassou um e-mail esculhambando a Dilma, tachando-a de terrorista com ficha criminal e tudo. Gostaria muito de ter uma resposta para esses ataques, mas eu não sou muito politizada e não tenho como rebater com achismos. Posso dizer que eu tendo a acreditar no que as pessoas dizem se elas tiverem bons argumentos. Até pouco tempo atrás eu era contra as "bolsas" do governo, mas você me fez ver o contrário. Isso porque eu lia Veja, olha só, achando que era uma boa revista, imparcial (ha, ha) e informativa. O único contra o governo Lula, ao meu ver, era o Diogo Mainardi. Que tolice! Eu achava, realmente, que estava bem informada e concordava com muitas das matérias da Veja, porque tinham argumentos que se afinavam com o que eu pensava até então. Hoje eu sinto que essas publicações fazem meio que uma lavagem cerebral em pessoas como eu, mas é difícil perceber quando o normal é só esse tipo de impresso. Praticamente toda a mídia segue a mesma linha e o que é contra é meio "nicho" ou estigmatizado. O leitor comum, como eu, vai ler o que é de fácil acesso e consagrado. E aí que está o problema, pois só vai ver os mesmos argumentos, as mesmas linhas de pensamento, e não vai ter um contraponto para poder julgar se está certo ou não.
No começo fui contra várias coisas que você expunha, mas com o tempo e com a ajuda de seus artigos e de suas comentaristas, fui percebendo como fui cegada! Tudo por não ter acesso a contra-argumentos pontuais. Então, gostaria de aproveitar e agradecer por você e seu blog existirem! Obrigada!

Eu me empolguei e respondi com um livro em vários volumes. Não sei se vocês vão ter tempo ou vontade de ler:

Querida Aline,
Em primeiro lugar, parabéns pelo bebê recém-chegado! Ah, vc deve estar nas nuvens e sem tempo pra nada, não é assim que funciona?
Fico muito feliz que vc tenha mudado um pouco de mentalidade com a leitura do meu blog. Isso de achar que a Veja era neutra, só o Mainardi seria contra o Lula, é tão comum... Porque é exatamente isso que vc aponta: se a mídia toda fala a mesma coisa, e a gente já foi acostumada desde criança a acreditar nesse pensamento único (e de achar que tudo que sai em jornais, revistas e noticiários é a pura e imparcial verdade), como pensar diferente? Existem pouquíssimas publicações impressas que sejam contra o sistema, até porque é caro imprimir. Mas aí que entram os blogs, e é por isso que tanta gente considera a internet uma grande revolução, porque a comunicação fica dispersa, não concentrada. Passamos a conhecer outros pontos de vista. Aquela moça negra e lésbica que jamais teria uma coluna num jornal, de repente passa a escrever um blog. É óbvio que seus argumentos e sua visão de mundo serão bem diferentes daqueles do colunista homem, branco e hetero que escreve pro jornal (cujos argumentos, não por coincidência, se alinham com os do dono do jornal branco e hetero). Ainda que boa parte dos blogs seja perda de tempo e só reproduza o status quo (afinal, são escritos por gente do dia a dia ― e quantas pessoas que a gente conhece pensam, analisam, discutem, ao invés de repetir o que lhes é dito?), existem vários que fazem pensar. Fico muito contente, comovida até, que o meu modesto bloguinho seja visto como parte desta categoria por algumas leitoras.
Não dá pra contra-argumentar um email coletivo cheio de preconceito como este da sua amiga. Aprendizagem política é algo que leva bastante tempo. Eu recomendo que vc passe a ler diariamente blogs políticos, como o do Luiz Carlos Azenha, Paulo Henrique Amorim, Emir Sader, e Eduardo Guimarães. O do Nassif eu acho chatinho que dói, mas tente dar uma olhada também. O que eu faço é ir neste site agregador aqui, As Últimas (o meu blog consta neste site agregador, mas na categoria cinema). Vou lendo o que me interessa. Muitas vezes leio até o Reinaldo Azevedo. É bom ler vários pontos de vista, mesmo alguns asquerosos, como o do tio Rei. Tudo isso que sua amiga mandou no email saiu no blog dele e na Veja.
Mas lendo mais análises políticas a gente vai acompanhando o que acontece, e não é pega de surpresa. Por exemplo, isso que dizem da Dilma ser terrorista vai se intensificar muito neste ano eleitoral. Isso revela uma total falta de conhecimento da história do Brasil, e também um posicionamento ideológico. Quem chama a Dilma de terrorista apaga o contexto histórico, que era: havia uma ditadura militar que matava e torturava gente e censurava informação. Essa ditadura durou de 1964 a 1985. 21 anos! O momento mais duro foi a partir de 1968, com o AI-5, que acabou com todas as liberdades individuais mesmo. Nessa época, alguns poucos jovens mais idealistas protestaram. Havia vários movimentos políticos, todos clandestinos, porque era proibido se manifestar contra o regime. Mas eles agrupavam pouca gente. A maior parte da população seguia com sua vidinha, fingindo esquecer que estava numa ditadura. A classe média, que na época era bem minoria mesmo (e não podemos nos esquecer que nos anos 60 o Brasil ainda era um país rural, com a maior parte das pessoas vivendo no campo, não nas cidades), apoiou o golpe de 64. A mídia também. Alguns dos grupos que lutavam contra a ditadura eram mais radicais, outros menos. Teve aquele que sequestrou o embaixador americano no Brasil pra trocá-lo por vários companheiros que estavam presos, como retrata o filme O Que é Isso, Companheiro? Teve o grupo do Marighella. Quase todos foram assassinados pelos militares. E isso não estava acontecendo só no Brasil, mas em toda a América Latina: na Argentina, no Uruguai, no Chile... Todos esses países tiveram golpes militares patrocinados pelo governo americano (um filme interessante é Desaparecido - Missing: O Grande Mistério). Nossos comandantes militares foram treinados pela CIA para acabar com a resistência e torturar melhor.
A Globo exibiu uma excelente minissérie em 89, Anos Rebeldes. Se essa minissérie fosse exibida hoje, reverteria o que muita gente acha da Dilma e dos demais “terroristas” (veja a excelente cena da morte da personagem Heloisa aqui). Pra mim, pessoalmente, quem lutou contra a ditadura foi herói. Seria bem mais fácil seguir vivendo a vida, sem se envolver, mas esses idealistas largaram sua confortável vidinha de classe média e foram lutar. Acho estranho que hoje as pessoas de direita acusem o Lula de ditador e censor (o que é uma enorme besteira ― onde mais uma revista pode estampar mentiras semanais contra o governo na capa, e o governo continua anunciando na publicação? Em que outro país do mundo um jornal pode publicar, sem provas, sem testemunhas, a acusação de que o presidente tentou estuprar um companheiro de cela?), e fechem os olhos pra ditadura militar. É esse pessoal que chama o golpe de 64 de “revolução de 64”, que chama o golpe em Honduras de revolução. Eles inventam que o golpe, opa, revolução, foi apenas uma resposta aos verdadeiros golpistas, os comunistas. Que, ahn, não estavam no poder. Em 64 quem governava era o Jango, vice de Jânio, eleito pelo voto popular.
Dilma não fez parte de uma organização extremista. Mas, e se tivesse feito parte? Não dá pra descontextualizar. Assaltar banco durante a ditadura militar é bem diferente de assaltar banco num sistema democrático como o de hoje. Essa ficha criminal da Dilma é falsa. Sabe quem fez? Um blog de extrema direita chamado Coturno Norturno. O cara é um militar que, obviamente, acha que a ditadura militar prestou um grande serviço ao país. Só que aí a Folha de SP publicou essa ficha falsa no jornal como se fosse verdadeira. E até agora nem pediu desculpas ou admitiu o erro.
Esse pessoal de direita sempre odiou PT, MST, CUT, UNE, e qualquer movimento popular. Eles não vão mudar de ideia agora. O que os assusta é que o povo, que sempre votou nos candidatos deles, em 2002 elegeu o mal encarnado, o Lula. E aí reelegeram o cara em 2006. Mas como? Com toda a mídia falando mal do governo todo santo dia, e o povo ainda o reelege? E o presidente tem 80% de aprovação? E ele ainda tem a chance de fazer sua sucessora? Esse é um pesadelo muito grande pra direita, que vai fazer de tudo pra reverter essa situação.
Sobre o filme Lula, o Filho do Brasil, fico pasma porque todas essas críticas vem de gente que não viu (nem vai ver) o filme. Eu, que sempre votei no Lula, fiquei com uma impressão ruim dele após ver o filme, só pra vc ter uma ideia. O filme não é político. Se Lula fosse um ditador como a direita diz que ele é, ele teria mudado a constituição para permitir uma nova reeleição (como fez o FHC).
Quanto a “quem pagou pelo filme?”, o pessoal tá revoltado que o filme não teve financiamento público. Praticamente todo filme nacional tem financiamento público, através da Lei de Incentivos Fiscais. Quase sempre o dinheiro vem de empresas públicas, como a Petrobrás e o Banco do Brasil. Com Filho, o patrocínio veio todo de empresas privadas. Aí a Veja faz uma lista de como essas grandes empresas recebem empréstimos do governo. Ora, TODA grande empresa brasileira recebe empréstimo. Inclusive a Abril, a Globo, e qualquer outra que eles mencionarem... A direita simplesmente se revolta que um filme assim tenha sido feito. Por ela, não seria. Haveria censura mesmo. Ué, são esses os freedom fighters, os lutadores pela liberdade? Os que querem proibir um cineasta de fazer um filme?
Mas Aline, essas pessoas que repassam emails assim não estão interessadas em argumentos. Querem apenas repetir a mesma mentira mil vezes até que ela se transforme em verdade. Essa sim uma estratégia nazista, sabe? Aliás, viu como a direita anda espalhando que o nazismo foi um movimento socialista? Que o símbolo máximo da direita, o nazismo, no fundo era de esquerda? Eles não têm argumentos pra uma bobagem dessas. Mas vão repeti-la sempre pra ver se alguém acredita.
Ufa! Escrevi um livro. Espero que vc passe a acompanhar mais análises políticas, para poder rebater vc mesma as besteiras que ouvimos todos os dias.
Abração da Lola

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