Em campanha pela indicação como candidato republicano à presidência dos EUA, o senador John McCain, 72 anos, havia dito que "as relações com os vizinhos do sul devem ser regidas pelo respeito mútuo, não por um desejo imperial ou por demagogia antiamericana". Disse ele ainda que "durante décadas, governos republicanos e democratas trataram a América Latina como um sócio menor e não como vizinhos; como um irmão mais novo, não como igual". E mais: "Vamos trabalhar para evitar que Venezuela e Bolívia tomem o mesmo caminho do fracasso para o qual Fidel levou Cuba. E vamos ampliar e fortalecer nossos laços com países importantes como Brasil, Peru e Chile", concluiu.
Mais recentemente, o senador já consagrado como o candidato por seu partido, chegou a elogiar a política de biocombustíveis defendido pelo Brasil. O chamado "herói de guerra" é ainda um dos críticos mais empedernidos contra Cuba e considera Fidel Castro "um dos mais brutais ditadores da Terra". Fidel, entretanto, já lhe deu resposta à altura, ao declarar em um de seus artigos que "McCain, mentiu sobre a tortura e morte de prisioneiros americanos por interrogadores cubanos durante a Guerra do Vietnã". A afirmação havia sido feita por John McCain em janeiro, durante campanha em Miami, centro de exilados anticastristas. Em editorial publicado na edição da última segunda-feira do jornal Granma, Fidel disse que a acusação "carece de mínima ética" e chamou as afirmações sobre este episódio da biografia do republicano, Faith of My Fathers (A fé de meus pais), de "alucinantes". Sobre a política de guerra infinita de George W. Bush, o senador sustenta: "3.958 americanos mortos na ocupação do Iraque? Vocês ainda não viram nada. A América não tem de se preocupar se vamos ficar no Iraque por mais 50, 100 ou 10 mil anos".
O jornal norte-americano The New York Times desta segunda feira (16) publicou artigo muito esclarecedor que revela como o pensamento estratégico de McCain foi concebido. O texto, sob o título – Raízes das atitudes de McCain em relação à guerra – e o subtítulo – Pontos de vista foram forjados numa prisão de Hanói – dá indicações muito úteis aos que ainda têm dúvidas sobre as idéias deste candidato republicano na atual campanha presidencial nos EUA. McCain escreveu em 1974 um ensaio que foi submetido à direção da Escola de Guerra e que nunca havia sido tornado público. Trata-se de um opúsculo de 40 páginas com uma avaliação do código militar de conduta na prisão e sobre por que alguns de seus colegas prisioneiros de guerra resolveram colaborar com os norte-vietnamitas. O então tenente McCain, da Marinha dos EUA, foi preso pelo exército vietnamita e ficou preso em Hanói durante cinco anos.
O texto de McCain somente foi divulgado depois de um pesquisador ter acionado a Lei de Liberdade de Informação dos EUA e foi cedido ao jornal por Matt Welch – autor da biografia sobre McCain -- que tenta lançar luzes sobre a experiência de vida do senador. Suas elucubrações incluem temas ligados à sua carreira, como o "hábito de fazer as pazes com os inimigos", além de outras opiniões de que o governo e o Exército deveriam se esforçar mais para convencer os eleitores e as tropas americanas sobre os efeitos negativos da experiência no Vietnã no atual debate que se trava em relação ao Iraque. "O principal fator para que um homem seja capaz de manter a credibilidade como prisioneiro de guerra é uma profunda confiança na justeza da política externa de sua Pátria". Agora, o candidato republicano frequentemente se refere aos nove meses que passou pela Escola de Guerra como o período em que cristalizou seu pensamento em relação aos conflitos internacionais, como a guerra do Iraque. Ele se referiu a esta fase como de aprendizagem e formação sobre os porquês e as formas do envolvimento americano no sudeste asiático.
McCain constata no documento divulgado que os prisioneiros americanos que colocavam em questão "a legalidade da guerra" eram os mais suscetíveis "a aceitar a propaganda comunista". Os soldados americanos capturados depois de 1968 provaram ser os mais permeáveis à pressão norte-vietnamita, concluiu ele, pois haviam sido submetidos à opiniões conflitantes que emergiram dos movimentos civis contra a guerra do Vietnã. Para dirimir estas dúvidas McCain recomendou que os militares deveriam ensinar os recrutas não apenas a lutar, mas também conscientizá-los das razões pela qual a política externa dos EUA combatia a expansão do comunismo no sudeste da Ásia. Mesmo assim, McCain alertava que aplicar um programa de ensino desta natureza poderia ser encarado como "brainwashing" (lavagem cerebral) ou "thought control" (controle do pensamento) e despertar desta forma muitas críticas.
De uma maneira ou de outra este texto é um esboço de sua autobiografia política, relembrando estórias da "resistência" que ele e seu co-autor, Mark Salter, iriam depois recontar em suas memórias publicadas em 1999. As teses de 1974, entretanto, também revelam emoções daqueles anos em que McCain foi prisioneiro de guerra, como uma profunda raiva daqueles que ele considerava "colaboradores", um desprezo pelas pessoas que o cumprimentavam por ter sido um prisioneiro de guerra e uma aguda impaciência com o governo norte-americano por ter claudicado em "explicar ao povo, jovens e velhos, sobre fatos elementares e básicos de sua política externa".
Ao ser perguntado pelo articulista do The New York Times, David D. Kirkpatrick, se ainda mantinha os mesmos pontos de vista revelados pelo documento escrito em 1974, McCain respondeu em mensagem por e-mail que ele ainda acredita que o movimento contra a guerra enfraqueceu a moral de certos prisioneiros. Assim como vários outros observadores da cena política americana consideram que as lembranças de McCain alimentam sua atual impaciência com o movimento que se espalha novamente nos EUA contra a guerra no Iraque.
Pedro de Oliveira.
Fonte: blog Vermelho.
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