No aniversário de 50 anos do golpe de 64, os militares passaram praticamente em silêncio. 
 
Não houve notas públicas, ordens do dia ou reuniões de reformados em aberta e ostensiva comemoração –como já ocorreu várias vezes em efemérides anteriores.
 
Com o silencio militar, talvez até por determinação da presidência da república, sobressaiu-se, quem diria, um professor de direito do Largo São Francisco, que tentou impingir a seus alunos a leitura de uma tortuosa explicação de sua opção preferencial pela ditadura, chamado de Continência a 64.
 
Os estudantes da Faculdade de Direito da USP, a mesma invadida em 1968 para prender alunos que protestavam contra a ditadura, e palco da leitura da Carta aos Brasileiros pelo professor Goffredo Silva Telles Jr., na década seguinte, repudiaram tal continência. 
 
Opuseram-se à tamanha desfaçatez encenando, com gritos e capuzes, um interrogatório nos porões ao mesmo tempo em que cantavam Opinião, de Zé Keti. Ensinaram mais sobre a ditadura a seus colegas do que o texto em que o professor elogiava o regime militar e se dizia, num discurso bolsonaro, um combatente da peste rubra.
 
O silêncio militar, em grande parte, permitiu que outras vozes dessem vazão às defesas explícitas ou envergonhadas do golpe –ilustrando um fato que a muitos ainda escapa, que a ditadura amealhou apoios entusiasmado de políticos, empresários e donos de jornais.
 
As organizações Globo fizeram recentemente um mea culpa sobre o apoio à ditadura que se instalou com o golpe –semanas depois, veio a lume, por intermédio de documentos norte-americanos já tornados públicos, a pressão que Roberto Marinho fazia junto a Castelo Branco para evitar a realização de eleições diretas em 1965, como até então se estipulava no calendário eleitoral.
 
Embora nada inusitado pelo teor das manifestações da Globo à época, o fato só revela que o relacionamento da imprensa com o poder militar pode ter sido muito menos submisso do que já se fez crer.
 
Afinal, o clima de catastrofismo e de perigo comunista instado pela imprensa na época foi condição sine qua non para a chegada dos militares ao poder. 
 
Quadro que contou, inclusive, com a ocultação de pesquisas realizadas pelo Ibope, às vésperas do 1º de abril, indicando que a popularidade do presidente João Goulart continuava alta. Elas só se tornaram conhecidas dos leitores, com quem os jornais afirmam peremptoriamente compromissos de eterna lealdade, com um atraso de 50 anos.
 
Embora o dispositivo militar tenha dissuadido uma reação do presidente Jango, é de se lembrar que foram os parlamentares em um Congresso aberto, que arremataram o golpe com a declaração de uma vacância que jamais existiu.
 
Os militares ocuparam o poder com cinco generais e abriram as portas para as extremas violências que se multiplicaram no período. 
 
Mas jamais estiveram sós nessa empreitada. 
 
Empresários que os financiaram e jornalistas que os aplaudiram, políticos que os sustentaram e juristas que os legitimaram, deixam evidente que o exercício arbitrário do poder não ficou limitado a fardas e coturnos. 
 
A diferença é que os civis não voltaram a seus quartéis e jamais deixaram de frequentar os espaços do poder.
 
 
 
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