quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

ECONOMIA - Dados econômicos para análise de conjuntura.



Dados econômicos para a análise da conjuntura de 2010
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Emilio Gennari

Adital

Quadro Internacional:

A pergunta central que todos os economistas estão se colocando neste primeiro trimestre de 2010 é: Já saímos da crise econômica que varreu o planeta a partir de julho de 2007?

Diante das incertezas que ainda pairam sobre o futuro das principais economias do sistema capitalista mundial, bancos centrais e governos do mundo inteiro comemoram de pé qualquer sinal que aponte em direção ao crescimento. Sendo assim, para avaliar o real estado das relações econômicas, faz-se necessário usar como termo de comparação não os períodos imediatamente anteriores aos considerados pelos dados veiculados na mídia, mas sim um prazo mais longo. De fato, após uma queda prolongada da atividade econômica mundial, a base de dados da qual se parte é muito baixa e tende a mostrar um crescimento aparentemente mais forte e mais sólido do que realmente está em curso.

Uma amostra da importância de quanto acabamos de afirmar pode ser verificada na comparação entre a variação do Produto Interno Bruto de 2009 e as projeções para 2010 produzidas pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) de acordo com a tabela que segue:1

Países

Variação do PIB em 2009

Projeção do PIB em 2010

Estados Unidos - 2,5%

2,5%

Japão

-5,3%

1,8%

Alemanha

-4,9%

1,4%

México

-8,6%

2,7%

OCDE2

-3,5%

1,9%


Ou seja, em 2010, se nada der errado com a economia mundial, devemos registrar sim um período de crescimento, mas este não vai conseguir repor o patamar de produção da riqueza e o nível de emprego registrados em 2008. Nem mesmo a economia dos EUA vai escapar desta situação, pois a queda de 2,5% sobre o PIB de 2008 não será reposta pelo crescimento de 2,5% em 2010, pelo simples fato desta porcentagem positiva se aplicar a um valor menor daquele à qual foi subtraída em 2009. Em meados de janeiro, a OCDE divulgou um relatório pelo qual o comércio mundial sofreu uma contração de 13% em 2009 e, para 2010, a projeção de crescimento das trocas comerciais não passaria de 6%. Mais uma vez, a boa notícia do aumento do comercio, sinal de reaquecimento da economia, é ofuscada pelo fato deste repor menos da metade do que foi perdido ao longo de um ano. A própria UNCTAD (Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento, pela sigla em inglês), adverte que só em 2011 o PIB global deve conseguir voltar aos níveis de 2008.

Trocado em miúdos, está descartada a saída em V, ou seja, aquela pela qual, após atingir o fundo do poço em função de uma crise, a economia começa a crescer de forma consistente e sustentada recuperando em pouco tempo o terreno perdido.

Sinais preocupantes:

1. A crise ampliou as dívidas das instituições financeiras em nível mundial, deixando o sistema de crédito na corda bamba. Pelos balanços atuais, até o final de 2012, os bancos do mundo inteiro devem somar cerca de US$ 7 trilhões em dívidas acumuladas.

2. Em dezembro de 2009, o mundo assistiu a uma verdadeira corrida ao ouro. Considerado uma espécie de porto seguro por encerrar em si grande concentração do valor-trabalho (o que não ocorre com as moedas de papel que apenas representam o valor acumulado no ouro do Tesouro Nacional e no PIB), o grama do precioso metal chegou ao recorde histórico de US$ 1.226 a Onça Troy (que equivale a 31,1 gramas). Este patamar desceu para US$ 1.136,5 no dia 06 de janeiro, e encerra o mês em US$ 1088. Se, de um lado, a queda das cotações representa um alívio em termos de perspectivas futuras, de outro, o patamar atual ainda representa o dobro do valor do ouro antes da eclosão da crise. Acompanhar o desempenho da Onça Troy no mercado internacional vai ajudar a medir o grau de desconfiança dos investidores na solidez do sistema financeiro (quanto maior o valor do ouro, maior a desconfiança) e, de conseqüência, da recuperação econômica em curso.

3. De 1º de novembro 2008 a 31 de outubro 2009, os governos do mundo inteiro injetaram US$ 14 trilhões em empréstimos, isenções fiscais, compra de hipotecas, incentivos à produção e ao consumo na tentativa de frear ao máximo o ritmo de queda da economia mundial. Apesar desta quantia representar nada menos do que 25% do PIB mundial, há um consenso entre os economistas de que as intervenções extraordinárias dos Estados não trouxeram de volta a saúde da economia mundial, mas apenas evitaram a sua morte.

4. O aumento dos gastos dos Estados, frente a uma arrecadação em queda em função da crise, elevou tanto o déficit público como a dívida bruta dos principais países3. Como a crise ainda faz sentir seus efeitos, a projeção para 2010 aponta para um ulterior aumento deste endividamento, conforme mostrado pela tabela abaixo que expressa o grau de endividamento bruto como porcentagem do PIB de cada país:4

País

Porcentagem do PIB de 2009

Porcentagem do PIB de 2010

Rússia 7,2 % 7,7%
Austrália 16,9% 22,7%
China 20,2% 22,2%
Brasil 68,5% 65,9%
Reino Unido 68,7% 81,7%
França 78,0% 85,4%
Canadá 78,2% 79,3%
Alemanha 78,7% 84,5%
Índia 84,7% 85,9%
Estados Unidos 84,8% 93,6%
Itália 115,8% 120,1%
Japão 218,6% 227%

Como podemos observar, os governos dos principais países capitalistas vão aumentar seu endividamento bruto colocando as finanças públicas em patamar dificilmente sustentável no longo prazo. De acordo com o Banco Central Europeu, nos 16 países que adotaram o Euro como moeda nacional, em 2009, a queda da receita e o aumento dos gastos públicos em função da crise elevaram o déficit público anual a 6,7% do PIB, quando o máximo aceito pelo acordo que criou a moeda única é de 3% do PIB. A projeção para 2010, é que o déficit chegue a 7% justamente para continuar sustentando o frágil crescimento da economia. Mas esta medida aparentemente saudável coloca em dúvida a possibilidade de alguns países do Euro (como Grécia, Hungria, Estônia e Letônia) conseguir honrar em médio prazo os compromissos de suas dívidas internas.

No caso dos Estados Unidos, as coisas não estão melhores. De fato, em 2009, o governo amarga um déficit público de US$ 1,414 trilhões (um trilhão e 414 bilhões) e, para 2010, a previsão é de que, apesar de uma eventual redução dos gastos públicos não relacionados à segurança, se mantenha em US$ 1,556 trilhões, o que corresponde a 10,6% do PIB. Pelos dados disponíveis, somente em 2011, graças à retomada da atividade econômica, ao aumento da arrecadação e ao corte de gastos, o montante deveria cair para US$ 980 bilhões.

E aqui há dois problemas: o primeiro está no fato de que os títulos da dívida pública de todos os países são lastreados na confiança que vem da arrecadação, cuja base, por sua vez, é o crescimento da economia. Essa confiança se mantém ou se restabelece na medida em que as perspectivas de recuperação econômica começam a se concretizar e apontam para a sustentabilidade da capacidade de pagamento tanto dos juros, como dos títulos da dívida emitidos. O segundo problema é simples: neste momento, se os governos optarem por medidas que consolidam o orçamento (corte de incentivos/isenções/gastos governamentais e possível elevação dos impostos), correm o risco de estrangular a fase de crescimento ainda incipiente, mas, se deixarem correr solto e o ritmo de recuperação for lento demais, cresce a possibilidade de moratória e/ou de um descontrole da inflação. Nesta situação nada confortável, é possível que, a fim de evitar/conter pressões sociais, os governos apostem mais em aumentar o nível de endividamento do que em apertar o controle das finanças públicas, mas isso ampliará seriamente o peso e os problemas gerados pelo déficit público nas políticas governamentais a serem implementadas a partir de 2011.

Devido à gravidade da situação e ao fato dos principais países do sistema lançarem mão dos mesmos meios para sair da crise e todos terem em seus caixas moedas internacionais ou títulos da dívida dos EUA às vezes em quantidade elevada (como é o caso China que detém cerca de US$ 2,4 trilhões de dólares em notas e US$ 800 bilhões em títulos), não devemos esperar movimentos especulativos ou posturas internacionais que fariam precipitar a situação levando a economia mundial a uma nova fase de queda da produção. Isso, de fato, seria um verdadeiro "tiro no pé" nos governos que optarem, por exemplo, por vender grandes quantidades de títulos da dívida dos EUA ou de dólares no mercado internacional.

5. De acordo com a OIT (Organização Internacional do Trabalho), só em 2009, a crise eliminou cerca de 27 milhões de postos de trabalho, o que eleva o número oficial de desempregados reconhecidos como tais pelos governos do mundo inteiro para 212 milhões de pessoas. Ao longo de 2010, a perspectiva é a de que as economias dos países desenvolvidos eliminem outros 3 milhões de postos. Isso se deve não só ao enxugamento de custos como ao processo de elevação da produtividade do trabalho e ulterior arrocho salarial sem os quais as empresas não obtêm retornos satisfatórios para seus investimentos. Para os capitalistas, a equação é simples: sem recuperação das taxas de lucro (via elevação da produtividade, redução dos gastos salariais e incentivos do Estado), não há novos investimentos e sem novos investimentos o crescimento econômico é pífio ou tende à estagnação. Em outras palavras, nenhuma saída da crise é vista como possível sem um drástico aprofundamento da exploração dos trabalhadores, peça-chave da recuperação das margens de lucro empresarial que, por sua vez, são a razão de ser de qualquer empreendimento capitalista. Neste contexto, o subsídio de US$ 5.000 dólares prometido por Obama para cada nova contratação que amplie o quadro de funcionários (e que, no máximo, pode chegar a US$ 500.000 por empresa), deve ter pouco efeito no nível de emprego, pois só se contrata mais gente quando há uma demanda sustentada pelos produtos oferecidos e não simplesmente porque se recebem fundos do Estado. A acumulação de estoques não vendidos, de fato, acabaria representando um custo maior do que a entrada dos subsídios e empurraria para baixo a recuperação das margens de lucro.

No que diz respeito aos índices de pobreza, a OIT reconhece que, em 2009, o número de pessoas que vivem na miséria (ou seja, com menos de US$ 1,25 por dia) aumentou em 215 milhões, passando de 633 milhões de pessoas em 2008 para 848 milhões. Ainda que haja uma recuperação do emprego nos países emergentes, em 2010, o contingente de miseráveis não deve conhecer uma diminuição significativa.

6. Vista como termômetro da recuperação mundial, a Bolsa de Valores tem assumido o papel típico do cassino ao qual voltam os jogadores que perderam ingentes quantias na tentativa de recuperar rapidamente parte dos recursos que viram evaporar na brusca desvalorização das ações em 2008. Isso significa que não há nenhuma relação material entre a perspectiva de lucro das empresas e a valorização de suas ações, mas sim um jogo especulativo que, na maior parte do tempo, permanece descolado da economia real e aproveita dos recursos obtidos, inclusive, junto ao Estado, para apostar na recuperação do que foi perdido.

A debilidade deste processo é revelada toda vez que um evento econômico coloca sob suspeita a solidez do crescimento da economia mundial provocando uma reaproximação mínima entre o que as empresas realmente valem e os níveis em que suas ações são negociadas, e, de conseqüência, uma queda no desempenho da bolsa e uma desvalorização das próprias ações. Neste primeiro quadrimestre de 2010, devemos esperar muita volatilidade. Ou seja, movimentos especulativos e de realização de lucros que, ora levam a uma valorização das ações, ora a uma queda brusca em função das fortes vendas para embolsar os lucros oriundos da diferença entre o preço da compra inicial e aquele a que as próprias ações chegaram no momento da venda e que são vistos como ameaçados pelo caminhar ainda titubeante da economia mundial.

7. A principal economia do planeta, a dos Estados Unidos, continua cambaleando. Ainda que os dados do último trimestre de 2010 não tenham sido divulgados, há um consenso quanto ao fato de que a deflação continua (e a queda dos preços é o inimigo número um da recuperação das margens de lucro) e que as hipotecas das casas (que chegam a US$ 11 trilhões) somadas às do comércio (por volta dos US$ 3,5 trilhões) continuam sendo um problema grave para os balanços das instituições financeiras. Não por acaso, em dezembro de 2009, o próprio banco central declarava que 552 bancos (entre pequenos e médios) ainda corriam o risco de fechar as portas por problemas de caixa.

Outros dados pouco animadores: 1) Em 2009, o preço médio das moradias caiu 7,3% em média sobre 2008 e os índices médios das vendas mensais de casas permanecem abaixo do esperado neste início de 2010. Isso faz com que o setor de construção civil, grande empregador de força de trabalho, comece o ano em situação de estagnação e à espera de que os investimentos governamentais em infra-estrutura coloquem em movimento as máquinas de suas empresas; 2) O crescimento da economia no terceiro e quarto trimestre de 2009 é fruto, basicamente, da elevação dos gastos familiares (empurrada sobretudo pelos programas governamentais) e da intervenção do Estado. Na contramão disso, o desemprego oficial na casa dos 10,3% (com tendência a aumentar nos próximos quatro meses e devendo fechar 2010 em 9,8%) e o endividamento médio das famílias em cerca de 119% de sua renda mensal (ou seja, ao receber o salário, o estadunidense médio já está devendo um mês inteiro e seis dias do mês seguinte) tornam difícil imaginar que o consumo pessoal/familiar sirva para algo mais do que manter freado o ritmo de queda da atividade econômica até que os investimentos do Estado e das empresas sustentem uma nova fase de crescimento; 3) Parte significativa dos resultados positivos nos balanços de várias empresas vem do enxugamento de pessoal, da redução dos estoques e dos gastos trabalhistas ou de outros cortes administrativos e operacionais. Grande parte da frota, armazéns e da capacidade de produção instalada continua ociosa e isso faz com que as empresas relutem em fazer novos investimentos em bens de produção, os únicos capazes de gerar condições suficientes para sustentar uma nova fase de crescimento econômico.

Entre os elementos positivos, devemos registrar um aumento dos preços das commodities em nível mundial, o que indica uma recuperação na demanda das matérias-primas na base da produção da riqueza. O problema aqui é o ritmo em que estão se elevando os preços destes elementos indispensáveis da produção em função da quantidade de equipamentos desativados pela crise e da postura empresarial que vê no nível de demanda atual uma chance para recuperar parte dos lucros perdidos nos últimos 18 meses. Ou seja, se, de um lado, o aumento da demanda de commodities sinaliza um processo de recuperação da economia mundial, de outro, o fato destas matérias-primas terem seus preços aumentados pela escassez da oferta pode levar a um processo inflacionário e a uma redução das margens de lucro, ocasionando uma queda do ritmo de recuperação da economia mundial.

Por tudo o que dissemos, a possibilidade de a economia mundial mergulhar novamente numa fase de recessão após um breve período de estabilização e fraco crescimento não pode ser descartada, mas, neste momento, é menos provável do que uma recuperação em L. Ou seja, a economia mundial pára de cair, mas, até o final de 2010, sua recuperação é lenta, difícil e sujeita a sustos de vários tipos, assim como lenta, difícil e sujeita a sustos é a decolagem de um avião bimotor que só tem uma turbina disponível para iniciar o seu novo vôo. Sair do chão é possível, mas ganhar rapidamente a altitude necessária para o conforto e a segurança dos passageiros..., aí são outros quinhentos.

Dito isso, vamos analisar qual é o impacto da realidade mundial na economia do Brasil.
Na entrega do bastão de um ano para outro, constatamos:

1. Em 2009, a crise econômica mundial desferrou um duro golpe no comércio exterior com o Brasil. De acordo com os dados disponíveis, o desempenho das exportações de 2009 em relação a 2008 registrou uma queda significativa:

Países Desempenho das exportações em relação a 2008
União Européia - 25,8%
América Latina e Caribe - 32,1%
Estados Unidos - 42,4%
Europa Oriental -38,6%
África - 13,5%
Oriente Médio - 5,1%
Ásia 5,9%
Demais países -17,9%

O saldo positivo da balança comercial registrado em 2009 (um superávit de US$ 24,6 bilhões), superior ao que havia sido previsto no final de 2008 (US$ 17 bilhões), se deve, sobretudo, à queda de 22% nas exportações e de 25% nas importações. Este resultado, obviamente, influiu negativamente no desempenho do setor exportador que representa cerca de 18,5% do PIB. De fato, em 2009, o país exportou o equivalente a US$ 152 bilhões (dos quais, só 15% em manufaturados de alto valor agregado e o restante 85% em insumos e semimanufaturados) contra US$ 198 bilhões registrados em 2008. A perspectiva para 2010 é que, mantido o desempenho atual da economia mundial, as exportações brasileiras cheguem a US$168 bilhões com um superávit da balança comercial na casa dos US$ 15 bilhões. Esta redução nas previsões do superávit se deve ao esperado aumento das importações, parte das quais é de matérias-primas e peças a serem montadas em produtos destinados à exportação.

Em suma, podemos afirmar que, diante do quadro acima, o setor exportador brasileiro vai continuar com o freio de mão puxado, ainda que com perspectivas melhores das que se desenhavam no início do ano passado.

2. Em 2009, o investimento em capital fixo (que mede o que se investe na construção civil, em máquinas e equipamentos) ficou em 16,9% do PIB. Em 2010, se a economia mundial fizer o dever de casa e forem mantidos todos os investimentos previstos, o capital fixo deve fechar o ano em 18,6% do PIB, bem próximo dos 19% registrados em 2008. No momento, a indústria demonstra bons níveis médios de recuperação da sua atividade, mas deve ser só em maio-junho deste ano que a utilização de sua capacidade instalada atingirá os marcos de 2008. Ou seja, as coisas estão indo bem, mas ainda falta para recuperar o terreno perdido em função dos efeitos da crise e sustentar um longo período de crescimento. Ao que tudo indica, se a economia mundial mantiver a tendência de recuperação nos patamares atuais, podemos dizer que a perspectiva de um crescimento do PIB na casa dos 4,5 a 5% e geração de cerca de dois milhões de empregos deve ser considerada realista. No caso menos provável de um mergulho numa nova de recessão, devemos esperar um crescimento do PIB por volta de 3,0%. Isso explica o otimismo registrado pelo índice de Confiança do Empresariado Industrial na pesquisa de janeiro da Confederação Nacional da Indústria e que atingiu os 68,7 pontos, o maior resultado de toda a série histórica iniciada em 1999.

3. No que diz respeito ao Investimento Estrangeiro Direto (o dinheiro que entra na economia pela compra/construção de empresas) fechou 2009 em US$ 25,94 bilhões contra US$ 45 bilhões em 2008. Ao longo de 2010, o Brasil deve se beneficiar do aumento de fluxos de capitais a procura de investimentos em países emergentes e que, pelos dados apresentados no Fórum Econômico Mundial, deve atingir os US$ 722 bilhões, 66% a mais em relação a 2009. Pelas perspectivas atuais, o Banco Central prevê um Investimento Direto na casa dos US$ 45 bilhões, o que representa um retorno aos patamares de 2008.

4. O ano de 2009 se encerra com um nível de reservas cambiais (dólares em poder do Banco Central) em US$ 239 bilhões, uma situação confortável em relação ao passado e que permite enfrentar sem grandes sustos os sobressaltos da economia mundial em 2010. Somando o saldo positivo dos dólares investidos em bolsa de valores e em títulos de renda fixa (US$ 18,8 bilhões) por investidores estrangeiros, o que foi empregado na compra de empresas e o superávit da balança comercial, menos o que saiu em remessas de lucros e dividendos (US$ 25,21 bilhões), viagens ao exterior e compras via internet (US$ 5,6 bilhões), juros da dívida externa (US$ 9,06 bilhões), gastos com transporte, seguros, despesas governamentais (US$ 13 bilhões) e outros itens menores, o Brasil fechou 2009 com um superávit no fluxo total de dólares de US$ 28,73 bilhões. Isso explica a valorização do Real registrada no final do ano.

Em 2010, porém, a situação não deve ser tão rósea. De fato, é esperado um aumento nas remessas de lucro (US$ 30,2 bilhões), nas viagens internacionais e nas compras via internet (US$ 7,0 bilhões), nos gastos com transportes, seguros e despesas governamentais (US$ 14,1 bilhões), além de uma redução no superávit da balança comercial (US$ 15 bilhões). A diferença deve ser compensada pela entrada de Investimentos especulativos (bolsa de valores e fundos de renda fixa) e diretos, mas não com um superávit total tão confortável como o que foi consolidado em 2009. Esta perspectiva já alimenta o atual processo de desvalorização da nossa moeda (8,15% em um mês) e a expectativa de que o câmbio, em dezembro de 2010, chegue a R$ 2,00 por cada dólar. Isso melhoraria a possibilidade de aumentar as exportações, mas a elevação do câmbio reduziria o papel das importações no controle da inflação do país.

5. Em 2009, a dívida pública (soma das dívidas interna e externa do setor público) chegou a R$ 1,497 trilhões (sendo R$ 96,97 bilhões de dívida externa e os restantes R$ 1,4 trilhões de dívida interna), o que corresponde a 47,6% do PIB e eleva em R$ 104 bilhões o patamar de endividamento registrado em 2008. Isso se deve, principalmente, à uma queda do superávit primário (o resultado da diferença entre tudo o que é arrecadado e tudo o que é gasto pelo governo federal antes do pagamento dos juros) de R$ 106,4 bilhões em 2008 (3,54% do PIB) para R$ 64,5 bilhões em 2009 (2,04% do PIB) devido às isenções e demais políticas de intervenção na economia que se fizeram necessárias para frear os efeitos da crise econômica mundial, da elevação dos desembolsos com a previdência e com o pagamento do funcionalismo. Para 2010, a soma das dívidas interna e externa do setor público deve ficar entre R$ 1,6 e R$ 1,73 trilhões em função não só dos gastos em investimentos e manutenção da máquina pública, mas também da elevação dos juros a serem pagos sobre a dívida interna (que, em 2009, ficaram em R$ 169 bilhões) e das dificuldades em atingir um superávit primário das contas públicas consistente em ano de eleições gerais. Diante do crescimento do PIB projetado para 2010, esta situação não deve criar grandes problemas para o fim do segundo mandato do governo Lula, mas faz crescer os pontos de interrogação em relação ao futuro, tanto no que diz respeito à capacidade de investimento, como às garantias do país continuar honrando os compromissos com os investidores nacionais e estrangeiros.

6. De acordo com os dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2009, a renda média do trabalhador brasileiro chegou ao seu patamar mais alto dos últimos sete anos (2003 a 2009): R$ 1.340. A contas feitas, isso representa um aumento de 14,3% sobre a renda média do período anterior (1996 a 2002) e foi obtido, sobretudo, graças à elevação do salário mínimo, mas não a uma consistente redução da desigualdade social. Prova disso é que, de 2003 a 2009, a economia cresceu nada menos do que 27,88% (isso se considerarmos como 0% o crescimento de 2009), quase o dobro do crescimento do salário médio. Isso se deve a vários fatores: o encolhimento da faixa de renda entre três e cinco salários mínimos paralelamente ao crescimento dos que recebem até três salários mínimos, ao fato das isenções de impostos, das políticas de financiamento e da expansão do crédito terem beneficiados mais a manutenção do patamar de lucros empresariais do que a geração de empregos e às dificuldades de introduzir políticas de geração de renda nos bolsões de pobreza das grandes cidades. Para avaliar melhor esta situação, precisaríamos de dados atualizados relativos à participação da remuneração dos trabalhadores/as no PIB. No ano 2000, dita participação estava em 40,5% do PIB e caiu progressivamente para 39,3% em 2004 (último dado disponível nas publicações do IBGE). O fato de que, entre 2003 e 2008, tenha havido uma queda de 65,3% no número de pessoas em situação de miséria e pobreza extrema (até meio salário mínimo de renda per capita por mês) não significa que a participação final dos salários no PIB tenha se alterado de forma significativa graças às políticas atuais, mesmo porque o maior poder de compra dos assalariados não veio dos aumentos reais de salário, mas sim da expansão do crédito, da ampliação dos prazos de pagamento e da redução dos juros. Haja vista que, em 2007, o total de empréstimos a pessoas físicas representava 31,6% do PIB, passando a 35,6% no ano seguinte e fechando novembro de 2009 na marca dos 39,3% do PIB, o que representa um salto de 24,36%, índice bem superior ao do aumento do salário médio.

Em breves palavras, não será pelo simples caminho do crescimento econômico e dos patamares atuais de distribuição de renda que chegaremos a uma redução consistente das desigualdades sociais nos próximos anos. Trocado em miúdos, para os trabalhadores assalariados, não há dúvidas de que um crescimento do PIB na casa dos 5% ao ano significa uma geração de empregos superior ao número de pessoas que irão entrar oficialmente na População Economicamente Ativa (por volta das 1.450.000 pessoas em 2010), melhores possibilidades de arranjar emprego e de satisfazer suas necessidades de consumo, mas o máximo que isso pode oferecer à classe é ainda uma sensação de satisfação proporcional a uma demorada lambida do lado mais cumprido do tijolo de rapadura da riqueza nacional. O gostinho de doce é, inegavelmente, mais intenso, mas longe de reduzir com uma mordida as profundas diferenças na distribuição da riqueza nacional.

Notas:

1 Os dados da tabela foram divulgados em 20 de novembro de 2009. Na medida em que os institutos de pesquisa de cada país forem fechando os números oficiais do PIB do ano passado e avaliando o ritmo do crescimento econômico em curso, estes números devem sofrer mudanças.
2 A OCDE é um fórum econômico que reúne 30 países: Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, República Tcheca, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Coréia do Sul, Luxemburgo, México, Holanda, Nova Zelândia, Noruega, Polônia, Portugal, República Eslovaca, Espanha, Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido e Estados Unidos.
3 O conceito de dívida bruta não é o mais usado para medir a capacidade de um país arcar com seus compromissos fiscais. Em seu lugar, costuma-se usar o de dívida líquida que abate do montante bruto os ativos, como as reservas cambiais e os empréstimos a receber, armazenados nos bancos centrais. No caso do Brasil, o principal motivo do crescimento acelerado da dívida bruta está na diferença entre o superávit primário e o gastos com os juros das dívidas interna e externa e nas operações de crédito do Tesouro Nacional aos bancos estatais. Em 2009, foram concedidos cerca de R$ 100 bilhões de créditos ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e já foram combinados mais R$ 80 bilhões para 2010. Os empréstimos não têm impacto na dívida líquida porque são contabilizados como ativos do Tesouro (ou seja, como dinheiro a ser devolvido nos prazos estabelecidos pelos contratos com os devedores/investidores), mas integram a dívida bruta do Estado na medida em que o governo capta recursos no mercado (e, para isso, se endivida) e os empresta a bancos estatais (o que transforma estas quantias em ativos). A operação tem também um custo fiscal na medida em que o Tesouro toma o dinheiro emprestado pela Taxa Selic (hoje, em 8,75% ao ano) e os empresta aos investidores com projetos aprovados no BNDES pela TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) que é de 6% ao ano.
4 Tanto os dados de 2009, como as estimativas para 2010, do Fundo Monetário Internacional e, como os da OCDE, estão sujeitos a pequenas mudanças na medida em que os bancos centrais fecharem seus balanços de 2009.

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