sexta-feira, 3 de abril de 2009

TRANSGÊNICOS - Interesse da Bayer não é o arroz, mas sim o agrotóxico.

Interesse da Bayer não é o arroz transgênico, mas sim o agrotóxico

Raquel Casiraghi *

Adital

Aumento na contaminação do meio ambiente e alimentos com mais agrotóxico na mesa do brasileiro. Estes são alguns dos prejuízos que seriam gerados pelo arroz transgênico trazido pela transnacional Bayer ao país e que teve sua primeira prova de fogo em uma audiência pública realizada no último dia 18, em Brasília.
A entrevista é de Raquel Casiraghi e publicada pela Agência de Notícias Chasque, 01-04-2009.

Até mesmo entidades ligadas ao agronegócio, geralmente favoráveis aos geneticamente modificados, se colocam contrárias à liberação do arroz transgênico. Na entrevista a seguir, o coordenador da Campanha de Transgênicos da organização não-governamental Greenpeace, Rafael Cruz, fala sobre os interesses econômicos que estão em jogo na não-aprovação da variedade, que não é plantada em nenhum outro país. Também questiona o real motivo que fez a Bayer levar o arroz para avaliação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio).


Eis a entrevista.

-Quais são os riscos do arroz transgênico à população?
-Primeiro de tudo, ele aumenta o risco de resíduos de agrotóxico. Quando for plantado, a idéia é que o agricultor possa aplicar sobre ele o herbicida, fazendo com que as ervas daninhas, no caso o arroz vermelho que é considerado erva daninha do arroz branco aí no RS, morra e o arroz transgênico permaneça intacto porque ele é resistente. O agrotóxico que vai ser aplicado é o glufosinato de amônio, que é um tipo de agrotóxico cuja patente é do próprio proponente do arroz, ou seja a Bayer, e quando é aplicado tem aquela propriedade que a gente chama de sistêmica. A morte da planta, digamos assim, é de dentro pra fora e não de fora pra dentro. A planta absorve isso [o agrotóxico], joga o tóxico no sistema circulatório e morre. As plantas que não são resistentes ao herbicida morrem; as que são, ficam com resíduos de agrotóxico em seu sistema circulatório, o que significa em toda a planta, não somente na sua superfície.

-E para os agricultores?
-Outro perigo que é paralelo e potencializa esse primeiro é o fato do arroz vermelho, que é a "erva daninha" - entre aspas porque no Nordeste ele é base alimentar de muita gente, no Sul é que ele não é apreciado - tende a ganhar resistência ao agrotóxico também. Porque na primeira safra, tudo bem, mas na segunda safra já houve cruzamento do arroz branco com o vermelho.

-Então esse cruzamento entre espécies vai espalhar a propriedade de agrotóxico no arroz vermelho também. O que o agricultor vai acabar fazendo?
-Vai aplicar mais agrotóxico porque ele não vai conseguir matar aquele arroz vermelho. E aí tem o que muita gente chama de "super erva daninha", que é uma erva daninha resistente. Isso, no campo, a gente vê que não soluciona o problema do agricultor, que quer eliminar o arroz vermelho e, por outro lado, faz com que o agricultor aumente o nível de agrotóxico aplicado e, com o passar do tempo, a tecnologia tende a ser ineficiente. A exemplo do que já acontece aí no RS com o arroz mutagênico, da Basf. Resumindo essa história, são dois perigos que se complementam: aumento de agrotóxico no prato do consumidor e contaminação ou cruzamento de transgênicos com não-transgênicos o que, além de reduzir a biodiversidade, aumenta o problema para o próprio agricultor.

-Entidades ligadas ao agronegócio, que geralmente defendem os geneticamente modificados, são contrárias à liberação do arroz transgênico. A que tu atribui essa mudança de posicionamento?
-Não tem mercado para quem quer vender arroz transgênico. No Brasil o debate não está popularizado, ainda falta esse debate cair no colo do consumidor. As pessoas não sabem o que são transgênicos. Fora do Brasil, não existe mercado para o arroz transgênico. Os Estados Unidos sabem disso, os produtores norte-americanos se posicionam contrários à produção do arroz transgênico lá. Não é por questão ideológica, é porque eles acham que por não haver aceitação, e já que eles exportam 60% do arroz que produzem, eles não preferem não se arriscar a morrer com toda a produção. E o Brasil, que quer se tornar um grande exportador, tem que observar isso. Atribuo a essa questão o próprio posicionamento da Federarroz contrária ao plantio de arroz transgênico.

-Na tua avaliação, por que a Bayer insiste na variedade se não há apoio nem dos setores do agronegócio?
-É bem arriscado falar ao certo. A Bayer é a única que está propondo arroz transgênico hoje no Brasil. E a empresa está tentando crescer no mercado de transgênicos, que hoje é dominado pela Monsanto. Se ganhasse esse mercado de arroz no Brasil teria uma vitória, não somente no país, mas fora também. Acho que o que eles querem, bem no fundo, é aumentar o mercado de agrotóxico deles. A Bayer é a maior empresas de agrotóxicos no mundo. E conseguir empurrar aqui o arroz transgênico, que não é mais nutritivo, não é resistente ao estresse hídrico ou a qualquer outro tipo de problema que o agricultor enfrenta. Ele é simplesmente resistente a um herbicida que a Bayer produz. Não sei o que a Bayer quer: ou vender transgênico ou vender agrotóxico. Ou os dois.

-Estás satisfeito com a atuação da CTNBio?
-Eu acho que o governo federal deu muito poder nas mãos da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança [CTNBio], principalmente depois da última reunião em junho onde saiu o posicionamento de que não mais acataria questionamentos da Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] e do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente] no que diria respeito em relação às decisões da CTNBio. Com esse superpoder, além de ser um desequilíbrio inaceitável, porque além de colocar a biossegurança do país nas mãos de 14 cientistas, que é o quórum mínimo lá. São 14 pessoas que decidem o que 180 milhões de pessoas irão consumir.

-O debate sobre o arroz transgênico na CTNBio será longo?
-O que a gente está esperando é que a CTNBio decida logo sobre isso. Espero que seja analisada e uma decisão seja tomada em relação a esse transgênico. O que não dá é ficar esperando a poeira baixar e, depois, voltar com esse assunto esquecendo de todos os questionamentos que já foram feitos na audiência pública, que foi o local em que as pessoas diretamente afetadas por isso puderam falar.

* Agência Chasque

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