quinta-feira, 23 de julho de 2009

MANUEL ZELAYA: A democracia tem um preço a pagar e estou disposto a pagá-lo.

Giorgio Trucchi. *

Adital -

Entrevista com o presidente Manuel Zelaya Rosales, exclusiva para Sirel.

22 de julho de 2009

Ao finalizar a conferência de imprensa oferecida pelo presidente constitucional de Honduras, Manuel Zelaya Rosales, na embaixada de seu país em Manágua, pude abordar o carro do mandatário e de seu Ministro da Presidência, Enrique Flores Lanza, a caminho de uma entrevista com meios internacionais. Faltam poucos dias -ou talvez horas- para que o presidente Zelaya empreenda sua viagem de regresso a Honduras e na intimidade do veículo, começamos esta entrevista exclusiva para Sirel.

-Nesses dias foi anunciada sua intenção de regressar a Honduras a qualquer custo. É uma decisão definitiva?


- Não se trata de algo que atente contra a estabilidade do país, mas é uma solução e a busca da estabilidade. Esperamos que essa seja a melhor saída para empreender um diálogo interno que solucione o conflito e termine com a repressão que o povo hondurenho está sofrendo.

-Um diálogo com quem?

-Com o povo, porque em uma democracia é o povo quem manda. Os setores de poder que tomaram as armas são grupos repressivos e têm que deixar de exercer um mandato que o povo não lhes destinou.

- O que mais lhe atingiu nesse golpe de Estado contra sua pessoa e contra seu gabinete de governo?

-Me afeta que o país esteja sendo destruído, que a sociedade esteja sofrendo, que os avanços que alcançamos e os esforços de tantas gerações estejam sendo destruídos com o uso das armas.

-O governo de fato está totalmente isolado no âmbito internacional e enfrenta uma forte e incansável resistência interna por parte dos movimentos populares, No entanto, continua com uma atitude totalmente intransigente. O senhor tem se perguntado se trata-se somente de irresponsabilidade ou se confiam no apoio de atores externos?

-São como as feras da selva que se aferram a sua comida. Eles consideram Honduras como uma fazenda pessoal. É um grupo de dez famílias querendo afiançar suas prebendas econômicas e privilégios. É um temor infundado porque ninguém está atentando contra eles; no entanto, eles crêem que o desenvolvimento democrático os afetará e não aceitam a democracia.

-Na conferência de imprensa, o senhor disse que existem setores políticos da direita estadunidense que apoiaram e continuam respaldando o golpe de Estado. Está convencido do envolvimento desses setores?

-Houve manifestações públicas dessas pessoas apoiando o golpe e, inclusive, de senadores e congressistas estadunidenses. O senhor Otto Reich é um ex-subsecretário de Estado para o hemisfério ocidental e se manifestou a favor do golpe e existem muitas personalidades nos EUA que têm feito o mesmo. Então, existem provas, evidências de que os falcões do ex-presidente George W. Bush estão por trás do golpe.

- Que importância o movimento popular, social e sindical tem tido no sentido de deter o avanço do golpe?

- São protagonistas da defesa da democracia porque consideram que a democracia é o instrumento com o qual podem obter conquistas sociais. Estão combatendo o golpe e nunca deixarão de fazê-lo até que sejam corrigidos os efeitos desse atropelo contra o povo hondurenho e contra a democracia.
Os golpistas estão desafiando o mundo e temos que colocar um precedente, antes que seja demasiado tarde.

-A UITA esteve dando seguimento aos acontecimentos desde os movimentos populares, antes, durante e depois do golpe. Para essas organizações há dois elementos que não podem ser negociados: o rechaço a uma anistia para os golpistas e que continue o processo da quarta urna e a instalação de uma Constituinte. Qual sua opinião sobre esses dois pontos?

- Seria ridículo que os golpistas sejam premiados por dar um golpe de Estado. Creio que a posição dos movimentos sociais é que se busque uma solução ao conflito, mas que tampouco haja prêmios ou perdão para os delitos penais e comuns que têm sido cometidos. Ao mesmo tempo, creio que os sete pontos propostos pelo presidente Óscar Arias falam de anistia política; porém, não aos delitos comuns e penais. Quanto às reformas sociais, creio que o fato de buscar uma estratégia nova para continuar com estas reformas deve ser parte de um processo amplo de discussão dentro da sociedade hondurenha. Não temos que parar as reformas sociais e tampouco o direito de participação do povo, porque são direitos constitucionais. Nesse sentido, os pontos de Óscar Arias não foram discutidos em sua amplitude porque o que os golpistas não aceitam é a restituição do sistema democrático; querem um regime de fato, que não tenha leis; querem mantê-lo a custa de violência e isso não podemos aceitar.

-Tem sido dito que na busca por uma solução ao conflito existem dois elementos fundamentais: a posição dos Estados Unidos e o papel das Forças Armadas. Qual sua opinião a respeito disso?

-Hoje enviamos uma carta ao presidente Barack Obama pedindo-lhe respeitosamente que endureça as medidas não somente contra o Estado repressivo, mas também contra as pessoas que conspiraram e executaram o golpe de Estado. Esperamos respostas em breve, com o fim de que as medidas que estão sendo tomadas realmente restituam a ordem e o regime de direito. Se isso não acontecer, estamos todos em situação precária, não somente eu, que fui vítima de um golpe por defender os direitos da sociedade, mas toda a população. Creio que o presidente Obama não somente tem os mecanismos diplomáticos para pressionar mas também tem outros recursos fortes e espero que os aplique; e que os países da América Latina façam o mesmo.
Com respeito às Forças Armadas, se elas vão servir para dar golpes de Estado, logicamente teremos que avaliar seu papel. No entanto, creio que nesse caso, foi uma cúpula que ordenou o golpe. Os oficiais e a nova geração que vai receber uma Força Armada manchada de sangue não estão de acordo com este golpe.

-Aproxima-se o momento de seu regresso a Honduras. O senhor não tem temor de ser preso ou assassinado?

-Não tenho nenhum temor, porém tenho precauções e prudência. Quando a vida exige, temos que dar o sentido do esforço e da compensação do esforço. Às vezes o sacrifício é necessário para fazer conquistas sociais e estou disposto a fazer o esforço pela liberdade, pela democracia e pela paz do povo

-O senhor pediu aos meios que o acompanhem na tentativa de regressar ao país. É uma proposta real?

-Pedi que me acompanhem. Vou arriscar tudo e o mundo está arriscando o mesmo com meu regresso. Já falei que se vai haver um magnicídio, o general Romeo Vásquez Velásquez será o responsável por minha morte.

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