Apesar de a discussão sobre a segurança pública normalmente pautar as eleições estaduais e federais, é tema que não pode ser relegado a um segundo plano nas eleições municipais. Ainda mais nas grandes cidades, em que a violência ganha contornos traumáticos.
É que a questão da segurança está intimamente ligada ao poder local, este que efetivamente tem a obrigação, e condições, de superar o estado de barbárie ao qual enorme parcela da população brasileira foi atirada.
Não basta ter uma política de direitos humanos advinda da União e dos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. A divulgação dos direitos humanos tem de vir acompanhada de efetiva implementação desses direitos, e esta ponta, a mais importante, depende, para sua realização, da participação dos municípios.
É que os direitos humanos, divididos em gerações, são considerados indivisíveis, ou seja, para que a dignidade da pessoa humana seja preservada, há que se atender a todas as gerações de direitos. A 1ª geração refere-se aos direitos individuais, civis e políticos, a 2ª aos direitos econômicos, sociais e culturais, a 3ª aos direitos de solidariedade e a 4ª geração aos direitos derivados da engenharia genética. A divisão geracional é meramente cronológica, não se podendo falar em prevalência de uma sobre a outra. Ocorre que determinadas gestões governamentais privilegiam os direitos de 1ª geração, com foco nas liberdades individuais, considerando-os de aplicabilidade imediata, e relegam os outros direitos, principalmente os econômicos e sociais, caracterizados pelo direito ao emprego, à moradia, à seguridade social, à educação etc., a um segundo plano, como se pudessem ser eles efetivados progressivamente, ao bel-prazer das prioridades dos que detêm o governo.
A dignidade só é alcançada quando todos os direitos humanos são realizados, e a maioria desses direitos está intimamente ligada à gestão municipal. Qual a relação desse tema com a segurança pública? Total! É justamente a falta de solidariedade, associada a uma má gestão pública, que possibilita o surgimento de uma série de delitos que, ao não serem devidamente punidos, transformam-se rapidamente em grandes delitos, afetando drasticamente a sociabilidade urbana.
Cabe ao município, e isso tem de ser um dos principais itens da pauta das próximas eleições, a implementação, a efetivação dos direitos humanos, mais precisamente nas áreas de saúde, educação, habitação, saneamento, geração de emprego, cultura, lazer e organização dos espaços sociais.
Deve-se buscar, a partir do poder local, dignificar a existência de todos os habitantes da cidade, priorizando, na política pública, a todos os munícipes, o mínimo necessário de qualidade de vida, que resulte em segurança existencial primeiramente, que se transmute em segurança jurídica em um segundo momento. É obrigação do município incentivar o debate democrático (democracia também faz parte do rol de direitos humanos), propiciar ensino público de qualidade que interaja com a cultura local, oferecer sistema de saúde e de infra-estrutura que torne mais digna a vida de seus habitantes e visitantes.
Em suma, segurança não deve ser tratada apenas como caso de polícia. Segurança, principalmente a existencial, advém da conjugação de políticas públicas que devem ser implementadas pelos municípios, e essas políticas públicas nada mais são do que a efetivação dos direitos humanos, que requer realização conjunta de todas as suas gerações.
Fabio Maciel, Advogado.
Fonte: blog Vermelho.
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