Por Marcelo Salles, no blog Fazendo Media
Há outros. Paulo Henrique Amorim publica matéria com algumas páginas do relatório da Polícia Federal que indicam contatos freqüentes de outros jornalistas com o especulador Naji Nahas, preso junto com Dantas na Operação Satiagraha: Vera Brandimarte (Valor Econômico), Paulo Andreoli e Tomaz Talman (revista Época), Elvira Lobato e Guilherme Barros (Folha de S.Paulo), Jony Saad (Band) e Roberto D´Ávila. Este último, segundo a PF, teria recebido R$ 50 mil para divulgação de opinião favorável ao Grupo Opportunity. Fato que demonstra “a capacidade da organização criminosa em manipular as notícias que são divulgadas pela mídia” (página 226).
Importante: manter contato com especuladores, bandidos, criminosos e ladrões não é crime, sobretudo em se tratando de jornalistas, que estão atrás de informações. Crime é vender espaço editorial sem avisar ao público que se trata de propaganda. Neste sentido, o delegado Protógenes assinala: “é comum os jornalistas acima citados assinarem matérias favoráveis aos interesses do Grupo Opportunity, principalmente à pessoa de Daniel Dantas”.
Este motivo seria suficiente para que o conselho da categoria abrisse processo de expulsão e cassação do diploma dos referidos jornalistas, caso existisse tal entidade. No Brasil, se um médico comete um erro ele pode ser impedido de praticar a profissão. O mesmo ocorre em outras profissões, mas não no jornalismo.
Da última vez que se tentou criar um conselho, em 2005, as entidades patronais e as corporações de mídia torpedearam a proposta até derrubá-la. Lembro da Zileide Silva, da TV Globo, levantar um troféu Comunique-se e afirmar, a plenos pulmões: “Nós não precisamos de um Conselho; nós já sabemos fazer jornalismo”.
Não discuto a competência do jornalismo praticado por Zileide, mas é bom frisar que nosso entendimento de jornalismo é outro. A começar pelo juramento profissional: ''A Comunicação é uma missão social. Por isto, juro respeitar o público, combatendo todas as formas de preconceito e discriminação, valorizando os seres humanos em sua singularidade e na luta por sua dignidade''.
Esse não é o jornalismo da Globo, que esteve ao lado da ditadura política e hoje serve à ditadura financeira que deixa 72 milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar – o eufemismo que o IBGE encontrou para a fome –, milhões de desempregados e outros tantos sem acesso à Saúde e à Educação de qualidade.
Não nos causa surpresa a ligação das corporações de mídia com o esquema de Daniel Dantas. Como temos insistido nos cinco anos de Fazendo Media, a mídia, hoje, é a instituição com maior capacidade de produzir e reproduzir subjetividades, ou seja, de determinar formas de agir, sentir, pensar e viver de cada indivíduo e, por conseguinte, de toda a sociedade.
Não por outro motivo organizações criminosas como a liderada por Daniel Dantas, ou governos terroristas como o dos EUA, procuram apoio na mídia. Eles sabem que para tocar seus negócios e suas guerras precisam de alguma aprovação popular. Quando o delegado da Polícia Federal cita as revistas Veja e IstoÉ Dinheiro, ele aponta não apenas para o carro-chefe da editora Abril e para a publicação da editora Três.
O relatório de Protógenes encaminhado ao juiz Fausto Martin de Sanctis enquadra todas as corporações de mídia, posto que o modus operandi desses veículos é exatamente o mesmo, e coincide com o das empresas capitalistas que elogiam: o lucro acima de tudo, inclusive da vida. O fato de um ou outro veículo deixar rastro importa menos que sua orientação editorial, esta sim determinante para a manutenção de um sistema que permite — e se reproduz com — a existência de máfias privadas no controle da administração pública.
Daí a importância da construção de veículos de comunicação comprometidos com o interesse público, que sejam capazes de elaborar uma narrativa própria e que possam respeitar o juramento profissional dos jornalistas. Só assim poderemos entrar na disputa das representações com alguma possibilidade de trazer a hegemonia para o lado daqueles que defendem a vida acima de tudo, inclusive do lucro.
Fonte: Blog Vermelho.
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