Barack Obama em Berlim
Barack Obama assume agora o tom de dar duas no cravo e cinco na ferradura. Mas uma coisa é certa: ele já se tornou um fenômeno de política, o líder nos Estados Unidos mais carismático desde a geração de John Kennedy e Martin Luther King. E os jovens gostam dele.
Flávio Aguiar
Barack Obama falou no Tiergarten (Parque dos Animais Silvestres, ou Parque da Fauna), em Berlim. Antes houve uma polêmica, pois a primeira hipótese é de que ele falaria na Brandenburgen Tor, o Portão de Brandemburgo, portal entre as antigas duas Berlins. Os partidos conservadores sentiram-se ofendidos, pois aquilo lhes parecia uma heresia, afinal, era um mero candidato, não um presidente como Kennedy ou Reagan, e ainda, era um candidato... (não, não vou escrever a heresia que pensei). Em todo caso, isso é ilustrativo: a esquerda hesita, tergiversa, polui, turva, sobre o significado da candidatura de Obama. A direita, ao contrário, sabe muito bem que tem que apoiar ou louvar o nome de McCain, e desdenhar o de Obama. Repito: o significado da candidatura. Quem achar que Obama é de esquerda labuta em erro, tanto quanto quem achar que sua candidatura não significa grande coisa porque “é tudo farinha do mesmo saco”.
No lugar onde Obama falou, junto à coluna de um Anjo da Vitória (não me lembro muito bem que vitória, mas alguma), cabem milhões de pessoas. Mas a polícia de Berlim (talvez a da Alemanha) não está preparada para essas coisas. Esperavam-se 100 mil pessoas. Compareceram 250 mil, algo do tamanho do 5° Fórum Social Mundial em Porto Alegre, o maior de todos. A polícia tinha literalmente engradado o local com passagens, cercas de ferro, controles, etc. O resultado foi desastroso: em alguns momentos, sobretudo na saída, as pessoas sentiram-se confinadas, houve princípios de pânico. Durante toda a manifestação houve empurra-empurra e mal-estar. Tudo poderia ser evitado se o esquema de segurança fosse menos rígido e mais maleável, pois o plano para 100 mil não servia para os 250 mil.
Não que não devesse haver segurança rigorosa. Eu, cá com os meus botões, tenho certeza de que alguém, ou alguéns, nos Estados Unidos, estão tramando a morte de Obama. Terão sucesso? Não sei, os tempos mudaram, a Guerra Fria é de outra natureza, a direita norte-americana hoje prefere atuar na frente judiciária e da organização eleitoral, como ficou comprovado pelo golpe de estado que “elegeu” Bush Filho para seu primeiro mandato. Mas ninguém vai me convencer de que a trama não existe, em algum desvão de alguma conspirata do tipo da que assassinou os Kennedy, John e Robert, e Martin Luther.
Obama, que agora busca inclinar seus discursos para começar ganhando apoios conservadores, falou primeiro do heroísmo anti-comunista de Berlim, bem, pelo menos da parte ocidental. Falou da ponte-aérea de quando os soviéticos bloquearam o acesso por terra à cidade. Enfim, fez um elogio de Berlim como um dos marcos da defesa da liberdade em estilo capitalista. Conseguiu agradar os conservadores, aliás, porque é verdade que Berlim acabou se tornando uma ilha especial de liberdade num mar de Alemanha Oriental autoritária. Uma certa liberdade: houve muita repressão contra a esquerda em Berlim Ocidental, onde, aliás, nasceu, em 1968, o movimento das revoltas estudantis que culminaram com o maio de 1968 n França e no resto do mundo.
Depois, Barack entrou no momento de seu discurso em que sai pela meia-esquerda. Falou dos preconceitos religiosos, das desigualdades, da necessidade de acabar com as armas nucleares, do racismo, tudo aquilo que certamente 250 mil das 250 mil pessoas que lá estavam gostavam – e precisavam – ouvir. Ou seja, o discurso de Barack Obama está adquirindo uma certa forma de fôrma: ele entra pela meia-direita e sai pela meia-esquerda.
Esperemos que, quem sabe, seu mandato possa ter esse formato.
Uma observação: novamente apareceu na multidão um retrato (de que voltarei a falar) muito peculiar da situação alemã, senão européia. Como em Rostok, no ano passado, quando das manifestações contra a reunião do G-8 em Heiligendam, dos 250 mil, certamente mais de 150 mil eram jovens de até 30 anos, e certamente mais de 50 mil eram jovens (os eternos) de 60 anos ou mais, os às vezes louvados, às vezes desprezados, às vezes odiados, às vezes incensados “soixantehuiteurs”, os de 68. Há, na Alemanha, uma “geração perdida”, entre os 30 e os 60 anos, cujo perfil conservador é evidente. Mas ela está fenecendo. A juventude que aí vem é de melhor índole. E adora Obama.
Fonte: Agência Carta Maior.
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