Jornalismo pueril, para agradar a ideologia do dono
Ao abrir o computador para ver as notícias, deparo-me com a manchete do Globo Online. “Emprego público representa 21% da ocupação formal do país”. Quem lê, desavisadamente, pode pensar então que de cada cinco trabalhadores brasileiros, um é funcionário público. Seríamos, portanto, um país com um bom número de servidores públicos e com todas as condições de termos um bom serviço público, não fossem estes ineficientes.
Ora, como no Brasil a ocupação formal representa pouco mais da metade do trabalho informal, isso quer dizer, na prática, que temos apenas cerca de 11% dos trabalhadores no serviço público e nas empresas estatais. E como os trabalhadores, sejam formais, informais, ou desempregados, necessitam de escola pública, saúde pública, enfim, de serviços públicos, esse número é insuficiente.
Há três meses publiquei este dado que O Globo puxa para sua manchete, num estudo do próprio Ipea. E mostrei o gráfico aí ao lado, onde voc~e pode ver que a proporção de trabalhadores no setor público no Brasil é muito baixa. Nem vamos falar na Europa, com sua política de bem-estar social, ou nos Estados Unidos, o paradigma mundial de “Estado Mínimo”. Até aqui na América Latina ficamos na rabeira da lista dos países que empregam pessoas para prestar serviços à população.
É só olhar e ver, coisa que O Globo não gosta de fazer. Os dados, ali, só servem para confirmar as idéias e a posição ideológica da empresa. Não se deu ao trabalho de olhar que o dado que publicou refere-se a uma percentagem de 21% sobre os 39,4 milhões de trabalhadores formais – com carteira assinada ou estatutários do serviço público – , o que dá 8.275 mil funcionários públicos. Está nas páginas 14 e 15 da pesquisa do Ipea, que pode ser lida aqui.
Se o jornal tiver um pouco mais de trabalho e for até a página 67, vai encontrar escrito:
No Brasil, segundo dados da PNAD, havia cerca de 10 milhões de empregados no setor público em 2007, considerados no seu sentido mais amplo, ou seja, incluindo administração direta, administração indireta e todas as formas de empresas estatais. Este total de pessoas empregadas no setor público representava cerca de 5,4% do total de habitantes do país e cerca de 11% do total de pessoas ocupadas no mercado de trabalho brasileiro, tomados em seu conjunto.
Muito diferente a leitura, não é? E muito perversa, também.
Porque não é possível que uma matéria sobre esta pesquisa do Ipea não se preocupe em falar dos outros índices que ela revela.
- 428 municípios brasileiros (mais de 8% do total) não têm sequer um médico que atenda pelo SUS;
- 1.867 municípios (um terço do total) não possuem estabelecimentos de urgência do SUS;
- 80 cidades não tem uma escola sequer. Centenas de cidades não têm sequer um estabelecimento de ensino médio público e só 157 dispõem de uma faculdade pública.
Neste mapa aí as áreas em amerelo correspondem aos municípios que não têm ou têm apenas uma escola pública de nível médio. Veja só que escândalo . Mas isso não atraiu a atenção do jornal.
Assim que puder eu volto, com revelações surpreendentes e chocantes do estudo do Ipea, sobre onde são maiores as nossas carências de serviços públicos.
Fonte: Blog Tijolaço.
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