terça-feira, 10 de junho de 2008

MÍDIA - Entrevista com Paulo Henrique Amorim.

A DEGRADAÇÃO DA IMPRENSA BRASILEIRA.

Chegamos a um ponto sem precedentes em termos de degradação e corrupção da imprensa brasileira. A imprensa, que chamo de Partido da Imprensa Golpista, ou PIG, pé, sobretudo, a Globo, a Folha e o Estadão. Não falo da Veja, porque é um caso especial que eu chamo de “a última flor do Fascio” [alusão a “Língua Portuguesa”, soneto de Olavo Bilac, em que o poeta se refere ao nosso idioma como “última flor do Lácio, inculta e bela”.], nem da IstoÉ, porque não é uma organização jornalística.Quando você compra um jornal, teoricamente, pelos cânones da indústria, vai obter ali um noticiário razoavelmente isento e, nas páginas de opinião, fica aquilo que o dono quer divulgar. Aqui no Brasil, houve ma inversão completa. Hoje, tem opinião na parte informativa, até no horóscopo e na previsão do tempo, e o mais grave de tudo isso é que se disseminou o sistema de cooptação com dinheiro do jornalismo econômico e político. Tenho divulgado no meu site as relações entre o Daniel Dantas e algumas instituições, cuja função é distribuir notícias que influenciam formadores de opinião, a Justiça... É uma degradação sem precedentes.Meu ex-colega do IG, Luís Nassif, tem feito um trabalho exemplar ao apontar as ligações sórdidas entre a Veja e interesses econômicos constituídos. Não há nenhuma punição, nenhuma reclamação, nenhuma manifestação de indignação, os jornais do PIG não noticiam o que o Nassif está dizendo. É a maior revista semanal do país e ignoram o que fala um jornalista respeitável que trabalhou na Folha durante uma década, do Conselho Editorial da Folha. Ou seja, Nassif não é irresponsável segundo a Folha. E a Folha não dá uma linha!O Mino Carta, que é o pioneiro nessa batalha para demonstrar a pusilanimidade, o golpismo e agora a corrupção na imprensa, acha que nós não chegamos ao fundo do poço, que ainda iremos mais fundo e saberemos mais coisas e a impunidade continuará.PRIVATIZAÇÕES AGRAVARAM A DEGRADAÇÃO DA IMPRENSAO presidente do México, Carlos Salinas de Gortari, vendeu a telefonia do México para uma pessoa, que é o Carlos Slim, hoje o homem mais rico do mundo. Salinas de Gortari teve que fugir do México para a Irlanda porque nem em Miami ele podia ficar. O Fujimori, que fez a privatização no Peru, está preso. O Carlos Menem, que fez a privatização na Argentina, tem vários ministros na cadeia e não pode ver um juiz ou policial que sai correndo, pode ser preso a qualquer momento. Aqui no Brasil o Fernando Henrique Cardoso cobra US$ 60 mil por palestra e sai no PIG [Partido da Imprensa Golpista] a toda hora. E as pessoas levam o Fernando Henrique a sério, é o herói de uma parcela da população brasileira.Vou desenvolver a tese com mais clareza, mas houve, na transição do regime militar para o democrático, a tragédia da dívida nos anos 80. O Brasil quebrou em 1982, o fenômeno da hiperinflação, e o Sarney tentou resolver, o Collor tentou resolver, e o Fernando Henrique tocou o Plano Real. O plano, entretanto, tinha, como base para solucionar ou para auxiliar a equacionar o problema, a privatização, um instrumento pelo qual o sistema político dominante à época — o PSDB e o PFL — encontrou para acomodar os interesses políticos internos, domésticos, da coalizão dominante e os interesses dos bancos. Ela foi o fiel da balança dessa reengenharia que levou ao sucesso o Plano Real.Agora, temo que a operação de criação da BrOi seja a consubstanciação, aquele quadro do Napoleão sendo coroado, que está na igreja de Notre Dame. O quadro começa a ser pintado a partir do momento em que o Luciano Coutinho, presidente do BNDES, assina o empréstimo para o Carlos Jereissati e o Sérgio Andrade comprarem a Brasil Telecom, sem botar um tostão. Nesse momento, será feita a grande conciliação nacional, os fundos e o Citibank renunciam a toda ação [judicial] que moveram na Justiça contra o Daniel Dantas [grifado no texto original]. O governo Lula põe para dentro a corrupção do Dantas e do governo FHC, limpa a pedra e resolve esse problema botando o dinheiro do BNDES nas mãos desses dois subempresários, já que eles compraram a Telemar sem gastar também.Aí será feita a grande pacificação nacional, que mobilizou essa subimprensa de contratos de prestação de serviços, mas que você nunca sabe que serviços são esses. Então, se houver o Aécio [Neves] candidato em uma chapa que reúna PSDB e PT, como está sendo montada em Belo Horizonte, resolve tudo. Põe todo o Brasil debaixo do tapete. O PSDB esconde os ossos do Fernando Henrique no armário do Lula, o Lula esconde no armário seus próprios esqueletos, e o Brasil vai seguir em frente com a conciliação que o Tancredo [Neves] tentou fazer e não conseguiu porque morreu antes.A privatização é o que define o processo da Nova República no regime pós-militar, é a metástase da corrupção no Brasil. O Daniel Dantas é o maior símbolo, herói e beneficiário desse processo que corrompeu o PSDB, o PFL e o PT. Ele corrompeu o PSDB, financiou a filha do Serra e ele é a grana que está no duto do Valerioduto. Que o procurador-geral da República não procurou e que o ministro Joaquim Barbosa não achou. A grana do Valerioduto veio de onde? Dá em árvore ou o Valério era maluco e colocava dinheiro dele no esquema? Ele era um lavador de dinheiro e ninguém quer dizer isso. Fizeram a CPI dos Correios e não pediram indiciamento do Daniel Dantas, porque a bancada dele tem um líder no Senado, que é o Heráclito Fortes, e tem um líder na Câmara, que é o José Eduardo Cardoso.A tentativa do PT de incluir o Daniel Dantas na CPI dos Correios foi uma tentativa de última hora, feita depois que o relatório estava escrito e que não resultou em nada. Durante a argüição do Daniel Dantas, o senhor José Eduardo Cardoso fez perguntas que o Dantas esperava que fossem feitas e o Jorge Bittar (PT-RJ) fez perguntas inúteis. Ninguém do PT perguntou se o Dantas colocava dinheiro no Valerioduto. E era a única pergunta que cabia ali. Por que o PT não foi pra cima do Dantas? Porque o cara da bancada do PT não sabe se quem está do lado dele pegou dinheiro do Dantas. O Dantas calou o PT, imobilizou o PT.O Gushiken pagou o preço de ter tirado o Dantas da Brasil Telecom. E outro que pagou o preço foi Paulo Lacerda, homem probo e policial eficiente. Foi tirado da Polícia Federal porque queria prender o Daniel Dantas. Respondendo [ao repórter da revista], não posso revelar se conversei com Paulo Lacerda sobre isso.DEMISSÃO DE PAULO HENRIQUE AMORIM DO IGTenho a minha coleção de demissões. Foi um processo de “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”. O Sr. K [Ricardo Knoepfelmacher, presidente da Brasil Telecom], como mostro no meu blogue, aponta para direções opostas e esse é seu grande enigma: para que direção o Sr. K aponta? Ele entrou para presidente da Brasil Telecom como representante dos fundos e do Citi, para desfazer as falcatruas do Dantas. Ele me contratou porque eu tinha uma história na Internet de combater o Dantas. Ele me disse isso.E por que de repente isso mudou? Essa é a pergunta-chave da história. O Sr. K recebia pressões de diversas áreas, do José Serra, que tem uma tradição de pedir a cabeça de repórteres; do Carlos Jereissati e do Sérgio Andrade; e do Citibank. Porque eu, com o Rubens Glasberg e o Mino Carta fomos os únicos jornalistas que perguntaram: vale a pena fazer a BrOi e passar uma borracha no passado do Dantas? É esse o custo de fazer a BrOi? Quanto dinheiro do senhor Jereissati e Andrade vai entrar nisso? Entrei com um documento, quero a BrOi, e dou um real a mais do que os dois colocarem do próprio bolso.No meio do ano passado, o Sr. K tentou montar um conselho editorial para cercear minha opinião. Eu não posso revelar quem eram as pessoas que tinham por mim o mesmo apreço que tenho por elas. Consegui impedir que isso acontecesse. E me pergunto para quê, já que 95% do conteúdo de um jornal é de terceiros? Depois veio uma tentativa de me tirar da capa do IG. Levei seis meses negociando com o Sr. K esse ponto: só vou para ao IG se tiver espaço na capa. Sabia, porque no UOL já tinham me feito isso. E ele precisou de seis meses para impor a vontade dele e me colocar na capa. Depois, ele quis me tirar da capa. Eu ganhei.Finalmente, estávamos na antevéspera da solução do problema da BrOi, na antevéspera da Semana Santa, e ele me tirou do ar. Agora, ele me tirou do ar antes que eu pudesse ser notificado, estava no segundo bloco de um programa que gravo na Record e a minha equipe já tinha sido escorraçada do IG, os computadores lacrados, os crachás retirados. O Caio (Túlio Costa) retirou meu trabalho de dois anos do ar. Ele apagou o meu passado. Ele fez uma limpeza ideológica.Por que ele não me avisou e não redirecionou o internauta para o novo endereço? Como a Globo fez com o Franklin Martins, ela não o queria mais, mas redirecionou [o internauta para o endereço novo]. Por que [ele] quis me apagar?O Caio T — de Tartufo — Costa já tinha feito isso comigo no UOL. Uma série de informações que eu dava sobre as relações amistosas e dignificantes entre duas grandes personalidades brasileiras, José Serra e Nizan Guanaes. Não há registro físico, é uma especialidade dele suprimir isso. E olha que ele dá aula na Cásper Líbero sobre Jornalismo e Ética... Mas ele é um pau mandado, executa com entusiasmo o que o patrão mandou fazer. O Sr. K também serve a vários patrões. Fui demitido porque escrevia contra a BrOi e Daniel Dantas.TRABALHO NA TELEVISÃONa televisão, não trato desses assuntos. A Internet tem uma vantagem, você pode fazer o que quiser. É o último reduto da liberdade de imprensa e, felizmente, aqui no Brasil está nascendo algo similar ao que já existe nos Estados Unidos. A blogosfera está se transformando em um espaço de debate político relevante.Não estou mais interessado em discutir política, economia, essas coisas mais sensíveis na televisão. A televisão brasileira não é o espaço mais apropriado para isso e quando se faz, se faz mal feito. É a Miriam Leitão, William Waack, Arnaldo Jabor, Alexandre Garcia, esses grandes jornalistas que fazem a televisão brasileira. Então, não quero mais tratar disso na televisão.Ali, faço parte do Domingo Espetacular e sou repórter, como fui no Fantástico por seis anos em Nova Iorque, de onde fazia matérias que não tinham nada a ver com política. Cobria incêndio, crime, enchente, guerra civil...Sou repórter, porque esse pessoal que está aí, Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi, que acham que são jornalistas, não sabem cobrir uma batida de trânsito na esquina. Se mandar cobrir, chegam na redação com informações inverídicas e incompletas. Por isso não trato com esses camaradas, eles não são da minha profissão. Eles vendem a opinião deles. E não troco minha opinião por nada.Agora não quero saber de portais que só reescrevem o que sai na Agência Estado, Folha e Globo — uma reprodução mal feita.Discutir política e economia na TV era muito limitado e foi ficando cada vez mais. Trabalhei na Globo em um período que tinha hiperinflação e chegaram à conclusão de que era necessário ter jornalistas de economia na televisão. E o Delfim Neto diz, com muita propriedade, que no Brasil jornalista de economia não é uma coisa nem outra.Hoje, na Globo acontece o seguinte: o Roberto Marinho morreu e foi substituído por três filhos que não têm curso universitário. Nenhum deles é conhecido pelo nome próprio, são os filhos do Roberto Marinho. Colecionam fracassos empresariais. O mais velho, Roberto Irineu, é responsável pelo “grande sucesso” da Tele Montecarlo. Os três, por omissão/incompetência, delegaram o comando das suas redações a alguns prepostos, entre os quais se destaca o Ali Kamel [diretor-executivo da Gobo], que escreveu um livro para mostrar que o Brasil não é racista e revelou o Brasil racista. E eles escrevem o que imaginam que o patrão vá gostar de ver. Mas isso tudo carece de um mínimo de sutileza, de argúcia, que o velho tinha. O velho, dificilmente, na base de operações que é o Rio de Janeiro, brigaria com o presidente, com o governador e com o prefeito. Desconfio que o outro Roberto não faria isso, se ele e Antônio Carlos Magalhães estivessem vivos, estariam trabalhando com o Lula. Estariam trabalhando na base do governo, na sombra. Não é muito bom estar brigado com o governo federal por muito tempo.Pergunta da revista — se o presidente Lula está fazendo essa conciliação, por que o PIG [Partido da Imprensa Golpista] quer derrubá-lo?Amorim — Porque ele é pobre e é nordestino, é uma combinação de preconceito de raça com preconceito de classe.A possibilidade da aliança PT-PSDB em Belo Horizonte é o resultado físico dessa conciliação. Com esse mesmo espírito de concertação que uma candidatura Aécio com apoio do PT é um velho sonho da elite brasileira. Nós não somos a Argentina e lamento profundamente. Gostaria de ser argentino para ser militante peronista. O presidente Néstor Kirchner desfez o Supremo Tribunal e o presidente Lula nomeou para o STF um xiita católico que se posiciona contra as pesquisas com células-tronco. Esse Carlos Alberto Direito, que conheço desde que éramos estudantes da PUC, disse antes que era contra a pesquisa com células-tronco. Tem que tirar o Marco Aurélio de Mello de lá. Ele é um golpista, despreparado, não passa nem em prova de juiz de primeira instância.Tenho uma tese: o que o PT de São Paulo mais quer é ser tucano de São Paulo. E acho que uma das grandes coisas que pode acontecer com um grande acordo entre Aécio e o PT é tirar São Paulo do centro. Chega de São Paulo! O Brasil é muito maior que São Paulo.Fórum — o senhor aponta as contradições do governo Lula, mas também se posiciona como resistência antigolpista.Amorim — Veja bem, acho Lula melhor do que o Fernando Henrique. Acho os tucanos um conjunto de tartufos, são administradores incompetentes, FHC quebrou o Brasil três vezes. Governam São Paulo há 13 anos, metrô cai, o viaduto cai, você demora uma hora e meia para chegar no trabalho. Dê um exemplo do que os tucanos fizeram aqui? São incompetentes, ineptos. Sou contra os tucanos.Tenho uma identificação político-ideológica, sou carioca, minha simpatia fica com Leonel Brizola, que dizia que o PT era a UDN de tamancas, o Darcy Ribeiro dizia que o PT era a esquerda que a direita quer... Gosto do Jango, do Vargas e acho que o PT cometeu um grande erro quando achou que a direita ia vê-lo sob outra perspectiva. A direita o vê da mesma forma que via o Brizola, o Jango e o Vargas, porque o PT é trabalhista como eles. O Lula achou que ia encantar o PIG, a família Marinho e, como dizia o doutor Tancredo, “você vende a mãe, mas não vende seus interesses”.O Lula não caiu porque o Fernando Henrique não deixou. Naquele momento em que o Duda Mendonça confessou que recebia dinheiro do exterior na CPI, se sobe um deputado na mesa da Câmara e na presidência da Casa está o Auro de Moura Andrade, o Lula caía. Por que o Lula ao caiu? Porque o Fernando Henrique defendeu a tese do sangramento. O Agripino Maia comprou [a tese] e convenceu o PFL. Qual a teoria? Deixe o Lula sangrar até o fim, ele chega na eleição derrotado e o povo brasileiro iria buscá-lo [Fernando Henrique] em Higienópolis.Se tivesse o ACM, o Primo Levy ou o padre Godinho, o Lula tinha caído. E o que está por trás disso tudo? O escândalo do Mensalão. Quem está no Mensalão? O Dantas. Disse a um amigo meu quando Lula foi eleito em 2002: “Ou o Lula destrói o Dantas em três meses, ou o Lula destrói seu governo”. Quase destruiu. O presidente de um fundo de pensão disse que participou do acordo da BrOi, porque era o mesmo que negociar a paz com o chefe do tráfico de uma favela. Que país é este?Não estou atribuindo ao Daniel Dantas um poder maior do que ele tem. Dantas enredou Fernando Henrique Cardoso. Agora, enredou o Lula. O que ele fez com FHC? Trocou o conselho da Previ... Por que? Porque Daniel Dantas tem o PSDB na mão. O Dantas me tirou da TV Cultura e do UOL. Entrou com duas notificações e a TV Cultura e o UOL me pediram para parar de falar dele. Tenho uma luta com Dantas há muito tempo, há muito tempo eu percebo que ele é especial. Ele grampeou a mim, a minha mulher a minha filha. Soube disso pela Polícia Federal. Essa conta ele vai acertar comigo. Ele vai acertar comigo. Nós vamos ter um encontro no despenhadeiro e vamos acertar essa conta. No plano privado. O que você acha de grampearem sua filha noiva? O que você faria?

Um comentário:

Anônimo disse...

Dória, por que você republicou essa entrevista que já foi dada há meses? O que eu estranho é que o PHA soltou o verbo e não apresentou dado, indício, evidence, prova algum do que diz, especialmente nas insinuações sobre Lula e o PT. Acho muito estranho. Fica assim uma coisa tipo Veja com sinal contrário.