Ricardo Melo: A direita levanta a cabeça
Ricardo Mello: Quantos votos teve a ministra Rosa Weber teve?
A direita levanta a cabeça
por Ricardo Melo, na Folha de S.Paulo
Os sinais estão à vista. A disposição de enxergá-los depende de cada um.
1 — Numa afronta à democracia, a ministra do Supremo Tribunal Federal Rosa Weber decide que a CPI da Petrobras tem que ser assim, e não assado. Pouco importa a decisão do Senado. A propósito, quantos votos teve a magistrada para imaginar que a opção de milhões de eleitores, que, mal ou bem, escolheram seus representantes no Congresso, vale menos que a dela?
2 — A Petrobras aprovou uma compra mais do que polêmica de uma refinaria em Pasadena, nos EUA. Isso já é sabido de todos. Mas alguns detalhes são interessantes: o conselho que aprovou a operação reunia representantes do “mercado” e do governo. Uma espécie da tal parceria público-privada sonhada e idolatrada por 11 entre 10 teóricos neoliberais. Pois bem: onde foram parar nessa história toda Fábio Barbosa, Cláudio Haddad, Jorge Gerdau, expoentes do “empresariado” brasileiro que, com Dilma Rousseff e outros, aprovaram o negócio? Serão convocados a depor, ou deixa pra lá?
3 — Num atentado às regras mais elementares da Justiça, o Supremo mantém encarcerado o ex-ministro José Dirceu em regime fechado, embora sucessivas sentenças do mesmo tribunal tenham condenado o réu a cumprir regime semiaberto. Aliás, Dirceu vive uma situação “sui generis”: foi condenado como chefe de uma quadrilha que, depois, o próprio Supremo concluiu que não existia.
4 — Uma promotora do Distrito Federal, Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa, com a maior sem-cerimônia, pede a quebra de sigilo telefônico não apenas de pessoas determinadas, mas de uma área geográfica que envolve o Palácio do Planalto, o STF etc., ao melhor estilo NSA de Obama. A desculpa oficial: apurar se José Dirceu usou ou não um celular na prisão — na qual, nunca é demais frisar, está detido ilegalmente. Qual a base para o pedido da sra. Corrêa? Denúncias informais, feitas por gente que não quis se identificar ou prestar um depoimento. Está certo que nossas faculdades de direito não são nenhuma maravilha, mas chegar a esse ponto para justificar a arapongagem desavergonhada é fazer pouco do mais ingênuo dos brasileiros.
5 — Depois de anos e anos, o STF absolve o ex-presidente Fernando Collor da montanha de crimes de que era acusado. Detalhe: o processado sofreu um impeachment por causa daquelas acusações, de resto muito mais evidentes e escancaradas do que, por exemplo, as do chamado mensalão. Bem, o “caçador de marajás” foi deposto, lembram-se? Dona Rosa Weber vai querer devolver o cargo a ele?
6 — Pouco tempo depois de confessar as atrocidades cometidas durante a ditadura militar, coronel reformado Paulo Malhães foi assassinado no Rio de Janeiro. Malhães é aquele que ensinou como sumia com vestígios das vítimas na época anterior aos exames de DNA.
Bastava tirar a arcada dentária, cortar os dedos para desaparecer com as digitais e lançar o cadáver, ou o que sobrou, num rio. Diante disso, não é preciso ser nenhum Eliot Ness para saber que a morte de Malhães foi uma queima de arquivo — como, aliás, ele próprio antecipou em seus depoimentos.
Dizem os compêndios: dias antes do golpe militar de 1964, lideranças pró-governo faziam pouco dos que alertavam para o risco de uma quartelada contra Jango Goulart. Uma das frases célebres: “Se a direita levantar a cabeça, ela será cortada”. Deu no que deu. As condições são diferentes, o mundo não é o mesmo, mas, pelo sim, pelo não, é sempre bom ficar esperto. Ou então esperar mais 50 anos para ouvir outra ladainha de “autocríticas”.
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