Pedro do Coutto
Provavelmente um dos motivos que está levando o governador José Serra a adiar o gesto de se declarar candidato à presidência da República é o de evitar travar qualquer debate com o presidente Lula, que atinge a índice impressionante de popularidade. Serra teria como estratégia aguardar o momento em que a ministra Dilma Roussef formalize sua condição plena de candidata. Então, o debate de idéias em torno de temas definidos seria com ela, diretamente, e não com Luis Inácio. O governador de São Paulo, com isso, pode estar contrariando correligionários e candidatos a governos estaduais que se propõem a abrir palanques para ele. É certo. Mas, em contrapartida, tenta impedir que a campanha ganhe um caráter plebiscitário em torno do desempenho do Palácio do Planalto, ancorado pela aprovação praticamente generalizada da opinião pública. Os efeitos do apoio de Lula a Dilma já se fizeram sentir na mais recente pesquisa do Datafolha. Ele, Serra, manteve seu nível de 37 pontos, mas a chefe da Casa Civil avançou de 17 para 23%. Se o apoio inicial de Lula foi suficiente para melhorar a colocação da candidata, quanto mais ele se empenhar, melhor para ela.
Há uma transferência nítida. Até que ponto chegará eis a questão. O lançamento de Serra antes do lançamento de Dilma poderia conduzir parte substancial do eleitorado a fixar uma visão dfo confronto da qual o candidato tucano tenta evitar. As eleições não são entre Serra e Lula, tampouco entre a atual administração e a de Fernando Henrique.
Porém se houvesse um debate entre Lula e Serra parte expressiva do eleitorado poderia traduzir como um confronto entre o presidente e aquele que, através da oposição, busca sucedê-lo. De qualquer forma, o posicionamento de Serra está deixando uma sombra envolver sua disposição. Se existem aqueles que interpretam a cautela como uma dúvida do próprio governador, outros identificam no recolhimento aparente uma estratégia mais sofisticada. Pois quanto mais debate houver ou houvesse entre Lula e Serra, mais facilmente o presidente colaria a imagem da ministra na sua própria imagem e na imagem do governo. A política tem dessas coisas. Lula tem como estratégia centralizar o debate, Serra empenha-se para evitar que as imagens de Lula e Dilma se confundam e transformem os dois num só personagem eleitoral.
Por esse motivo, e outros que vão surgir, é que o confronto de 2010 ganha caracteres bastante particularizados. Incluindo-se no quadro o rumo a ser adotado por Ciro Gomes, cuja presença garante o desfecho de outubro no segundo turno. Daí a dúvida se ele será mais útil ao governo disputando a presidência pelo PSB, com reduzido tempo no horário eleitoral, ou lançando-se candidato ao governo de São Paulo. Deu um passo nesse sentido, transferindo seu domicílio político. O problema do tempo na TV pesa muito. A senadora Marina Silva vai se deparar com ele em sua campanha pelo Partido Verde. Isso no plano federal. É difícil que o PV forme coligações capazes de ampliar seu espaço. Obstáculo que prejudica a candidatura Fernando Gabeira ao Senado pelo Rio de Janeiro. Quando disputou a Prefeitura do Rio firmou aliança com o PSDB e o PPS que lhe assegurou tempo precioso de exposição. Mas este ano, sem o PSDB, a conquista do passado recente desaparece no futuro próximo. Para obter tempo na TV seria necessário um novo acordo com o PSDB, fornecendo espaço a Serra no Estado. Mas, para isso, Marina Silva teria que retirar sua candidatura, já que a lei não permite que o partido que possui uma candidatura à presidência possa formar coligação com legenda diversa no plano estadual. Como se vê, a questão tempo é mais complicada do que parece ser à primeira vista. O mesmo pode se aplicar ao retraimento de Serra. Política é assim.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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