quinta-feira, 26 de junho de 2008

ANOS DE CHUMBO XVI - A resposta de Ustra.

Esse Tuma é uma das figuras mais desprezíveis que existe. Foi talvez o principal culpado pelo assassinato do Chico Mendes e também um fiel servidor da ditadura. Hoje quer se fazer passar por um democrata.

Carlos Dória.

Coronel acusado de comandar a tortura no DOI paulista diz que Romeu Tuma sabia de tudo e pede testemunho dos atuais comandantes militares.

Coronel Ustra: "Tuma viveu a situação de violência da época e o trabalho do DOI"
Alvo de uma ação do Ministério Público que tenta obrigá-lo a arcar até com as despesas da União com indenização de presos políticos, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra já montou sua defesa num possível processo. Entre 1970 e 1974, Ustra foi comandante do DOI-CODI paulista. Pelo menos 60 militantes de esquerda perderam a vida em confrontos com o órgão. Centenas foram submetidos a tortura. Para defender-se, Ustra faz um apelo genérico e uma convocação específica. Ele quer que o atual senador Romeu Tuma seja ouvido como testemunha de sua defesa. Num texto de 31 páginas, ao qual ÉPOCA teve acesso com exclusividade, Ustra diz que Tuma “acompanhou e viveu a situação de violência da época e o trabalho do DOI, já que, como delegado da Polícia Civil, era o elemento de ligação entre o Comando do II Exército e o Departamento de Ordem Política e Social, órgão no qual estava lotado.” Ustra constituiu um advogado para orientá-lo no processo, Paulo Esteves. Além do senador Romeu Tuma, Ustra convoca quatro oficiais da ativa do Exército para servirem com suas testemunhas. Ele não está falando de baixas patentes, mas do próprio comandante do Exército, Enzo Martins Peri; do comandante militar do Sudeste, onde funcionava o DOI paulista; do Chefe do Estado Maior do Sudeste e do chefe do Centro Inteligência do Exército, CIEx. Referindo-se a oficiais de gerações posteriores, que fizeram carreira após a democratização, Ustra escreve que “tais militares, ainda que jovens naquela época, vivenciaram ou acompanharam a violência daquela quadra conturbada.” Com esse pedido, a investigação sobre o passado da ditadura pode transformar-se em confusão e constrangimento no presente. O argumento de Ustra para chamar Tuma é que o então delegado acompanhava de perto aos trabalhos dos órgãos de repressão que prenderam adversários do regime, em particular integrantes de organizações armadas. No texto de sua defesa, ele lembra que o trabalho do delegado consistia em realizar inquéritos relativos às prisões realizadas pelo DOI. A escolha de Tuma não é casual. Filiado ao PTB, o senador integra a base parlamentar do governo Lula, de onde têm partido sinais de estímulo à reabertura de investigações dos crimes ocorridos durante a ditadura militar e também sobre o papel de Ustra à frente do DOI. Nos anos finais do regime militar, Tuma foi o delegado que, cumprindo ordens do Planalto, manteve o então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva sob prisão, acusado de crime definido na Lei de Segurança Nacional. Lula estava preso quando sua mãe, muito doente, morreu. Tuma permitiu que Lula saísse da prisão para acompanhar o enterro. Entre amigos do presidente da República, é comum dizer que esse gesto marcou uma primeira aproximação entre o delegado e o sindicalista. Como delegado da Polícia Civil, Tuma teve um papel que ainda não foi inteiramente esclarecido nos anos de chumbo. Tuma atuou como elemento de ligação entre o DOPS paulista e a área militar. Ao colocar o nome do delegado e hoje senador num processo em que é chamado a prestar contas sobre o passado, situação que jamais ocorreu no país, Ustra faz uma clássica manobra diversionista, procurando abrigo na sombra de Romeu Tuma, hoje um político prestigiado, que fez a transição do regime militar para a democracia civil sem maiores manchas na biografia. ÉPOCA procurou ouvir o senador na noite desta quarta-feira (25), fazendo sucessivos pedidos à sua assessoria de imprensa. Não havia obtido resposta até o fechamento desta reportagem. A atitude de Ustra deve ser examinada com cautela, cabendo inclusive a pergunta: por que são feitas agora, três décadas depois de os fatos terem ocorrido? Tuma ocupou uma posição chave na máquina policial, sob o regime militar. Cumpria tarefas de inteligência na investigação das organizações de esquerda e até hoje nunca foi denunciado por envolvimento em tortura ou assassinatos. Em conversas privadas, Ustra revela que Tuma comparecia praticamente todos os dias ao DOI e que teria conhecimento de tudo o que acontecia ali. Conforme o coronel, o delegado acompanhava todos os serviços – no próprio local. Ustra sustenta que nunca participou de torturas nem autorizou qualquer tipo de violência contra presos políticos. Essa alegação é negada pelo depoimento de dezenas de presos políticos do período. O coronel lembra que o então delegado tinha função de registrar legalmente as prisões efetuadas pelo DOI. Em suas palavras, se alguém foi “estraçalhado” no porão militar, Tuma também viu tudo. Em sua defesa, Ustra emprega outro argumento esperado nessas circunstâncias: “cumpri, rigorosamente, as ordens emanadas de meus superiores.” Eles foram, conforme o texto, o presidente Emílio Garrastazu Médici e outros sete generais – todos já mortos. O coronel também afirma que: “tenho a certeza de que esses homens, com sua estirpe e com seu passado, se vivos fossem não me deixariam só nesta hora em que os revanchistas de plantão, por vingança, querem colocar-me em julgamento”.
Fonte: Revista Época.

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