«Ao identificar-se com a criminosa ação de Israel (chegando ao ponto de sancionar a anexação de Jerusalém pelos sionistas) e ao ameaçar o Irã com o recurso a « todos » os meios possíveis, Obama deixou claro o caminho que pretende trilhar se for eleito e a luta dos povos não conseguir atar as mãos predadoras e agressoras do imperialismo norte-americano».
O domínio internacional da mídia pela classe dirigente norte-americana é realmente avassalador. É com ele e com a superioridade militar de que dispõem que os EUA contam para defender a sua posição hegemônica no campo imperialista, contornar sucessivos fracassos da sua política interna e externa, teimar na pretensão de impor ao mundo uma «nova ordem» totalitária contra os trabalhadores e contra os povos.
Vem isto a propósito do autêntico bombardeio planetário com as «primárias» das eleições presidenciais nos EUA que em Portugal têm tido uma expressão tão excessiva quanto ideologicamente manipulatória. São múltiplas as mensagens, explícitas ou subliminares, projetadas por um bombardeamento que já durou vários meses e que ameaça continuar até às eleições, centrado já não no «duelo» Obama-H.Clinton mas entre os candidatos dos partidos Democrático e Republicano, as duas faces do partido único do sistema.
Mas a mais farisaica e perigosa de todas é a que visa fazer passar aquela que é porventura a mais sofisticada ditadura do capital pelo mais transparente e exemplar regime de liberdade. Tão transparente e exemplar que não só pode como «deve» arvorar-se em «líder do mundo livre» e arrogar-se o direito de dar ao mundo lições de «liberdade» e de «direitos humanos» mesmo se para tal tiver de rasgar a Carta da ONU e recorrer – como no Iraque, no Afeganistão, na Palestina, no Líbano, na Colômbia e noutros países – à violência do terrorismo de Estado.
Este perigoso embuste é tanto mais grave quanto ele se desenrola num quadro em que a administração Bush intensifica a corrida aos armamentos e a militarização da economia, multiplica guerras «preventivas», desenvolve novos programas de ingerência e agressão na América Latina e em África, mantém centros secretos de prisão e tortura, continua a espezinhar a legalidade internacional. O bombardeio midiático tem servido de biombo para estas e outras malfeitorias que, no essencial, passaram ao lado das «primárias».
Com isto não dizemos que o resultado das eleições presidenciais norte-americanas é indiferente. Afirmamos sim que estamos perante uma farsa em que diferenças de estilo, de discurso e de modo de lidar com tal ou tal questão (como a saída para o atoleiro do Iraque) escondem afinal coincidências de fundo na defesa dos interesses expansionistas do grande capital norte-americano.
As dificuldades em que o sistema de poder dos EUA se debate tanto no plano interno como externo (e que segundo as sondagens colocariam 70% dos norte-americanos contra a política de Bush), impõem que até o candidato republicano, Mc Cain, se demarque do atual inquilino da Casa Branca. Foi aliás com o slogan da «mudança» que Obama levou a melhor sobre a sra. Clinton.
Mas a «mudança» que Obama anuncia não deixa espaço para muitas esperanças. Se ilusões houvesse quanto ao real conteúdo de classe do seu pensamento e quanto à margem de manobra de que possa dispor em relação à classe dominante, o próprio se encarregou de as desfazer com o seu discurso na sede do mais poderoso lobby israelita no preciso momento da vitória na corrida para a nomeação. Ao identificar-se com a criminosa ação de Israel (chegando ao ponto de sancionar a anexação de Jerusalém pelos sionistas) e ao ameaçar o Irã com o recurso a «todos» os meios possíveis, Obama deixou claro o caminho que pretende trilhar se for eleito e se a luta dos povos não conseguir atar as mãos predadoras e agressoras do imperialismo norte-americano.
Não é boa a «mudança» que Obama oferece ao mundo se as circunstâncias não forçarem outro rumo. «Mudança» que duas frases lapidares do seu discurso da vitória nesse mesmo dia pronunciado no Minnesota (Monde 5.06.08) ajudam a iluminar: «a mudança é reconhecer que responder às ameaças de hoje não exige apenas o nosso poder de fogo mas também o poder da nossa diplomacia, uma diplomacia dura...», «devemos reencontrar a coragem e a convicção para conduzir o mundo livre». Aqui fica o registro. Que ninguém baixe a guarda.
Sérgio Barroso, Médico, doutorando em Economia Social e do Trabalho (Unicamp), membro do Comitê Central do PCdoB.
Fonte: blog Vermelho.
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