O carrasco civil do porão militar
Divulgação Cidadão Boilesen disseca a trajetória de Henning Boilesen, o mais ferrenho financiador da Oban, a operação caça-terrorista montada pelo exército brasileiro |
Alexandre Xavier
De São Paulo
É pena, mas um dos filmes mais importantes do ano entrou em cartaz na cidade de São Paulo em apenas uma sala de cinema. Culpa das engrenagens pouco azeitadas da indústria do entretenimento. Cidadão Boilesen venceu a última edição do festival É Tudo Verdade. E, num país sem memória, mostrou-se um documentário obrigatório.
O filme disseca a trajetória de Henning Boilesen, o mais ferrenho financiador da Oban (a operação caça-terrorista montada pelo exército brasileiro). O dinamarquês Boilesen era o presidente do Grupo Ultra (da Ultragaz) durante a ditadura militar e é dono de uma história sádica surpreendente.
Mais do que contar esta história, Cidadão Boilesen deixa patente com entrevistas importantes, reconstituições inéditas e o resgate de um rico acervo, que a ditadura militar brasileira foi mesmo uma ditadura civil/militar. E que muito dos que a financiaram estão impunes por aí.
Cidadão Boilesen é fruto de 16 anos de trabalho do diretor Chaim Litewski. E com exceção da trilha original e de uma certa patinada na edição na primeira parte do filme, é uma obra coberta de méritos.
Uma curiosidade: FHC, o sociólogo no poleiro
Cidadão Boilesen, veja só, trouxe Fernando Henrique Cardoso de volta às origens. "FHC disse certa vez para esquecerem seu passado como sociólogo; um dos méritos deste filme é que ele resgata o sociólogo FHC" - frase dita por Carlos Eugênio Vaz, um dos militantes presentes na emboscada a Henning Boilesen em 1971, no debate da pré-estréia do filme.
No documentário, porém, você verá numa entrelinha que FHC está mesmo no presente. Após criticar a promíscua relação entre a elite nativa e os militares no poder, ele afirma: "A Oban foi um órgão mais ou menos clandestino". Mais ou menos, meu? Me chamou a atenção que, em meio a depoimentos lúcidos e didáticos, ele conseguiu, como bem diria José Simão, "tucanar" a clandestinidade.
O filme está coberto de boas entrevistas. Não perca.
Em cartaz apenas aqui no Reserva Cultural. (Sinal dos tempos que Lua Nova, o blockbuster teen de vampiros semi-virgens, esteja em cartaz em tudo o quanto é canto?).
Fale com Alexandre Xavier: alexandre_xavier@terra.com.br
Fonte: Terra Magazine
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