Lula: sobre paz e imperialismo
Carta Maior - 06/12/2009
Segundo o Instituto Internacional para as Pesquisas sobre a Paz, o armamento das cinco potências é suficiente para destruir o mundo várias vezes. Uma ordem mundial estável pode ser construída sobre padrões destinados a perpetuar o poderio de poucos e a impotência de muitos?
Gilson Caroni Filho*
As idéias de Lula sobre política externa, ao contrário do que tentam propagar notórios embaixadores e articulistas da grande imprensa, não apontam para a “partidarização petista" da cúpula do Itamaraty. Pelo contrário, partindo da complexidade do cenário internacional, o governo formula uma agenda que reafirma a soberania da diplomacia brasileira, sem contemporizar com hegemonismos de qualquer ordem.
É nesse contexto que devem ser entendidas as palavras do presidente em sua recente viagem à Alemanha. Salientando que é preciso " muita paciência com o Irã ", Lula lembrou que, para pedir a um país que não desenvolva arma atômica, Estados Unidos e Rússia deveriam desativar as suas. Quem interpretar tal observação como petição bizantina, destinada apenas a agradar aos setores de esquerda de sua base de governo, estará gastando munição barata para analisar o que não consegue entender.
Se a questão fundamental da atualidade é a da guerra e da paz, devemos fazer algumas indagações sobre o discurso hegemônico que paira sobre ela. Pode haver garantia efetiva contra o uso ou ameaça de emprego de armas nucleares se as cinco potências que comandam o Conselho de Segurança da ONU (EUA, Rússia, China, França e Inglaterra) continuam presas à noção de que tais armas devem ser sua exclusiva e perpétua propriedade, em detrimento da segurança de outros países?
Como destacou o ex-embaixador Celso de Souza e Silva, em artigo escrito para o Jornal do Brasil, em outubro de 1983, "nenhuma declaração unilateral, especialmente quando colocada em termos gerais e imprecisos, pode contrabalançar a real ameaça à segurança dos países não possuidores de armas nucleares, representada pela existência desses artefatos nas mãos de um seleto clube mortífero."
Com efeito, é importante lembrar que o direito de autodeterminação, certamente, não é monopólio das potências nucleares existentes. Se elas não reconhecem limites ao direito de garantir a própria segurança, ao custo da posse de 26 mil ogivas nucleares, não podem esperar que outros países se abstenham durante muito tempo do exercício dessa mesma opção. Segundo o Instituto Internacional para as Pesquisas sobre a Paz de Estocolmo (SIPRI), o armamento concentrado pelas cinco potências seria o suficiente para destruir o mundo várias vezes. Diante disso, indaga-se se uma estável ordem mundial pode ser construída sobre duplos padrões destinados a perpetuar o poderio de poucos e a impotência de muitos?
Em abril, o presidente Barack Obama, perante milhares de pessoas, em Praga, disse acreditar em "um mundo sem armas". Como as raízes do militarismo estão na natureza econômica e de classe do imperialismo, que jamais desistirá da força militar como instrumento de sua política, resta saber até onde vai a disposição do líder estadunidense. Como afrontará os invernos planejados pelo Pentágono? A intensiva preparação para novas guerras é parte constitutiva do processo de acumulação capitalista. Se pairar alguma dúvida sobre esse ponto, basta observar o quanto o orçamento norte-americano destina ao complexo industrial-militar. Sem contar, é obvio, a generosa concessão de fundos e verbas ao Ministério da Defesa.
O que propõe Obama em médio prazo? Uma reconversão da economia norte-americana? Talvez, em Berlim, Lula o tenha alertado para o perigo de platitudes que arrebatam platéias, mas não movem a história
P.S: sobre César Benjamim, não há muito que acrescentar. Endosso os textos de Washington Araújo, Gilberto Maringoni e José Arbex Jr. O ex-militante de esquerda, munido de ressentimento e dor narcísica, se mudou de mala e cuia para o que há de mais reacionário na direita. Quem leu seu último artigo (“Por que agora?” - Folha de S. Paulo, 2/12), pôde constatar que as críticas contra o governo praticamente reproduzem as do editorial do jornal paulista ("Lula, o filme"), publicado em 28 de setembro. Para melhor exercer o papel de lugar-tenente da família Frias, César matou Cesinha.
*Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil.
Fonte: ContrapontoPIG
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