por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile
17 de Maio de 2024
Para sair da lama
Olá, a reconstrução do RS é uma oportunidade do governo mostrar que o caminho do crescimento passa pelo Estado.
.Vento sul. A crise no Rio Grande do Sul ganhou proporções nacionais e abriu riscos e oportunidades. Para o governo, a situação ensejou comparações com os efeitos do furacão Katrina, das jornadas de junho de 2013 e da pandemia de Covid-19. Desde os primeiros dias, para surpresa de ninguém, os bolsonaristas apareceram para perguntar “como posso atrapalhar hoje?”, sem se preocuparem em sabotar os esforços humanitários com fake news desde que estas atingissem o governo. Mas a politização da crise talvez seja tão inevitável quanto necessária. A boa notícia é que Lula tem apontado o caminho de uma maior presença do Estado no processo de reconstrução do Rio Grande do Sul. Em sua terceira visita à região, o presidente anunciou a liberação de um auxílio de R$5.100 em parcela única, a ampliação do Bolsa Família e a construção de casas para os atingidos. Se bem sucedido, o governo poderá fazer do RS uma amostra não só de recuperação, mas de estímulo ao crescimento, quando o Estado tem papel ativo e não age apenas como gerente de contas do Congresso ou do mercado. O problema é que não adianta liberar bilhões se o governo federal não conseguir disputar o destino e o mérito dos esforços, ainda mais com um neoliberal de carteirinha sentado no Palácio Piratini, Eduardo Leite (PSDB), já visivelmente incomodado com o protagonismo de Lula. E é aqui que entra a nomeação de Paulo Pimenta, quadro histórico do PT gaúcho, como ministro extraordinário para cuidar da crise no Rio Grande do Sul. Sua tarefa exigirá uma habilidade política especial para dar conta de uma crise grave, imprevisível e de prazo indeterminado, evitando ao mesmo tempo o risco de uma antecipação do embate eleitoral de 2026.
.Ataque especulativo. Se, na definição de Frei Betto, Lula governa com duas tornozeleiras eletrônicas, o Banco Central e o Congresso, então o carcereiro é o mercado financeiro que não dá um dia de paz ao Planalto. A queda de Jean Paul Prates da presidência da Petrobras já era esperada, não só pela fritura interna nas disputas com Rui Costa, mas também pelo conjunto da obra. À frente da estatal que sempre foi a menina dos olhos e motor de políticas importantes dos governos petistas, Prates foi lento em entregar investimentos e tinha uma posição pró-mercado. A nova presidenta Magda Chambriard deverá jogar peso no fortalecimento da indústria naval nacional e na expansão do parque de refino, numa indicação que foi bem recebida pela Federação Única dos Petroleiros. A Faria Lima não perdoou a troca de Prates por um perfil “nacionalista” e comandou um ataque às ações da estatal, causando em poucas horas uma perda de R$40 bilhões, o valor de uma “Gerdau”, mesmo que a Petrobras apresente saúde superior às suas concorrentes. Outro motivo de alegria para os especuladores foi a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária. Apesar de apontarem o crescimento do emprego e criticarem as previsões pessimistas do mercado, os diretores remanescentes do governo Bolsonaro e o presidente Campos Neto venceram no voto pela diminuição da velocidade da queda de juros. Mais do que isso, sinalizaram que as quedas podem ter acabado. Ruim para quem produz, ótimo para quem especula.
.Negacionismo. Quanto à outra tornozeleira - o Congresso - as relações com o governo parecem mais amigáveis no momento. É verdade que a regulamentação da reforma tributária segue travada devido às indefinições sobre a relatoria. Em compensação, o Planalto chegou a um acordo no tema das desonerações, mitigando a derrota do governo. Mas a boa vontade do Congresso tem se mantido com base numa combinação nada coerente que inclui cooperar com o enfrentamento da crise gaúcha, continuar passando a boiada nas leis ambientais e abocanhar emendas sempre que possível. Assim, se com uma mão o Senado aprovou a suspensão da dívida do Rio Grande do Sul por três anos, conforme proposto por Lula, com a outra, a lei dos agrotóxicos e a lei que retira a plantação de eucaliptos da lista de atividades potencialmente poluidoras foram aprovadas semana passada. E na fila ainda tem um projeto de lei que reduz áreas protegidas da Amazônia a ser apreciado pela CCJ. Tanto poder só se explica pelo tamanho da bancada ruralista, que conta com 309 dos 513 deputados e 50 dos 81 senadores. Um outro efeito da crise é que o orçamento tende a ficar ainda mais apertado. A boa notícia é que por esse motivo a PEC do quinquênio para a magistratura, que poderia ter um impacto de até R$82 bilhões, está perdendo força no Senado. Trocando em miúdos, a única coisa que não muda é a fome do centrão, que derrubou o veto parcial de Lula que suspendia o envio de R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão.
.Terceiro turno. Enquanto o Brasil olha para o Rio Grande do Sul, Brasília não deixa de olhar para o calendário eleitoral. A partir de junho, o Congresso se esvazia, em pautas e em parlamentares, para se concentrar nos pleitos municipais. O cenário mais previsível aponta para a reedição da polarização das duas últimas eleições presidenciais, ainda que, obviamente, os temas e conjunturas locais devem ter maior centralidade. Assim, como a máquina bolsonarista não foi desmontada e continua a todo vapor, em vinte capitais o PL tem pelo menos 7 candidatos competitivos, enquanto o PT, PSB e PSOL têm somados 4. Já o centrão, leva vantagem nas demais. Ganhar o maior número de prefeituras sempre foi a estratégia que levou Valdemar Costa Neto a receber o séquito de Bolsonaro no partido. Agora, o PL quer ser recompensado pelos prejuízos da aventura, inclusive econômicos, como as multas do TSE. Por outro lado, o PL deve usar o resultado das eleições municipais, uma base eleitoral robusta, para convencer os deputados a anistiar Bolsonaro, colocando a exigência como moeda de troca para as eleições da presidência do Congresso no ano que vem. Com um cenário difícil nas capitais, as apostas PT estão voltadas para cidades importantes nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia. E, num cenário polarizado, o maior ativo do partido continua sendo Lula. Segundo a pesquisa Quaest, 33% dos eleitores preferem votar em um candidato "aliado a Lula", contra 22% que preferem um "aliado a Bolsonaro".
.Ponto Final: nossas recomendações.
.Como troca de vegetação nativa por soja pode ter agravado enchentes. Na BBC, a responsabilidade do agronegócio nas enchentes no Rio Grande do Sul.
.Como Brasil Paralelo chegou à vice-prefeitura de Porto Alegre. Na Agência Pública, os laços da maior produtora de conteúdo bolsonarista e negacionista com a administração municipal.
.Não se inquiete com subsídios verdes. Professor de economia política internacional Dani Rodrik mostra o sucesso do investimento do Estado chinês contra as mudanças climáticas.
.De vítimas a ativistas. Na Piauí, a resistência e organização das famílias atingidas em Mariana e Brumadinho contra as grandes mineradoras.
.Maria Júlia tem medo de ser queimada viva pelos ‘homens maus’. Incendiar escolas é estratégia dos grileiros no Pará. Na Sumaúma.
.Caos e desinformação: como a indústria de alimentos usa táticas de extrema direita pra lucrar mais. No Intercept, tudo o que a indústria de alimentos aprendeu com Steve Bannon.
'Foi inimigo número um das elites e do próprio imperador'. O Brasil de Fato relembra a trajetória de Luiz Gama, ícone abolicionista.
.No Labirinto: mãe narra busca de 3 anos por filho. No podcast da Repórter Brasil, a luta de Pureza, que peregrinou por três anos em busca do filho vítima de trabalho escravo.
Contribua com o socorro do MST às famílias atingidas pela enchente do Rio Grande do Sul:
Informações bancárias:
CHAVE PIX: 09352141000148
Banco: 350
Agência: 3001
Conta: 30253-8
CNPJ: 09.352.141/0001-48
Nome: Instituto Brasileiro de Solidariedade
Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
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