sábado, 26 de julho de 2008

ECONOMIA - Capitalismo especulativo e neoliberdade para especular.

CAPITALISMO ESPECULATIVO E NEOLIBERDADE PARA ESPECULAR: COMMODITIES, MOEDAS E HIPOTECAS

O noticiário econômico, já em meados da década passada, trazia críticas do megaespeculador Georges Soros ao excesso de especulação dos fundos hedge, cujo sucesso ajudou a propalar através do seu Quantum Fund, obtendo ganhos espetaculares como a especulação contra a libra esterlina em 1992/3, por ele mesmo narrada em seus livros.

A lógica do especulador é lógica capitalista: ganhar (eu primeiro), mas depois é frear um pouco a especulação, acalmando o mercado e fazendo com que os preços voltem ao ponto de partida (possibilitando novas compras e novos ganhos). Entre parênteses, está o `não-dito`, mas pensado e desejado. (Lacan, vá lá!).

Pois o `não-dito` do especulador, do capitalista e de todo o sistema capitalista - industrial, financeiro e agora o especulativo - este `não-dito`, o ganhar a qualquer preço e quanto mais melhor, este `não-dito` do campo psicológico tem um nome em campo econômico: `Mais-valia`. Marx o formulou. Usá-lo não é marxismo e sim conhecimento do fenômeno.

Apenas especuladores inconscientes do sistema especulativo em que atuam é que buscam, de algum modo, frear o processo especulativo com uma moral pequeno-burguesa: `Estão especulando demais, vamos dar uma freada nisto!`, ao invés de se utilizarem de ferramentas especulativas específicas e concretas, como o aumento de margens às posições especulativas nos diversos mercados, o que já discute o Congresso norte-americano.

O freio acontecerá, não como moral, mas como resposta antitética daquele Congresso, cujos membros se surpreenderam, no último feriado de 4 de Julho, com os reclamos de seus eleitores, em condados diversos, contra o preço, entre outros da gasolina, ultrapassando 4 dólares por galão, e forçando à redução do uso do automóvel.

Na ambiência do capitalismo especulativo o alvo é ganhar, acumulando capital e recolhendo renda e `mais-valia`: numa primeira fase heróica, década de 1990, de fundos contra fundos, cujos excessos foram objeto das críticas de Georges Soros, ícone da área.

Mas nesta segunda fase, mais madura e de maneira natural, os fundos hedge dispararam seus canhões contra as `commodities`. Se todos dependemos delas, consumidores e compradores finais obrigados a comprá-las, - e o `mico` na mão é nosso - não há nenhuma razão objetiva para não elevarem seus preços até onde todos agüentemos sem reação, como a que agora esboça o Congresso americano contra o petróleo e, eventualmente, contra os índices especulativos.

Enquanto o capital especulativo era acumulado nas décadas de 1970 e 1980, a partir dos fundos operando preferencialmente com ações, moedas, juros e ouro, como os de Soros, surgiu `massa crítica` para ampliar tais operações, inicialmente com o surgimento dos índices especulativos e posteriormente com o ingresso destes fundos no ambiente das commodities, como se vê.

A natural emergência e expansão do capitalismo especulativo não seria possível sem o avanço doutrinário do já esquecido e hoje inútil neoliberalismo, pobre em termos de conteúdo, cristalizado no falado `Consenso de Washington` que, em síntese, defendeu a abertura internacional dos mercados de capitais.

O `Consenso de Washington` foi, para o Brasil, o equivalente, a sua época, à abertura dos portos do país aos países amigos, efetuada por D. João VI em 1808. (Até deveríamos correlacioná-las melhor para comemorar em conjunto ambas as efemérides!)

O `Consenso de Washington` é uma rala doutrina em benefício de especuladores: rala, porque os especuladores estão pouco interessados em alguma doutrina e sim no ganho, na `mais-valia`. Em capitalismo só o ganho conta. Perdeu, fora!

O avanço do capitalismo especulativo nesta década e sua tomada de poder na condução dos fatos econômico-financeiros - dividido com complexo industrial militar, ignorado no Brasil - deslocou neoliberalismo e `Consenso de Washington` para o catálogo dos contos de fada.

Fundamental é dinheiro no bolso, venha de onde vier, e agora está vindo da explosão internacional dos preços das commodities, nova bolha, nova imensa `mais-valia` contra os consumidores finais, exploração do homem pelo homem, aguda e cruel, a permanecer na história até que a consciência humana aflore a este respeito, o que timidamente ameaça ocorrer no exemplo da destruição do meio-ambiente.

Faltam passeatas contra o aumento dos preços das commodities nas bolsas internacionais. Onde estão os ativistas?

Como o que conta mesmo é dinheiro no bolso, no mercado imobiliário americano construiu-se igualmente um círculo virtuoso de aumento de preços dos imóveis, por mais de uma década, o que permitia ao comprador da casa própria levantar novos empréstimos, com renovadas hipotecas sobre seu imóvel, a valores crescentes, substituindo uma hipoteca por outra, e assim, através de um crescente endividamento adicional, levantar recursos para fins diversos, inclusive o de especular.

Através dos fundos financeiros internacionais, emitiram-se novos títulos lastreados nestas hipotecas, ampliando-se o financiamento ao mercado imobiliário com recursos privados, um surpreendente programa keynesiano comandado pela iniciativa privada e não mais pelo governo que, na ideologia neoliberal e do `Consenso de Washington` deveria ser mínimo, e cada vez menos se imiscuir no campo econômico, mesmo que os EUA não sejam fiéis a tal axioma.

A espiral dos preços imobiliários nos EUA, aliada aos investimentos especulativos realizados por compradores de casa própria a partir dos recursos levantados nas hipotecas, e somados ambos às dificuldades de pagamento das prestações imobiliárias dos compradores de baixa renda, foram os fatores que fizeram encalhar o programa habitacional privado americano, contabilizando pesadas perdas ainda não encerradas - podendo passar o trilhão de dólares - perdas que agora o complexo financeiro privado tenta repassar ao governo, em nome do social.

Teria sido mais fácil a elaboração de um programa imobiliário para a população de baixa renda americana a partir dos governos central, estaduais e municipais, um programa `keynesiano`, ordenado e organizado, ao invés de, face ao rombo atual, ressuscitar Keynes, discretamente, na base do `agora o governo tem que ajudar!`.

Pois Keynes em campo privado e neoliberal não se cria: aqui é o domínio cruel da `mais-valia`, objetivo único da especulação e do capitalismo especulativo, este novo estágio do capitalismo, ainda não catalogado na academias. Mas super-real.

Paulo Guilherme Hostin Sämy
Fonte: AEPET.

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