Maria Inês Nassif - VALOR
É, sem dúvida, um enorme paradoxo. O PSDB tem, no momento, um nome altamente competitivo para a disputa à Presidência da República, o do governador José Serra (SP) e um outro pré-candidato com reconhecidas qualidades políticas, o governador de Minas, Aécio Neves. Ainda assim, a falta de uma visão estratégica que coloque efetivamente o poder no horizonte do partido deu espaço para que se viabilizasse a candidata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à sua sucessão, a ministra Dilma Rousseff, que, neófita em disputas eleitorais, saiu do traço, no ano passado, para o segundo lugar nas pesquisas divulgadas na semana passada. Mais do que isso, as dissenções resultantes dos conflitos entre projetos pessoais de poder - e também de glória - não favorecem a unidade orgânica da agremiação para uma jornada rumo ao Palácio do Planalto.
O PSDB colocou-se numa camisa de força nesses sete anos de governo Luiz Inácio Lula da Silva. Na onda de uma radicalização da sociedade brasileira, o partido estabeleceu diálogo, cumplicidade e representação de classes sociais com maior renda e escolaridade, e mais conservadoras. A falta de interlocução com outras classes e a ausência de familiaridade com políticas partidárias que lhe permitissem maior inserção em setores populares - relacionamento mais estreito com movimentos populares ou representação no movimento sindical, por exemplo - moldou um discurso exclusivo para as classes mais bem posicionadas na pirâmide social.
O PSDB faz um discurso para esses setores porque deles depende e os representa institucionalmente; reverbera sensos comuns que reforçam, nessa faixa social, uma enorme aversão ao governo e uma cada vez mais profunda distância entre ela - e o próprio partido - e a população mais identificada com as políticas sociais do governo petista.
Essa conversa de mão única moldou um projeto de poder de formato conservador que traz embutido uma enorme dificuldade de se expandir e agregar adesões. É um projeto excludente de outras forças e que tende a arregimentar aliados pelo que tem de negativo - o contra, a aversão, a raiva, o medo, o antilulismo, o antipetismo, o antiesquerdismo, o antiestado etc. -, mais do que pelo positivo - o favorável ao Estado mais enxuto, ao aumento do superávit primário etc.
Nesse formato, o discurso do PSDB passa a ser altamente dependente de um desgaste enorme do governo e do presidente Lula, o principal fiador da candidatura petista, para agregar votos; ou, de outro lado, uma vitória tucana fica dependente de uma figura, de um líder que transcenda o partido preso na camisa de força do discurso negativo e dirigido a uma elite que soma um grupo restrito de eleitores. O discurso excludente requer uma das duas coisas para ter eficiência no convencimento do eleitor. O governador de São Paulo, José Serra, tem cada vez mais assumido o senso comum desse discurso excludente e negativo, mas tem maior ascendência sobre o partido e é mais conhecido pelo eleitor. O governador mineiro, Aécio Neves, tem mais perfil para romper com o discurso restritivo, mas dificilmente conseguirá vencer a maioria serrista dentro do partido e ser o candidato.
O discurso negativo é identificado com o da antiga UDN, mas assumi-lo embute um outro enorme erro estratégico. O discurso udenista tinha uma estratégia de poder clara: era dirigido aos militares, que tinham poder de intervenção pela força no cenário político, e era uma pregação contra uma “esquerdização” do governo. Não era uma ofensiva para conquistar o poder pelo voto - se assim fosse, a UDN de Carlos Lacerda teria que assumir um discurso agregador, não um discurso que favorecesse uma tendência dominante, naquele momento, de cisão da sociedade brasileira.
No caso das eleições de 2010, onde o que está em jogo é uma disputa democrática, uma estratégia de conquista de poder pelo discurso negativo é muito arriscada. Quando um partido favorece a cisão da sociedade visando uma disputa política, é porque aposta que ficará com a maior parte dela e ganhará eleição. Num cenário político onde o presidente tem mais de 80% de aprovação, apostar na cisão da sociedade e num discurso negativo contra uma figura tão popular quanto Lula, é um tiro no escuro.
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