Militares bolivianos se negam a abrir arquivos da ditadura
O alto comando militar da Bolívia rejeitou, nesta quarta (17), uma ordem judicial que autorizava a abertura dos arquivos das ditaduras. O procurador Milton Mendoza, que foi à sede militar central em La Paz para cumprir a determinação da justiça e acessar os documentos, classificou a postura das Forças Armadas como um "despropósito". A recusa pegou desavisado o próprio governo, que havia declarado que os militares cooperariam com as investigações sobre o desaparecimento de pessoas nas ditaduras.
"Fomos informados pela cúpula das Forças Armadas que esta instituição já havia entregado documentação ao Poder Judiciário a respeito e que seguirá fazendo isso nos canais correspondentes, não assim ao Ministério Público", relatou o procurador Mendoza. Ele contou que, na visita ao quartel, só teve acesso a um escritório, no qual lhe comunicaram que a ordem de abrir os arquivos seria objeto de recurso.Mendoza agregou que o Ministério Público tem o propósito de investigar uma série de fatos não esclarecidos durante as ditaduras militares, com base nos arquivos das Forças Armadas. "Para nós (a atitude das Forças Armadas) é um despropósito, porque a ordem judicial era a de que a entrega desta documentação fosse feita ao Ministério Público", argumentou Mendoza a repórteres, revelando que os comandantes militares lhe disseram que só considerariam a possibilidade de enviar alguns documentos a um juiz.
A abertura dos arquivos militares foi ordenada na semana passada pelo juiz Roger Velarde, a pedido do procurador Mendoza e tendo em vista que a nova constituição, vigente desde 2009, ordena a transparência da informação pública.
A ordem tinha sido considerada um "grande passo" por famílias das vítimas das ditaduras e outros ativistas que não esconderam sua decepção após a visita frustrada do promotor à sede militar. Segundo organizações de direitos humanos, cerca de cem pessoas ligadas a movimentos de esquerda estão desaparecidas desde as ditaduras militares que governaram a Bolívia entre 1964 e 1982 e que, em vários casos, coordenaram a repressão com governos de facto da Argentina, Chile e Paraguai.
A recusa das Forças Armadas se contrapõe trambém à já manifestada vontade do presidente da Bolívia, Evo Morales, de facilitar a localização dos restos de líderes, como o socialistas Marcelo Quiroga Santa Cruz, que desapareceu após ser detido por paramilitares durante o golpe de 17 de Julho de 1980, no bojo do governo do então general Luis García Meza que está cumprindo uma pena de 30 anos de prisão pelos crimes cometidos.
Ainda nesta quarta-feira, pouco antes da tentativa frustrada do promotor de acessar os arquivos, o ministro da Defesa, Ruben Saavedra disse que os militares iriam cumprir a ordem "porque eles integram uma instituição democrática ". Após o ocorrido, a defensora pública Rielma Mencias disse que estava "muito incomodada" pela atitude militar, mas evitou anunciar futuros passos no processo.
"Sabemos que há una dívida histórica e as Forças Armadas têm muito a dizer (...) e não teriam por que negar a posibilidade de o promotor revisar os arquivos e identificar elementos que lhe sirvam à investigação", disse Mencias.
Com agências
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